A manipulação genética em suínos, representa desafios complexos para a produção sustentável. A Diretiva europeia 98/58/CE, estabelece normas rigorosas para garantir que os suínos possam expressar comportamentos naturais em condições que preservem a sua saúde e bem-estar. Contudo, a manipulação genética, direcionada para o aumento da eficiência produtiva, trouxe dificuldades de adaptação desses animais a sistemas menos intensivos, criando obstáculos à conformidade com essas diretrizes. Tem-se concentrado em características como o aumento da massa muscular, a eficiência alimentar e o rápido crescimento. Essas alterações comprometem a capacidade dos animais de se adaptarem a condições naturais, como variações de temperatura e ambientes diversificados. Em sistemas semi-intensivos e extensivos, onde os suínos têm maior liberdade para explorar e manifestar comportamentos naturais, surgem dificuldades significativas. A seleção genética que privilegia o aumento de massa muscular pode resultar em problemas de locomoção e fragilidade óssea, limitando a mobilidade e a capacidade de realizar atividades físicas essenciais ao bem-estar animal.
Além das limitações físicas, a manipulação genética pode enfraquecer a robustez imunológica dos suínos, aumentando a sua suscetibilidade a doenças em ambientes menos controlados. Esse fator implica uma dependência crescente de infraestruturas complexas, como sistemas de ventilação, aquecimento e tratamentos profiláticos, elevando os custos de produção e contrariando os princípios de sustentabilidade. A fragilidade imunológica e a dificuldade de adaptação a ambientes externos são entraves significativos para os produtores que desejam adotar práticas sustentáveis, em conformidade com a estratégia “Farm to Fork” da União Europeia.
Acredito que a solução para os desafios colocados pela manipulação genética, não reside apenas em novas tecnologias, como o CRISPR/Cas9, que, apesar de promissora em termos de precisão, mantém-se no mesmo paradigma que originou os problemas iniciais. Estas tecnologias não resolvem a questão fundamental da necessidade de adaptação genuína dos animais aos ambientes naturais em que se espera que sejam criados. Em contraste, uma abordagem mais sustentável e coerente com as diretrizes europeias, consiste em promover sistemas de produção que respeitem a natureza intrínseca dos suínos e valorizem a sua adaptabilidade natural.
A adoção de práticas agroecológicas e a integração de sistemas de produção diversificados, como os agroflorestais e silvopastoris, permitem criar suínos ao ar livre, desempenhando funções ecológicas. Estas práticas não só promovem a expressão dos comportamentos naturais dos animais, como também contribuem para a regeneração dos solos e a promoção da biodiversidade.
A diversificação de receitas é um aspeto relevante para os produtores que optam por sistemas menos intensivos. A criação de suínos em sistemas integrados, como os agroflorestais, oferece oportunidades para explorar produtos complementares. Esta diversificação pode amortecer os impactos financeiros de períodos de menor produção de carne, proporcionando maior estabilidade económica às explorações. Além disso, sistemas mais diversificados e equilibrados tendem a ser mais resilientes face às oscilações dos mercados e às alterações climáticas.
A melhoria da qualidade alimentar é uma prioridade no contexto do aumento populacional e da crescente demanda por alimentos. A criação extensiva de suínos pode resultar em produtos de qualidade superior e com melhor perfil nutricional. Esse fator é particularmente relevante num cenário em que os consumidores exigem cada vez mais produtos saudáveis e de origem ética.
A adaptação dos sistemas de produção de suínos a modelos mais sustentáveis requer, contudo, suporte financeiro e técnico. É essencial que os produtores recebam incentivos para a adaptação de infraestruturas e a formação necessária para implementar práticas que respeitem o bem-estar animal sem comprometer a viabilidade económica das explorações. Programas de apoio ao desenvolvimento rural, financiados pela União Europeia, têm um papel crucial, oferecendo subsídios para práticas de agricultura regenerativa que incluem a criação de suínos em sistemas extensivos.
A formação técnica dos produtores é também fundamental, permitindo-lhes compreender os benefícios das práticas de maneio que integram princípios de sustentabilidade e bem-estar animal. A gestão de pastagens e o enriquecimento ambiental são exemplos de conhecimentos que podem aumentar a eficiência dos sistemas produtivos e reduzir a dependência de tecnologias dispendiosas.
A transição para um modelo de produção suinícola que respeite as necessidades naturais dos animais e os princípios de sustentabilidade, exige uma mudança profunda nas práticas e mentalidades de produção. A abordagem centrada na tecnificação crescente dos sistemas produtivos, visando a maximização dos índices de conversão alimentar e o crescimento rápido, é insustentável a longo prazo. Em contraste, a promoção de práticas agroecológicas e a valorização das capacidades adaptativas dos suínos oferecem um caminho mais viável para alcançar a sustentabilidade.
A colaboração entre produtores, centros de investigação e entidades reguladoras é essencial para enfrentar os desafios da transição para sistemas de produção mais sustentáveis. Esta cooperação visa não apenas superar os desafios técnicos da adaptação dos suínos a sistemas menos intensivos, mas também responder à pressão dos consumidores e das políticas públicas por uma produção alimentar que valorize o bem-estar animal e a integridade ecológica dos sistemas produtivos.
Ricardo Dinis
Diretor de Projeto e Investigação nas Florestas de Iroko