Poderia ser o título de mais um conto para crianças dos irmãos Grimm, de Lewis Carroll ou Marc Twain, com aspirações a integrar uma lista de histórias que se tornaram universais. Mas não! Num país à beira-mar plantado, atualmente em plena pandemia e já em agonia económica, é uma história bem real que toca amiúde o domínio do surreal.
É, na verdade, um conto contemporâneo em que as duas personagens principais dão também o nome à história: o olival moderno e o espírito brincalhão. O olival moderno é, de acordo com o estudo da EDIA (Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva), encomendado pelo governo e que acaba de ser publicado (março 2021), “uma cultura perfeitamente adaptada à região de Alqueva, com baixas exigências hídricas, boa resistência a pragas, exigindo por isso baixas quantidades de fitofármacos”. O espírito brincalhão é uma entidade metafísica, que na religião judaico-cristã é diferente da alma, mas sobretudo se define pela sua oposição ao corpo e, por isso, se afasta de tudo o que é físico e racional.
A história não é, certamente, candidata a Nobel da Literatura ou a Pulitzer, mas não deixa de ser caricata. Vejamos então! O espírito brincalhão aparece intermitentemente e teima em não compreender que o setor do olival moderno contribui anualmente para a economia portuguesa com 620 milhões de euros em volume de negócios, 500 milhões de euros em exportações, 70 milhões de euros em receita fiscal e gera 36 mil empregos.
O olival moderno é uma personagem cartesiana, mas ao mesmo tempo sensível e que procura entender as motivações do seu companheiro de narrativa. Neste tipo de diálogo que se tem caracterizado erradamente pela mera opinião unilateral, o olival moderno respondeu com um estudo científico em novembro de 2019, demonstrando empiricamente os impactos positivos económicos, ambientais e sociais. Chegados a março de 2021, vem agora a EDIA, num estudo fundamental, levado a cabo durante dois anos e realizado em parceria com entidades institucionais, dizer que “o olival moderno não causa mais pressões ambientais que outras culturas de regadio” e que “pelo facto de ser uma cultura permanente, quando conjugada com boas práticas culturais, aumenta a quantidade de matéria orgânica no solo”, “fulcral no combate à desertificação, criando uma barreira verde interanual a sul do Tejo” e “captando grandes quantidades de CO2”.
Ao espírito brincalhão, que critica mas pouco se deixa ver ao vivo, o olival moderno tem explicado de forma pedagógica que está no top 3 das culturas de regadio em termos de eficiência hídrica com apenas 3000 m3/ha, que apesar de ter 360 000 ha (10% da SAU em Portugal), consome apenas 8% do mercado de fitofármacos nacional e que as boas práticas como o enrelvamento na entrelinha ou a incorporação das podas são prática generalizada. Entretanto o setor foi à Assembleia da República (AR) dar o seu testemunho em audiência e congratulou-se pelo facto de 85% dos deputados já por três vezes terem chumbado o acumulado de 20 propostas de lei e de resolução, reiteradamente com a mesma origem, acusando injustamente o olival moderno, sem fundamentação científica. Uma clara vitória da razão sobre a emoção!
Recentemente, o espírito brincalhão fez mais uma aparição e o olival moderno explicou-lhe que neste contexto de pandemia nunca parou de produzir, que o azeite é dos poucos produtos alimentares em que a autossuficiência do país está assegurada, que não despediu nem recorreu a lay-off. O espírito brincalhão encolheu os ombros, piscou o olho sorrindo e voltou a desaparecer na penumbra, parecendo não se importar…
Gonçalo Almeida Simões
Diretor executivo da Olivum, Associação de Olivicultores e Lagares do Sul
O artigo foi publicado originalmente em DN.