O processo de negociação de revisão do Contrato Colectivo de Trabalho Vertical (CCTV) do sector de transportes de mercadorias foi acelerado a fundo na quarta-feira, com a intermediação do Governo, como forma de pressionar os sindicatos grevistas a desconvocarem a paralisação em curso. No memorando de entendimento saudado pelo primeiro-ministro António Costa e apadrinhado pelo ministro das Infra-estruturas, Pedro Nuno Santos, estão previstas diversas alterações laborais, entre todas um aumento salarial global de 120 euros, bem como a definição mais clara do pagamento das horas extraordinárias.
Os sindicatos em greve – Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP) e Sindicato Independente de Motoristas de Mercadorias (SIMM) – já desvalorizaram os termos do acordo, depois de terem rompido as negociações que decorriam desde Maio precisamente por exigirem aumentos salariais mais pronunciados e um pagamento mais abrangente das horas extraordinárias.
Esta manhã, a Fectrans divulgou os termos genéricos do acordo assinado com os patrões, que resolve, sublinha, algumas das “questões nucleares” dos trabalhadores e que será agora discutido com os dirigentes sindicais e trabalhadores de forma a retomar as negociações em Setembro, para que possa entrar em vigor já em Janeiro do próximo ano.
Assim, na questão salarial, a Fectrans revela que foi acordado um aumento mínimo de 120 euros no salário mensal base dos motoristas (700 euros, mais complemento salarial, cláusula 61 das horas extraordinárias, diuturnidades e subsídio nocturno) e que ficaram previstas subidas progressivas de até 6%, embora não se especifique em que condições. Os sindicatos em greve exigiam inicialmente que os aumentos do salário mensal fiquem fixados para 700 euros em 2020, 800 em 2021 e de 900 em 2022. Depois do plenário do último sábado, as exigências alteraram-se para 900 euros já em Janeiro de 2020.
Mas o memorando de entendimento inclui ainda a “reformulação da cláusula 61 e com a melhoria da sua fórmula de cálculo e articulação com a cláusula dos limites do tempo de trabalho extraordinário”, sem se detalhar os termos dessa alteração. Este ponto foi determinante no abandono do SNMMP e do SIMM da mesa de negociações, depois de terem assinado um protocolo de 17 de Maio onde a definição deste ponto está prevista.
Segundo os sindicatos em protesto, no contrato colectivo de trabalho foi imposto que os motoristas deixassem de receber remuneração por todo o trabalho suplementar, recebendo duas horas extraordinárias por dia e ficando previsto o pagamento de uma isenção de horário de trabalho. No entanto, os motoristas em greve alegam por um lado que nem todos os sindicatos, nem todas as empresas aceitaram ficar de debaixo deste contrato, mas sobretudo acusam os patrões de fraude fiscal por continuarem a fazer, por exemplo, pagamentos ao quilómetro, remunerações que não contam para a reforma.
Subsídio para matérias perigosas
Uma das novidades do memorando de entendimento é a “criação de um subsídio de operações para as situações excepcionadas no CCTV” que, segundo a Fectrans, “é um subsídio diferente do que já estava previsto no protocolo de 17 de Maio para os trabalhadores do transporte de matérias perigosas”. Mas não são dados mais pormenores de uma medida dirigida precisamente aos trabalhadores que estão neste momento abrangidos por uma greve de quatro dias, contrabalançada por serviços mínimos abrangentes e uma requisição civil cirúrgica.
Adicionalmente, do acordo constam ainda “novas regras do pagamento do trabalho nocturno para os trabalhadores do transporte nacional”, a “revisão do conceito de disponibilidade em tripulação múltipla”, uma “melhoria e valorização do valor das ajudas de custo e diuturnidades”, bem como a “alteração do critério de atribuição das ajudas de custo diárias no transporte ibérico e internacional”.
Finalmente, ficou definida a “regulamentação da atribuição dos descansos compensatórios do trabalho efectuado aos domingos e feriados”, tendo a Fectrans revelado ainda sobre este aspecto que o “Governo irá publicar, até ao final do corrente mês de Agosto, uma portaria que proíbe a circulação de veículos de matérias perigosas em cisterna aos domingos e feriados”.
No comunicado enviado pela Fectrans, é ainda revelado que no dia 30 de Agosto a Fectrans voltará a reunir-se com o ministro do Trabalho “para discutir os mecanismos de fiscalização do CCTV, nomeadamente por parte da ACT e da Segurança Social”, para além de ter ainda ficado acertada “a primeira reunião do grupo de trabalho para a avaliação das condições de Carga e Descargas nos operadores logísticos e portos marítimos”, ainda em Agosto”.
Poucas horas depois de anunciada a assinatura deste memorando de entendimento, Pedro Pardal Henriques, porta-voz do SNMMP sublinhou que “os trabalhadores já deixaram bem claro que não aceitam este acordo e que existem outras condições que têm de ser negociadas”. Já Manuel Mendes, delegado da zona norte do SNMMP explicou ao PÚBLICO que “este acordo ficou muito aquém das expectativas. A cláusula 61 não está clarificada e é uma forma de enganar os motoristas”.