Agricultores e industriais queixam-se do “novelo burocrático” dos fundos europeus e avisam: a produção de alimentos vai “ressentir-se”.
Portugal precisa de “estratégia, investimento para reformas estruturais e reforço da promoção internacional” do sector agrícola e agro-alimentar. Mas, “neste momento, do lado das políticas públicas, não dispomos de nenhum dos três”. A agricultura “continua a ser o eterno parente pobre do Governo”, lamenta o presidente da Portugal Fresh – Associação para a Promoção das Frutas, Legumes e Flores de Portugal, que agrega 87 associados e mais de 4500 produtores.
As exportações deste subsector somaram, em 2022, o maior valor de sempre (2040 milhões de euros, +15,6% face a 2021), mas Gonçalo Andrade diz que “só com respostas políticas adequadas” é possível atingir os 2500 milhões de euros em 2030. “Precisamos de um Ministério da Agricultura e Alimentação robusto e competente” e “em estreita colaboração e diálogo com o sector”, diz ao PÚBLICO.
No topo das prioridades “tem de estar a questão da água”, porque a agricultura só conseguirá “um crescimento sustentável” e uma “menor dependência de importação de países terceiros” com “acesso a água”. O presidente da Portugal Fresh quer “obras que permitam o armazenamento”, na “modernização dos aproveitamentos hidroagrícolas” e na “criação de novas barragens para múltiplos fins”.
“Na última década, o sector agro-alimentar sustentou o seu crescimento em conhecimento, inovação e tecnologia. E nunca parou, mesmo nos momentos mais difíceis, como a pandemia e a seca extrema”, lembra o gestor. Mas, logo a seguir, a guerra na Ucrânia “levou a uma inflação inédita”, transportando muitas empresas para “situações difíceis e de enorme instabilidade, sem conseguirem rentabilizar investimentos”.
“Um acto de resistência”
As dificuldades perpassam todo o sector agrícola. Pedro Santos, dirigente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), explica que, em particular para os pequenos e médios agricultores familiares, que são mais de 90% das explorações agrícolas do país, “as mais recentes crises agravaram os problemas com que se debatem há décadas”. Queixam-se de um “aumento brutal, e fortemente especulativo, dos custos de produção”, que “não se está a repercutir totalmente nos preços pagos à produção”, o que tem “impactos no rendimento dos agricultores, que caiu perto de 12%”.
“Continuar a produzir é cada vez mais um acto de resistência”, desabafa o responsável da CNA, frisando que, “para minimizar despesas e manter as explorações, muitos agricultores familiares viram-se obrigados a diminuir operações, como as aplicações de fertilizantes, com consequências na produtividade e no rendimento”.
E, “a repetir-se um ano de seca, com despesas extraordinárias com a alimentação animal ou perdas de produção, a situação dos agricultores tenderá a agravar-se”. E, “por arrasto, é a produção nacional e a soberania alimentar do país que irão ressentir-se”.
PEPAC: “Agricultores desesperados”
Há uma agravante: “Quer pelos critérios de elegibilidade, quer pela teia burocrática, muitos dos apoios ao investimento ou ao rendimento não estão direccionados para os agricultores familiares”, lamenta Pedro Santos, criticando o Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC 2023-2027).
Pese embora a ministra Maria do Céu Antunes garanta que o PEPAC “não vai deixar ninguém para trás”, o dossier “incorpora cortes significativos para o regime da pequena agricultura (500 euros nas explorações até um hectare)”, aponta o dirigente da CNA. E isso “irá manter a injustiça na distribuição” dos fundos da PAC, visto que “apenas 7% dos agricultores recebem 70% das ajudas directas”.
A equidade na atribuição dos apoios da PAC tem vindo a lume em alguns fóruns. A 19 de Abril, Francisco Cordovil, o ex-director do GPP e professor associado aposentado do Iscte, e o ex-deputado europeu e professor auxiliar da Universidade de Aveiro Miguel Viegas publicaram uma investigação onde concluem que “o […]