A Comissão de Assuntos Jurídicos do Parlamento Europeu está reunida em Estrasburgo desde as 9h da manhã para analisar “potenciais e actuais conflitos de interesses” dos comissários designados por Ursula von der Leyen.
Na véspera desta reunião já a eurodeputada francesa eleita pelo partido Os Verdes indicava quais eram as nomeações que, em seu entender, poderiam levantar problemas, e entre elas está a indigitação de Elisa Ferreira para a pasta de Coesão e Reformas. Mas há pelo menos mais cinco comissários que estão sob o escrutínio prévio desta Comissão, ainda antes de serem submetidos às audições públicas no Parlamento Europeu.
A comissária portuguesa ficou indigitada para a pasta da Coesão e Reformas, aquela que tem a responsabilidade de tomar todas as decisões sobre os Fundos Comunitários atribuídos para o desenvolvimento das regiões dos vários Estados membros. O marido de Elisa Ferreira, Fernando Freire de Sousa, é presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN), organismo responsável pela aplicação dos fundos estruturais, sendo que a região Norte é uma das que recebe em Portugal a maior fatia dos Fundos de Coesão Europeus.
Num tweet onde foi elencando os casos problemáticos que encontra, na referência que fez a Elisa Ferreira e a Freire de Sousa, a eurodeputada Marie Toussaint, coordenadora de Os Verdes na Comissão dos Assuntos Jurídicos, não deixou também de referir o caso em que a ex-eurodeputada era vice-governadora do Banco de Portugal numa altura em que a Caixa Geral de Depósitos estava na mira do supervisor por ter financiado, de forma ruinosa para o banco, o projecto La Seda, cujo vice-presidente era o seu marido.
“A portuguesa Elisa Ferreira era vice-governadora do Banco de Portugal quando um banco estatal financiou o projecto de uma empresa cujo vice-presidente era o seu marido. É nomeada para os fundos regionais pelos quais o marido é responsável por esses fundos para Portugal. Keep cool”, escreveu no Twitter a eurodeputada.
De acordo com as regras comunitárias, “a confirmação da ausência de qualquer conflito de interesses é pré-condição essencial” para as audições em sede do Parlamento Europeu prévias à tomada de posse.
As declarações de interesse dos futuros comissários estão, portanto, a ser escrutinadas e, se houver qualquer dúvida, os escolhidos por von der Leyen serão instados a “esclarecer rapidamente” as questões levantadas. Os eurodeputados podem também pedir esclarecimentos presenciais, ou seja, chamar os comissários designados.
A Comissão de Assuntos Jurídicos pode ainda propor um modo de se ultrapassar o eventual conflito de interesses. “Em casos mais graves, se não houver nenhuma solução para resolver o conflito de interesses, poderá concluir que o comissário designado está incapaz de exercer as suas funções de acordo com os Tratados e o Código de Conduta”.
Antes da tomada de posse dos comissários indigitados, o Parlamento organiza audições com os candidatos propostos para verificar se têm as competências e qualificações necessárias para os cargos propostos. A audição de Elisa Ferreira está prevista para a primeira semana de Outubro
Cada candidato é convidado para uma audição de três horas, transmitida em directo pela Internet, perante a comissão ou comissões parlamentares responsáveis pela pasta que lhes foi atribuída. Após a audição, as comissões responsáveis preparam a sua avaliação da competência do candidato, que é depois ultimada pela Conferência dos Presidentes, composta pelos líderes dos grupos políticos e pelo presidente do PE.
Por vezes, as audições podem resultar na retirada de um candidato ou na alteração das pastas. Em 2014, Alenka Bratušek (proposta para a pasta da energia) retirou a candidatura na sequência de uma avaliação negativa das comissões da energia e do ambiente do Parlamento Europeu.
Só no final destas as audições, o Parlamento terá de aprovar o colégio de comissários no seu conjunto antes de este poder tomar posse.
Quais são os outros cinco casos na mira da Comissão de Assuntos Jurídicos do Parlamento Europeu?
Conforme detalha a eurodeputada Marie Toussaint, no Twitter, a Comissão de Assuntos Jurídicos também está a avaliar os possíveis conflitos de interesses do húngaro Laszlo Trocsanyi, apontado para a pasta da Política de Vizinhança e Alargamento, cuja “empresa de advocacia recebeu um conjunto de pedidos do Governo… Enquanto ele era ministro da Justiça”.
A romena Rovana Plumb, antiga ministra do Ambiente e candidata à pasta dos Transportes, é suspeita de “abuso de poder” numa “suposta transferência ilegal de uma ilha no Danúbio para empresas privadas”. “Também terá registado o seu Audi na Bulgária para fugir aos impostos verdes, que ela própria criou durante a sua legislatura”, detalha Toussaint.
A eurodeputada refere ainda os “buracos” e “contradições entre as declarações europeias e nacionais” da francesa Sylvie Goulard (Mercado Interno), do belga Didier Reynders (Justiça) e, novamente, de Rovana Plumb.
Soube-se, no passado sábado, que a polícia belga estava a investigar alegações de corrupção e lavagem de dinheiro contra Didier Reynders, num caso relacionado com a construção da embaixada belga em Kinshasa.
Já Sylvie Goulard foi obrigada a reembolsar o Parlamento Europeu em 45 mil euros, correspondentes a sete meses de salário de Stéphane Thérou – que, entre o final de 2013 e o início de 2014 já tinha deixado de ser seu assistente parlamentar. A notícia foi avançada pelo Le Point, no dia 6 de Setembro.
O polaco Janusz Wojciechowski, candidato à pasta da Agricultura na nova Comissão Europeia, vê-se a braços com uma investigação do Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF, na sigla original), respeitante às irregularidades em viagens de trabalho, que recuam à altura em que era eurodeputado, detalha a Polskieradio24.
Notícia corrigida às 9h50 com o esclarecimento sobre o papel de Elisa Ferreira como vice-governadora do Banco de Portugal no caso do financiamento da CGD à La Seda