Depois de anos de excesso de utilização de barricas novas de carvalho, os produtores optam por cascos de maior volume, maior número de utilizações dos mesmos e menor intensidade de tosta das aduelas.
Jorge Alves: “É a madeira que dá o carácter luxuriante e cosmopolita ao vinho.” Hamilton Reis: “O estágio dos vinhos em barricas novas significa que parte considerável do perfil desses vinhos passa a ser atribuído ao tanoeiro ou à floresta de origem das aduelas das barricas e não às castas, ao terroir de origem do vinho ou ao enólogo.” Jaime Quendera: “Diga lá o nome de um vinho de topo deste mundo que não tenha estagiado em barricas?” Ah, as barricas novas de carvalho e o vinho – uma zaragata sem fim, com teses para gente moderada, gente radical e gente que se está nas tintas para o assunto. Haverá novidades no mundo das tanoarias? Poucas.
O fundamental continua a ser a boa gestão das florestas (e em França é o Estado que manda no assunto e não as tanoarias), a secagem da madeira, a construção da barrica e os níveis de tosta das aduelas. Todavia, regista-se uma tendência para o aumento de volumetria dos cascos de estágio e a redução da intensidade da queima das aduelas. É certo que os mercados de países não produtores continuam a achar piada aos aromas de baunilha, caramelo, coco, especiarias variadas, torrefacção, chocolate e outras coisas que não fazem parte do vinho, mas os consumidores do velho mundo já torcem o nariz a receitas à laia de refrigerante. No fundo, o bom senso parece ser o melhor conselheiro nesta matéria.
Este não é um texto contra o uso barricas de estágio ou de fermentação de vinhos – os radicalismos não se recomendam – , mas é impossível não registarmos que o sector do vinho abusou da madeira nova nos últimos 40 anos, arrastado pelas modas de algumas regiões de França e de Espanha e pelo mau gosto dos gurus americanos e ingleses que ditavam e ditam as regras do negócio.
O uso da madeira na feitura do vinho é tão velho como a salve-rainha. Foi sempre recipiente de fermentação e de armazenamento. No processo de estágio, a madeira porosa permite a troca muito lenta de oxigénio com o vinho, coisa que contribui para o suavizar (em linguagem técnica diz-se polimerizar os taninos do vinho). Quando, a seguir à vindima, um vinho entra numa barrica, numa pipa ou num tonel, está turvo, bruto e adstringente. Meses ou anos depois estará límpido e macio. A madeira e o tempo têm essa função: tornar o vinho civilizadamente bebível.
A utilização de barricas de 225 litros acabou por ser uma medida padrão fomentada pelos burocratas ingleses (cada barrica vinda de França daria sempre 300 garrafas) e uma solução técnica e funcional de transporte dos cascos nos barcos. Isso no final do século XIX. Com o tempo, verificou-se que os vinhos que passavam em barricas novas de carvalho adquiriam aromas e sabores inusitados. E, a partir do final dos aos 70 do século passado, uma barrica deixou de ser apenas o recipiente para polimerizar os taninos do vinho. França liderou a revolução e Espanha, mais tarde, seguiu e abusou da receita. Se cheirarmos um Rioja novo às cegas, num copo escuro, não sabemos se estamos perante um vinho ou um Jameson – o whisky que estagia em cascos de carvalho americano ou francês.
E é aqui que bate o ponto. A utilização maciça de barricas de carvalho novo em todo o mundo (carvalho francês, americano, esloveno ou húngaro) acabou por padronizar os vinhos, em particular quando são de colheitas novas. Metemos ao nariz um copo de vinho que passou por carvalho novo e não sabemos […]