Uma visão enviesada e preconceituosa da floresta, que prima pela desvalorização da vertente produtiva, não contribui em nada para consubstanciar o papel da floresta como fonte de riqueza, de coesão territorial nem de sustentabilidade. Sem rentabilidade económica não haverá floresta sustentável. Assim, enquanto tivermos uma floresta incompreendida, teremos uma floresta condenada.
Portugal possui condições para ter na floresta uma fonte de riqueza, de coesão territorial, de desenvolvimento regional e de correção da grave assimetria entre litoral e interior e, no entanto, atravessa um ciclo de desvalorização deste sector, o que inclusivamente se torna incompreensível à luz dos valores ecológicos que orientam as políticas nacionais e europeias de uma forma geral.
O Governo quer preservar a floresta e plantar árvores, porque está preocupado com a concentração de dióxido de carbono e as alterações climáticas, mas, ao mesmo tempo, procura impedir a plantação de árvores de uma determinada espécie, esperando que espécies que ninguém quer plantar apareçam e se mantenham por milagre, num exercício de pura incoerência que se aproxima da esquizofrenia coletiva.
Evidentemente, não há racionalidade nestas políticas, que se explicam apenas por questões de ordem ideológica, nomeadamente por um preconceito contra o eucalipto. Trata-se de uma espécie que traz rentabilidade aos produtores florestais e ao país e que, por essa via se torna sustentável. Ou seja, qualquer exploração de eucalipto que seja rentável e produtiva é altamente protegida pelos seus proprietários e essa é a melhor forma de reduzir o risco de incêndio. Inclusivamente, a maioria dos produtores já possui um sistema de certificação para garantir uma gestão sustentável da floresta.
Por outro lado, o Governo implementou um conjunto de medidas destinadas à prevenção de incêndios florestais, nomeadamente a limpeza obrigatória das matas e o arrendamento compulsivo, que acabam por desencorajar os proprietários florestais em seguir esta via de investimento na floresta.
Portugal tem belíssimas condições para ter uma floresta que contribua ativamente para a bioeconomia de base florestal e é lamentável que isso esteja a ser desperdiçado por uma visão enviesada da realidade, fundamentada em perceções puramente ideológicas, que contribuem para uma floresta incompreendida.
A potencial riqueza da nossa floresta não se resume ao eucalipto e à pasta de papel, passa pela cortiça, pela produção de mobiliário e de biomassa, pelo efeito de redução do dióxido de carbono na atmosfera, pelos valores ambientais e paisagísticos, fundamentais para o turismo rural. Mas não tenhamos ilusões… Sem rentabilidade económica não haverá floresta sustentável. O mato e as espécies crescerão de forma aleatória e, na primeira ocasião, arderão da forma mais descontrolada que possamos imaginar. É por isso que afirmo, floresta incompreendida é floresta condenada.
Quem presa a biodiversidade deveria pensar nisto, em vez de acreditar que tudo se resolve sem pessoas, sem agricultores, sem produtores florestais. Até mesmo quem, não estando no mundo rural, tem a possibilidade de ter uma casa com jardim, rapidamente se apercebe da dificuldade de cuidar dele ou de providenciar quem dele cuide. Muitas vezes a opção passa por instalar relva sintética e atirar o problema para trás das costas. A não ser que estejamos a pensar fazer o mesmo nos territórios rurais, é bom que arranjemos condições de rentabilidade económica para que pessoas se fixem no interior do país e cuidem desses espaços.
Pouco investimento, baixa execução, proibições, burocracias e contraordenações
Infelizmente, pelo contrário, temos assistido ao inverso. Ao longo dos últimos anos, os governos têm vindo a reduzir os serviços disponibilizados no mundo rural, seja assistência médica, sejam escolas, seja inclusivamente estações de correio, para além da falta de investimento em infraestruturas tecnológicas relacionadas com o 5G, ao contrário do que têm feito outros países.
Por outro lado, subsiste uma grave falta de investimento na profissionalização do combate aos incêndios e no plano nacional de formação destinado a este efeito, assim como uma falta de interligação entre as estruturas públicas de base e as organizações no terreno.
Temos menos investimento produtivo na floresta, com uma política florestal conservacionista e uma desvalorização da vertente produtiva, assim como medidas desajustadas à realidade do sector e com baixo nível de execução.
Insiste-se na proibição de novas áreas de eucalipto, acompanhada de mais burocracia no licenciamento de novas áreas de plantação, assim como nas coimas e contraordenações por falta de limpeza das faixas de gestão de combustível, com o Estado a transferir a responsabilidade para os privados.
Quem não compreende a floresta e a sua natureza dificilmente saberá geri-la e preservá-la. Pelo contrário, estou convencido que apenas contribui para a sua decadência, pelo que uma inversão de política neste sector é fundamental e urgente.
O Autor
Licenciado em engenharia zootécnica, Luís Mira é secretário-geral da CAP – Confederação dos Agricultores de Portugal, desde 1999, função que desempenha a par com a de Administrador do Instituto do Emprego e Formação Profissional e do Centro Nacional de Exposições de Santarém – CNEMA.
É ainda membro do Conselho Económico e Social (CES), órgão de consulta e concertação no domínio das políticas económica e social e dos respetivos planos de desenvolvimento, e do Conselho Económico e Social Europeu (CESE).
Artigo publicado originalmente em Florestas.pt