As paralisações de atividades no porto moçambicano de Nacala, norte do país, na sequência do diferendo que opõe a RGL ao conglomerado ETG, provocou prejuízos de quase meio milhão de dólares, avançou à Lusa fonte oficial.
“Para o porto, houve implicações diretas na ordem de 446 mil dólares (410 mil euros), em termos de receita não coletada por causa das paralisações”, declarou Naimo Induna, diretor do Porto de Nacala, em entrevista à Lusa.
Em causa está uma providência cautelar interposta pela ETG face ao processo que se arrasta há meses, movido pela RGL, que acusa aquele conglomerado de ter denunciado a sua atividade na Índia, acusação que a PGR entretanto deu como não provada.
O Tribunal Judicial da Província de Nampula tinha concedido, em outubro, à RGL ordem de penhora de bens da ETG, incluindo imóveis e navios, e congelou as suas contas bancárias, aplicando uma fiança de mais de 3.871 milhões de meticais (55,8 milhões de euros).
Esse valor foi garantido com a apreensão de carga, nomeadamente feijão bóer produzido em Moçambique e que a ETG pretendia exportar – tal como a RGL o faz -, com aquele conglomerado a acusar nos últimos dias a RGL de se apropriar da carga e pretender enviá-la precisamente para a Índia.
Segundo o diretor do Porto de Nacala, a notificação de averiguação do Tribunal Marítimo de Nampula foi submetida num momento em que os contentores já estavam no navio que tinham como destino a Índia, o que obrigou a porto a descarregar um total de 620 contentores, embora em causa estivessem 450.
“As paralisações surgiram mesmo neste contexto, porque primeiro houve necessidade de entender os contextos e perceber quem é que ia cobrir os custos [ que no caso será o requerente]. Houve necessidade também de refazer todos os planos. Isto tudo implicou paralisação e dias de trabalho pouco eficientes”, declarou Naimo Induna.
Na manhã de hoje, pelo menos 23 contentores foram alvo de uma nova inspeção, tendo sido encontrado, pelo menos, um saco de feijão com o logotipo da ETG.
“Não podemos assumir que o produto é de uma ou de outra parte agora. O processo vai-nos elucidar porque para além da inspeção há outros meios de prova, como documentos (…). O saco da ETG encontrado não é suficiente para clarificar as coisas porque também encontramos sacos de outras entidades, o que mostra que podem ser sacos usados pelos produtores. (…) No momento certo iremo-nos posicionar”, disse à comunicação social em Nacala o juiz presidente no Tribunal Marítimo de Nampula, Boliz Júlio, momentos após a inspeção.
Enquanto o processo é avaliado, a preocupação das autoridades face a este diferendo que se arrasta desde o ano passado está ligada com a imagem do Porto de Nacala, alertou o diretor das alfândegas em Nacala.
“Esta situação tem impacto naquilo que é o funcionamento normal das alfândegas. Estamos com receio que as linhas de navegação desistam de usar o Porto de Nacala. Desistindo, isto tem impacto no número de navios que usa o porto, o que vai ter impacto nas receitas. (…) De lembrar que o porto foi reabilitado recentemente”, disse à comunicação social João Saltiel.
O volume de carga manuseada no Porto de Nacala, o coração da província moçambicana de Nampula, atingiu um número recorde em 2023, passando de 2,7 milhões de toneladas em 2022 para 3,1 milhões de toneladas no ano passado, após a reabilitação e modernização das infraestruturas.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) moçambicana considerou “absurdo e astronómico” o valor da caução fixada pelo Ministério Público local no diferendo e ordenou o arquivamento.
Num despacho com data de 15 de janeiro, assinado pela procuradora-geral adjunta Amabelia Chuquela, do Departamento Especializado para a Área Criminal, é decidido “anular as decisões do Ministério Público” de Nacala-Porto nos autos de instrução preparatório deste processo, que há vários meses opõe os dois grupos e que condiciona a exportação de feijão bóer e outros produtos agrícolas a partir daquela localidade portuária do norte do país para a Índia (que compra toda a produção nacional daquele feijão).
No mesmo despacho, a que a Lusa teve hoje acesso, a PGR decide “ordenar que o Ministério Público da jurisdição competente promova a revogação da medida de coação dos arguidos” e “ordenar arquivamento da instrução” por “inexistência de crime”, num processo fortemente mediatizado internacionalmente nos últimos meses.
A Lusa noticiou anteriormente que o líder da ETG, Maheshkumar Raojibhai Patel, chegou mesmo a apelar ao Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, em carta com data de 26 de dezembro, para intervir na “saga do feijão bóer”, em que alegava estar a ser vítima de expropriação de carga e bens pela empresa concorrente Royal Group Limitada (RGL).