A reforma da PAC em 2003, inclui, para além de um conjunto alargado de medidas mais conhecidas (apoiadas por uns e criticadas por outros), no Regulamento (CE) nº 1782/2003 de 29 de Setembro, um capítulo (capítulo 2) que trata da MODULAÇÃO E DISCIPLINA FINANCEIRA.
Se no que respeita à Modulação isso é geralmente sabido e dominado, já quanto à Disciplina Financeira parece-nos que ainda não meditámos nem interiorizamos bem as suas consequências (nefastas) para os Agricultores.
Trata-se de um recurso de que a União Europeia passa a dispor e, dentro do rigoroso quadro orçamental e financeiro acordado, sempre que fizer falta mais dinheiro o problema resolve-se DIMINUINDO as verbas para as medidas de mercado e os pagamentos directos aos Agricultores, serão estes a “pagar a crise”.
Em vez de aumentar as contribuições dos Estados-Membros para o Orçamento da União Europeia ou reduzir/eliminar ajudas ao set-aside e à não produção (desligamento), vão-se retirar aos Agricultores parte do que recebem, como se a vida fosse rica e farta para eles.
Com os problemas do Alargamento da União Europeia (o mesmo dinheiro para mais candidatos) está-se mesmo a ver que essa “situação de recurso” se tornará uma prática frequente.
O Artigo 11º do referido Regulamento é claro e transcrevemo-lo neste trabalho.
Mas para além disto (como se fosse pouco), estão em “cima da mesa” mais Estudos, Comissões e Trabalhos que abordam, desde já, outra vertente tanto ou mais maléfica do que a que vimos a falar: A RENACIONALIZAÇÃO DA PAC, ou seja, o que até agora tem sido uma Política Comum (pelo menos em teoria) corre o risco de passar a ser em grande parte “cada um que se desenrasque”.
A nível do Parlamento Europeu, por exemplo, há uma “Comissão Temporária sobre os Desafios Políticos e os Recursos Orçamentais da União Alargada 2007-2013” que já apresentou trabalho, sendo relator o eurodeputado Reiner Böge.
Porque nos parece importante (e também porque estranhamos a sua não divulgação e discussão) transcrevemo-lo, chamando a atenção para a “Perspectiva dos efeitos de co-financiamento da PAC” no que reporta às políticas de preços, mercados e pagamentos directos.
Na mesma lógica de “economias financeiras” para o orçamento/despesas da União Europeia Alargada quantificou-se esses “ganhos” se a PAC for co- -financiada pelos Estados-Membros.
Com co-financiamento a 25% o orçamento “economizará 17,2%, chegando aos 36,7% de economias se o co-financiamento for a 50%, somando 75.270 milhões de euros no primeiro caso e 150.087 milhões se o co-financiamento for a 50%, no período 2007-2013.
A ir por diante, isto trará graves consequências a níveis de Estados- -Membros e Agricultores, agravando ainda mais as desigualdades, injustiças e assimetrias já existentes.
- Para que os Agricultores continuem a receber o mesmo que até aqui, cada Estado-Membro terá que financiar, com uma verba do seu próprio orçamento, valor igual ao da parte co-financiada
- Estados-Membros mais débeis económica e financeiramente terão dificuldades em garantir essas verbas, ao contrário de outros.
- Estados-Membros que menos apostem e apoiem as suas Agriculturas e Agricultores tenderão a “cortar/não disponibilizar” essas verbas, total ou parcialmente.
- Agricultores dos Estados-Membros mais fracos financeiramente e/ou que não apoiem e considerem importante as suas Agriculturas, ficarão prejudicados e serão penalizados por esta RENACIONALIZAÇÃO DA PAC.
No caso do nosso País (que recebe anualmente 881,6 milhões de euros do FEOGA-Garantia, dos quais 518 milhões destinados à nossa PAC desligada da produção), isso representaria uma comparticipação com verbas do orçamento do Estado de 220,4 milhões de euros/ano se o co-financiamento fosse de 25% e de 440,8 milhões no caso de ser 50%.
