O presidente da Câmara de Figueiró dos Vinhos, Jorge Abreu, arguido no processo sobre as responsabilidades nos incêndios de Pedrógão Grande, recusou hoje ter sido negligente.
“Não houve negligência da nossa parte”, afirmou Jorge Abreu, no julgamento do Tribunal Judicial de Leiria, que hoje decorreu na Exposalão, Batalha.
O autarca foi acusado e pronunciado por dois crimes de homicídio e um de ofensa à integridade física grave, todos por negligência.
Para o Ministério Público, Jorge Abreu, enquanto responsável pela gestão e manutenção da Estrada Municipal 521, onde ocorreram as mortes, “não tendo procedido, por si ou por intermédio de outrem, ao corte/decote das árvores e vegetação existente nos terrenos que as ladeavam”, agiu sem o cuidado devido, omitindo os procedimentos necessários à criação/manutenção da faixa de gestão de combustível naquela via.
O presidente da câmara, que descreveu o local onde foram encontradas as vítimas mortais, referindo por exemplo o cumprimento do distanciamento das copas das árvores, explicou que aquelas morreram por inalação de fumo.
“Não morreram queimadas, mas de inalação de fumo”, garantiu, recordando o “fumo e ar quente” que atingiram a vila de Figueiró dos Vinhos em 17 de junho de 2017, que ficou “sem luz e sem comunicações”.
Enquanto responsável máximo da Proteção Civil, Jorge Abreu esclareceu que “coordenava e orientava” e se preocupava com o acompanhamento do plano municipal de defesa da floresta.
“Em junho de 2017, tínhamos aprovado o plano”, declarou, referindo que “estava estipulado os 10 metros” na largura das faixas de combustível, sendo que “os serviços tinham indicação para cumprir os 10 metros”.
Após a sessão, o advogado de Jorge Abreu considerou haver “um enorme equívoco na pronúncia e na acusação”.
“(…) O que a acusação diz é que houve chamas ali naquela zona e não houve, houve fumo que proveio do incêndio”, referiu José Ferreira da Silva.
Quanto ao plano municipal da defesa da floresta de Figueiró dos Vinhos, Ferreira da Silva salientou que a zona onde ocorreram as mortes “só em 2019 tinha de ser intervencionada no âmbito do plano”, rejeitando “totalmente um comportamento negligente” do arguido, pois “não podia ir para além do que a lei o obriga a cumprir”.
Na sessão, o advogado José António Barreiros pediu que o coletivo de juízes reconsiderasse a possibilidade de manter o julgamento no Palácio da Justiça de Leiria, sustentando que o “critério decisório relevante”, a presença de público, não se verificou, além de que a sessão na Exposalão “não está melhor garantida” face, por exemplo, à questão, das acessibilidades. O requerimento foi acompanhado por outros advogados.
Na resposta, a juíza que preside ao tribunal coletivo explicou as contingências para a realização do julgamento devido ao facto de no Palácio da Justiça de Leiria trabalharem dois coletivos para os quais existe apenas uma sala de audiências.
“Em virtude das vicissitudes da pandemia e das exigências sanitárias, dos protestos apresentados pelos senhores jornalistas, foram os trabalhos transferidos para estas instalações”, justificou, referindo que “na ponderação dos diversos interesses em apreço, verificando-se que a assistência do público em geral – excetuando jornalistas – ao presente julgamento foi no dia de ontem [segunda-feira] e no dia de hoje nula, por ora este tribunal manterá o agendamento” já feito.
Nesse sentido, nas sessões a realizar no Palácio da Justiça em Leiria, o tribunal providenciará, “para além dos lugares para o público na sala de audiências”, uma outra sala, com transmissão do som em tempo real.
A Ordem dos Advogados anunciou hoje que vai reclamar ao Conselho Superior da Magistratura e ao juiz presidente do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria das condições no julgamento dos incêndios de Pedrógão Grande, manifestando “reprovação pela forma como decorreu ontem [segunda-feira] a primeira sessão do julgamento”, no Palácio da Justiça de Leiria.
“De acordo com o que foi publicamente relatado, a sessão, que concentrou mais de 50 pessoas na sala de audiências, foi realizada sem as necessárias condições de segurança, uma vez que os lugares destinados aos advogados não possuíam o distanciamento social exigido”, lê-se na nota.
O julgamento para determinar responsabilidades nos incêndios de Pedrógão Grande, em junho de 2017, nos quais o Ministério Público contabilizou 63 mortos e 44 feridos quiseram procedimento criminal, tem 11 arguidos. A estes são imputados crimes de homicídio por negligência e ofensa à integridade física por negligência, alguns dos quais graves.
A próxima sessão realiza-se na segunda-feira, na Exposalão, com o início do depoimento de testemunhas.