À medida que a cota de armazenamento de água vai descendo na albufeira de Santa Clara, sobe o tom da contestação à decisão da ministra da Agricultura, por ter nomeado uma comissão administrativa para substituir a direcção eleita na gestão dos aproveitamentos hidroagrícolas das barragens do Mira e Corte Brique.
O primeiro sinal desse descontentamento tomou corpo na última segunda-feira. Quase 200 agricultores, na sua maioria sócios da Associação de Beneficiários do Mira (ABM), organização que detém a concessão do Aproveitamento Hidroagrícola do Mira (AHM), reuniram-se para debater as implicações resultantes da nomeação da comissão administrativa e os critérios da distribuição da pouca água que resta para a actividade agrícola e agropecuária.
Manuel Amaro Figueira, presidente da direcção da ABM exonerada, descreveu ao PÚBLICO o quadro actual da reserva hídrica na albufeira de Santa Clara. O volume de água para a campanha de rega, abastecimento da população, pecuária e indústria (mina de Neves Corvo) no ano de 2023, aprovado em Abril na assembleia geral da ABM, é de 14,3 hectómetros cúbicos (hm3). Até final de Junho foram consumidos 5,3 hm3, e os restantes 9 hm3 poderão não chegar para continuar a garantir as utilizações já enumeradas. Somam-se ainda as perdas de água por evaporação e a que desaparece no processo da evapotranspiração na rede pública de abastecimento e no circuito hidráulico (rede de canais a céu aberto).
A manter-se uma das primeiras decisões tomada pela comissão administrativa que determinou uma dotação adicional de 300 m3 por hectare “a todos os beneficiários inscritos numa área de aproximadamente 3300 hectares”, a que vão acrescer aos 1800 m3 por hectare, decididos ainda pela direcção substituída, a reserva de água actualmente existente na albufeira “só dará para satisfazer as necessidades até pouco mais do final do mês de Julho”, admite Amaro Figueira. Com uma observação: as culturas de pequenos frutos (framboesas, mirtilos e amoras) são “altamente consumidoras de água” e, para “garantir uma boa produção, o débito necessário oscila entre os 5500 e os 6000 m3 por hectare.”
Frutos vermelhos
No levantamento efectuado pela ABM sobre os agricultores inscritos para a campanha de rega em 2023, havia 883 beneficiários. Cerca de 90% dos consumos (12,2 hm3) são feitos por 75 beneficiários, maioritariamente dedicados à produção de frutos vermelhos que a Direcção-Geral da Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR) considera culturas permanentes e prioritárias no acesso à água.
Estão incluídas para além das framboesas, mirtilos e amoras, aloés, amendoeiras, bagas góji, bambu, citrinos, espargos, pomares, maracujás, medronhos, mirtilos, peras abacate, pittosporum, proteas e vinha, ou seja, as plantações mais importantes que hoje existem no perímetro de rega. No entanto, a floricultura, que tem uma razoável implantação no perímetro de rega do Mira (PRM), por “não ser considerada agricultura, não figura no Plano de Contingência para a Situação de Seca (PCSS) para […]