A atual matriz rural impede uma gestão florestal sustentável, pelo que o regime sucessório devia ser revisto para que a partilha de heranças se realize no máximo em dois anos, defendeu a Agência de Gestão Integrada dos Fogos Rurais (AGIF).
A atual matriz rural impede uma gestão florestal sustentável, devendo ser revisto o regime sucessório para que a partilha de heranças se realize num período máximo de dois anos, propôs a Agência de Gestão Integrada dos Fogos Rurais (AGIF).
“A sociedade, em particular os políticos – o parlamento -, tem de se debruçar sobre esta questão: a matriz rural que herdámos não é compaginável com uma gestão florestal que promove a gestão florestal sustentável e o bem comum da nossa sociedade”, avançou o presidente da AGIF, Tiago Oliveira, em entrevista à agência Lusa.
No âmbito do Programa Nacional de Ação (PNA) do Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais (PNGIFR), com o horizonte de 2020-2030 e um orçamento total de cerca de 7.000 milhões de euros, a AGIF quer acabar com as heranças indivisas, o que passa por “alterar o regime sucessório, que data de 1927, para dar a volta a esta dinâmica da propriedade”.
“Alguém faleceu, a pessoa tem de fazer habilitação de herdeiros, tem três meses, segundo a lei, mas depois aquela propriedade pode ficar pertença de uma cabeça de casal, de uma herança indivisa. O que se está a propor é que as pessoas tenham um, dois anos, no máximo, para fazer as partilhas”, expôs o engenheiro florestal, especializado na gestão e governança de risco de incêndio.
Em caso de incumprimento do prazo para a partilha de herança, a propriedade “tem de ser objeto de uma gestão diferenciada”, em que o cabeça-de-casal cria uma sociedade económica ou tem de transitar para uma outra solução com a intervenção do Estado na gestão do património, defendeu o presidente da AGIF – instituto público que está sujeito à superintendência e tutela do primeiro-ministro -, explorando ainda como opções: hasta pública, divisão ou financiarização da propriedade.
“Este entesouramento do proprietário, em que quer ter lá a sua parcela de terra e nada faz, não pode acontecer mais, porque está a gerar externalidades negativas que ficam caras a todos os portugueses”, reforçou Tiago Oliveira, referindo-se à ocorrência dos fogos rurais, em consequência da “falta de utilização racional” do território.
Além do espaço rural, a revisão do regime sucessório permitiria “acabar com uma série de prédios que estão em ruína e que não se conseguem recuperar, porque os herdeiros não se entendem”, acrescentou.
Sobre o cadastro da propriedade rústica, desafio que está há décadas para ser concluído, com um novo projeto implementado desde 2017 e que se prevê finalizado em 2024, o engenheiro florestal considerou que “é útil”, mas “não foi o ‘toque de Midas’” para Monchique ou Mação que têm cadastro há muitos anos.
“É uma ferramenta que vai permitir a quem está interessado a gerir o território saber de quem é a propriedade”, apontou o presidente da AGIF, ressalvando que o cadastro não resolve problemas de fundo como as heranças indivisas.
Com o cadastro, é implementado o regime de prédios sem dono conhecido, para os casos em que não é possível determinar quem é o proprietário, prevendo o “registo provisório de aquisição a favor do Estado”, verificando-se que, “face aos recursos que existem, que a Florestgal, que é uma empresa pública do Estado, vai ter capacidade de assumir uma parte dessa gestão, mas também vão surgir outras iniciativas privadas que vão ser capazes de prestar esse apoio ao Estado, para garantir que essas propriedades são objeto de gestão e de agregação”, adiantou Tiago Oliveira.
Para valorizar os espaços rurais, o PNA prevê ainda a revisão do regime florestal, instrumento jurídico em vigor desde 1904, recomendando que o Estado “o modernize e lhe dê força operativa no terreno para mobilizar o proprietário a contribuir para a sua riqueza, mas também a contribuir para a riqueza comum”.
“O Estado tem de se dotar de ferramentas que tem, rejuvenesce-las, como é o caso do regime florestal e, depois, de dotar-se de capacidade institucional, à escala das regiões, para fazer a obra durante um, dois, 10, 20, 30, 50 anos”, afirmou o presidente da AGIF, sustentando que o desafio de ter um país bem gerido e governado está dependente de “uma administração pública capaz, capacitada, a olhar para o proprietário, mas também a olhar para o bem comum e fazer a síntese com a boa gestão”.
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