Luís Mira esclarece que ‘não está no pacto, em nenhuma alínea’ que não é possível os agricultores manifestarem-se. E lembra que a CAP teve a capacidade de fazer manifestações na sexta-feira e assinar um acordo com o Governo na segunda, mas deixa um recado: ‘Este pacto só tem algum efeito na produção quando as ajudas forem efetivamente recebidas pelos agricultores. Se isto durar três meses, só daqui a três meses é que terá algum impacto’.
A CAP acabou por assinar o pacto com o Governo para reduzir e estabilizar os preços alimentares. Como é que isso foi possível?
Vamos começar por interpretar a questão da forma como isto decorreu. As negociações foram todas feitas em exclusivo com António Mendonça Mendes, agora secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro, que demonstrou bom senso e vontade de querer fazer o acordo. Penso que se não tivesse sido com ele, nada disto tinha sido possível. Porque é que estou a dizer isto? Primeiro, porque o tempo foi muito curto. Segundo, pelas circunstâncias em que isto se deu, em que estávamos numa manifestação na sexta-feira e as negociações passaram-se entre sexta e segunda.
Em tempo recorde…
Veja a pressão que tem em cima. Tínhamos estado numa manifestação, que estava programada para contestar a ação da ministra e sua incompetência. E o que é que aconteceu? Surgiu toda uma polémica à volta da alta dos preços. Também o INE revelou que que o setor agrícola registou uma quebra de rendimento face ao ano anterior de 12%. E a CAP andava há mais de um ano a dizer que as ajudas não existiam, quando os espanhóis fizeram isto, no ano passado. Os franceses também fizeram isso, como toda a Europa fez quando os preços subiram. Mais uma vez, fruto da incompetência. Aliás, já nem é incompetência a palavra, porque a ministra da Agricultura não tinha peso político para fazer isto. Em três dias António Mendonça Mendes fez aquilo que a ministra não foi capaz de fazer num ano e meio.
E esteve afastada das reuniões…
Nunca falei com a ministra, em nenhum ponto desta negociação.
Acha que isso revela falta de peso político?
Daí ter dito que o peso político de Mendonça Mendes permitiu que, em três dias, fizesse aquilo que ela não foi capaz de fazer num ano e meio. Mas vamos enquadrar esta situação, que começa no verão quando a CAP contestou a falta de medidas relativamente à brutal seca que estávamos a viver. E, nessa altura, dá uma resposta aos jornalistas a dizer ‘Vão perguntar à CAP’ quando nunca explicou essa questão. Uma coisa gravíssima, em termos democráticos. Depois há o acordo de concertação e, mais uma vez, a ministra não aparece. A negociação foi feita com a Ministra do Trabalho e com António Mendonça Mendes, enquanto secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, e com o gabinete do primeiro-ministro. A ministra não apareceu. E agora fazemos este pacto. Mas como é que apareceu? Contactaram-nos na quinta-feira à noite, depois de Pedro Soares dos Santos e de Paula Azevedo terem dito: ‘Atenção, sem apoiar a produção, os preços não baixam e não conseguimos fazer milagres’. E este tipo de apoios aconteceu em toda a Europa, não foi uma coisa portuguesa. E isso foi mais um facto a juntar às críticas e às manifestações que vínhamos a fazer. Foi tudo junto e foi um motivo para sermos chamados. Mas só sexta-feira depois da manifestação é que começámos a negociar.
Nessa sexta-feira estavam numa manifestação em Évora…
Exato. Mas quando fomos chamados à negociação e porque já tínhamos tido a experiência do acordo de concertação, em que a ministra quis passar a imagem de que estava ao lado da CAP e que tinha ajudado o setor quando não fez nada, tivemos a necessidade de salvaguarda que isso não se iria repetir. Porquê? Porque estávamos numa manifestação na sexta-feira a contestar e, como tal, não era possível ao presidente da CAP aparecer na segunda-feira ao lado, de braço dado com a ministra. Esta foi uma das situações que se colocou e a sua presença para nós era impeditiva.
Mas foi uma exigência que mostraram desde o início? Isto é, que não negociavam com a ministra da Agricultura?
Acho que isso foi intrínseco, nunca se falou. Mas a ministra também não tinha essa capacidade para negociar. E o acordo só foi fechado porque meteu o ministro das Finanças e o primeiro-ministro, caso contrário não tinha ido a lado nenhum. Nem ia para a frente nem para trás e acredito que o Governo partiu desse princípio. No entanto, havia um problema para resolver que não era fácil, mas acho que se conseguiu resolver. Não fazemos as manifestações por acaso, fizemo-las porque temos razões para isso. Continuamos com o Programa de Desenvolvimento Rural (PDR) em não execução de 1.300 milhões de euros, agora serão 1.200 e o PEPAC tem um conjunto de decisões nacionais que lesam os agricultores em centenas de milhões de euros.
Metade do que gastámos na TAP…
Cerca de metade. Se juntarmos as outras coisas até 2027, já é capaz de chegar perto. Mas isso revela que é dinheiro que falta entregar ao setor agrícola e continuamos com o mesmo problema no PDR e com o PEPAC e, no acordo, consta que reconhecem o ponto de execução do PDR e que vão fazer esforços para a sua execução plena, enquanto o PEPAC vai ser corrigido em setembro. Isto não diz nada objetivo, mas diz muito em termos políticos.
É um compromisso?
É um reconhecimento do Governo do que está errado e que […]