Esperamos que o Governo Português e os Partidos com assento no Parlamento Europeu contrariem e impeçam essa RENACIONALIZAÇÃO DA PAC.
1 – REG.(CE) 1782 / 2003 de 29 de Setembro
Artº 11º
“A partir do orçamento de 2007, a fim de assegurar que as dotações para o financiamento da política agrícola comum actualmente inscritas na rubrica 1 a) (medida de apoio aos mercados e ajudas directas) respeitem os limites máximos anuais fixadas na Decisão dos Representantes dos Governos dos Estados- -Membros, …….., será determinado um ajustamento dos pagamentos directos sempre que as previsões apontem para que vão ser excedidos, em determinado exercício orçamental, os montantes previstos na rubrica 1 a) tendo em conta uma margem 300 milhões de euros abaixo dos montantes previstos e antes de aplicada a modulação referida no nº 2 do Artº 10º, sem prejuízo das Perspectivas Financeiras para 2007-2013”.
2 – PERSPECTIVAS FINANCEIRAS 2007 – 2013
(Comissão Temporária sobre os Desafios Políticos e os Recursos Orçamentais da União Alargada 2007 – 2013)
Documento de Trabalho nº 9, relativo à PAC, do P.E.
CONCLUSÕES:
“Deve ser reiterado que o P.E. não está vinculado à decisão adoptada pelo Conselho Europeu de Outubro de 2002 relativa às despesas agrícolas até 2013; os montantes fixados pelo Conselho Europeu serão aceites, tão só, no contrato de um acordo global que satisfaça as prioridades políticas e financeiras do Parlamento; tal inclui a questão de saber se o financiamento para fins agrícolas na Bulgária e na Roménia deve ser acrescentado aos montantes da decisão; simultaneamente, deve sublinhar-se que a profunda reforma da política agrícola em 2003 incluindo a reforma de quase todas as OCM’s se baseou na validade do quadro financeiro estabelecido por essa decisão; acresce que cumpre recordar que o Parlamento Europeu deu o seu acordo ao Tratado e Acto relativos às condições de adesão dos 10 Estados-Membros, os quais se baseiam no tocante aos seus aspectos financeiros relativos à agricultura, no acordo do Conselho Europeu”:
“A execução da reforma da PAC será muito difícil no contexto do enquadramento financeiro rígido proposto pela Comissão; o mecanismo da disciplina orçamental deverá, provavelmente, ser aplicado já em 2007 a fim de prevenir despesas adicionais de 500 milhões de euros em 2007 e que ascenderão, provavelmente, a 950 milhões de euros em 2013”.
PERSPECTIVA DOS EFEITOS DO CO-FINANCIAMENTO DA PAC
(medidas de mercados/pagamentos directos)
Com Co-financiamento pelos E.M. (milhões de euros), despesas da U.E.
2007 | 2008 | 2009 | 2010 | 2011 | 2012 | 2013 | EVOLUÇÃO
(poupanças) |
|
1 – 25% | 44.384 | 44.990 | 45.215 | 45.500 | 44.987 | 44.956 | 44.925 | – 17,2 % |
2 – 50% | 33.506 | 34.071 | 34.377 | 34.342 | 34.309 | 34.330 | 34.351 | – 36,7 % |
“Ganhos” 1 | 10.875 | 10.918 | 10.839 | 10.759 | 10.679 | 10.627 | 10.573 | |
“Ganhos” 2 | 21.750 | 21.837 | 21.677 | 21.517 | 21.357 | 21.253 | 21.146 |
3 – PORTUGAL FEOGA-GARANTIA/ANO
881, 6 milhões de euros (dos quais 518 incluídos no RPU – desligados da produção)
25% = 220,4 milhões de euros ???
50% = 440,8 milhões de euros ???
Roberto Mileu
CNA – Confederação Nacional da Agricultura