O regime jurídico de arrendamento forçado, que permitirá ao Estado substituir-se ao papel dos proprietários, “não é um bicho-papão como se antecipa”, afirmou o presidente da Agência de Gestão Integrada dos Fogos Rurais (AGIF).
“O arrendamento forçado é um detalhe, que vai ter uma intervenção muito pontual para resolver uma ou outra situação, e vai permitir que autarcas, que a administração central, consigam intervir numa outra circunstância mais detalhada, mas não é um bicho-papão como se antecipa”, disse Tiago Oliveira, em entrevista à agência Lusa.
Integrando o Programa Nacional de Ação (PNA) do Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais (PNGIFR), com o horizonte de 2020-2030 e um orçamento total de cerca de 7.000 milhões de euros, o regime jurídico de arrendamento forçado, que aguarda aprovação pelo Governo, aplica-se nas Áreas Integradas de Gestão da Paisagem (AIGP), zonas percorridas por incêndios com áreas superiores a 500 hectares, permitindo que o Estado se substitua ao papel dos proprietários.
Para o presidente da AGIF, o arrendamento forçado “é mais um instrumento” que o Estado tem para intervir sobre um território em prol de um benefício coletivo, reforçando que só se aplica nas situações em que os proprietários não pretendam executar as intervenções previstas para a concretização das AIGP.
Sobre o valor da renda a atribuir aos proprietários, o engenheiro florestal, especializado na gestão e governança de risco de incêndio, advertiu que “não há um tesouro guardado”, considerando que “há uma sobre expectativa sobre o valor da madeira em Portugal”.
“Uma renda por hectare tem de ser um valor, obrigatoriamente, muito baixo, porque a única cultura que remunera o proprietário é o eucalipto, e estamos a falar do eucalipto bem gerido: permite uma renda, em valor atualizado líquido (VAL), com uma taxa de desconto 3%, de 100 a 150 euros por hectare, o eucalipto, permite uma renda de 6% ao proprietário. Se se está a falar de outras espécies, é bem menos do que isso”, adiantou.
Tiago Oliveira explicou que a cultura florestal, além do bem lenhoso que produz – “pode gerar uma renda de cinco, 10, 20, 30 euros por hectare/ano” -, tem de ser compensada pelos serviços ecossistémicos, admitindo “que valha o dobro”, porque permite melhor gestão da biodiversidade e de outras funções prestadas pela floresta.
“E a sociedade tem de estar disponível para pagar esse delta, estamos a falar de mais 50 euros, o que seja, depende da cultura, da prática silvícola que é colocada, do compromisso de gestão que o proprietário tem a longo prazo”, apontou o engenheiro florestal, defendendo que é preciso arranjar mecanismos que mobilizem o mercado da terra a ser mais rentável ou o Estado tem de entrar e gerir as propriedades.
“Mas a pergunta é: o Estado tem gerido bem e tem promovido bem os seus 20% de território que administra, 500 mil hectares que tem, uma gestão direta sobre baldios? Não tem. O Estado é eficiente a fazer isto? Tem de ser mais eficiente, portanto as dinâmicas privadas são mais objetivas, são mais eficientes, mas isso é uma discussão política que, mais uma vez, o poder político tem de se pronunciar”, avançou o presidente da AGIF.
Neste âmbito, os projetos têm de ser submetidos a uma análise custo/benefício e tem de existir “racionalidade económica e boa administração pública central, focada em prestar um serviço a um cliente, que é o proprietário”, indicou Tiago Oliveira, acrescentando que tal exige “determinação política e capacidade de mobilizar os atores”, ressalvando que os proprietários não são o problema, são a parte da solução e “têm de ser tratados com respeito e com uma visão agregada”.
Para conhecer a ocupação do território e redimensionar a gestão florestal, Portugal vai dispor do Sistema de Monitorização de Ocupação do Solo, um dispositivo permanente de monitorização, feito pela Direção-Geral do Território e que “vai estar concluído no próximo ano”, permitindo informação em tempo real sobre “cada ‘pixel’ da paisagem, para cada mancha”, o que servirá de base nas decisões políticas e de governança do recurso florestal.
“Não podemos continuar a ter um país exposto a uma lógica extrativista de recursos, do pinho, do sobro e do eucalipto”, declarou o engenheiro florestal, advertindo que o futuro exige uma gestão sustentável, inclusive devido às alterações climáticas.
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