Um dos grandes temas da atualidade nacional no panorama ambiental continua a ser a exploração de lítio em Montalegre, naquela que possivelmente se poderá tornar numa das maiores minas europeias para a extração deste recurso mineral. De um lado está a população local e os defensores do ambiente, com fervorosas manifestações contra a mina e a favor da vida e do lado oposto apresenta-se o grupo empresarial que a quer explorar e aqueles que veem nesta atividade um presumível futuro extremamente lucrativo para vários setores.
Como estudante do mestrado em Ecologia, tive o privilégio de realizar o trabalho de investigação da minha tese nas terras do Barroso, em pleno Património Agrícola Mundial.
Após a realização de um estudo pioneiro entre os sistemas agrícolas e naturais na Bacia do Rio Cávado e que foi apresentado em eventos como “FAO – Global Symposium on Soil Biodiversity (GSOBI21)” ou “XIX Encontro Nacional de Ecologia e Celebração dos 25 anos da SPECO”, nenhum dos pontos de amostragem que analisei nestes sistemas se revelou biologicamente instável, não havendo indícios de esgotamento de nutrientes ou de vulnerabilidade da rede trófica, existindo assim um reduzido grau de impacto humano nos solos destas terras.
De relembrar e salientar que a zona do Barroso é o único território português que recebeu a classificação de Património Agrícola Mundial atribuída pela FAO, devido às estáveis inter-relações milenares entre o Homem e a Natureza que deram origem a ecossistemas de enorme valor natural e sociocultural. Tendo isto em conta, é de obrigação nacional o reconhecimento, preservação, manutenção e divulgação destes sistemas naturais cada vez mais raros a nível global.
Por outro prisma, é verdade que Portugal possui uma das maiores reservas de lítio à escala mundial e devido à sua ampla variedade de utilizações e aplicações, seja em baterias de telemóveis e automóveis, vidros altamente duradouros, ligas metálicas ou até medicamentos, poderá ser um ativo económico regional e nacional bastante forte nas próximas décadas. No entanto, vários estudos apontam que a extração do lítio a céu aberto pode danificar seriamente a qualidade dos vários recursos hídricos com potencial prejuízo para a agricultura e pastorícia, provocar grandes quebras na sustentabilidade e biodiversidade circundante e afetar consideravelmente a saúde humana através da libertação de partículas e da difusão de vários tipos de poluição.
Desta forma, conseguir uma compatibilidade saudável entre a exploração de lítio e a manutenção da integridade das terras do Barroso será muito difícil, pelo menos nas condições atuais; acho extremamente importante o nosso país aproveitar os seus recursos naturais para gerar mais-valias e riqueza mas, por muito benefício e investimento económico a curto/médio prazo que o lítio nos possa oferecer, não conseguirá compensar as diversas consequências negativas inerentes à sua exploração, que vão desde a provável diminuição drástica de atividades como o turismo de natureza, um ativo cada vez mais importante a nível regional até aos efeitos para a saúde pública assim como o dano considerável ou possível destruição irreversível de património natural, agrícola, rural e cultural milenar único em Portugal.
Já dizia o provérbio popular “Quem tudo quer, tudo perde.”
Mestre em Ecologia
Estarão as “novas culturas” a ameaçar os Sistemas agro-silvo-pastorais? – João Sousa