A Iniciativa Liberal (IL) anunciou hoje a intenção de suscitar junto do Tribunal Constitucional a fiscalização sucessiva dos estatutos da Casa do Douro aprovados à esquerda em janeiro passado e que também mereceram dúvidas ao Presidente da República.
Em declarações à Lusa, o deputado da IL Mário Amorim Lopes justificou a iniciativa afirmando que, além das questões políticas, o partido tem dúvidas de legalidade e de constitucionalidade nos estatutos aprovados em janeiro, destacando “o princípio da liberdade de associação”, que considera estar em causa.
“Entre vários pontos, a questão da liberdade de associação é a mais crítica porque estes estatutos preveem uma inscrição obrigatória, num modelo de grémio que vem do Estado Novo, anacrónico e até reacionário e que não serve os interesses dos produtores, dos exportadores e não serve o interesse nacional”, considerou.
O deputado defendeu que não tem justificação constitucional a “negação da liberdade de associação” dos profissionais e invocou um parecer da autoria do constitucionalista Vital Moreira, de 2023, pedido pela Associação das Empresas de Vinho do Porto, e que incidiu sobre o projeto de lei que viria a dar origem ao diploma aprovado em janeiro passado.
Naquele parecer, Vital Moreira escreve que “um efeito colateral desta importante restrição indireta da liberdade de associação será o défice de associação e de representação para efeitos de contratação coletiva laboral, o que acabará por prejudicar os próprios trabalhadores assalariados”.
Admitindo que a IL – com oito eleitos – não tem o número exigido de deputados (23) para que o pedido de fiscalização possa avançar junto do Tribunal Constitucional, Mário Amorim Lopes apelou a “todos os deputados que se revejam no requerimento que o possam subscrever”.
A restauração da Casa do Douro como associação pública de inscrição obrigatória foi aprovada, no parlamento, no dia 11 de janeiro, com os votos a favor do PS, PCP, BE, PAN, Livre e do deputado social-democrata Artur Soveral de Andrade, com a abstenção do PSD e votos contra do Chega, IL e do deputado do PS Capoulas Santos.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, promulgou o diploma no dia 20 de fevereiro “apesar de considerar que permanecem as dúvidas de há quase oito anos, acerca da operacionalidade de uma fórmula de outro tempo, dúvidas acentuadas pela complexa repartição de atribuições com o Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto”, segundo uma nota então divulgada.
Com sede instalada no Peso da Régua, distrito de Vila Real, a Casa do Douro foi criada em 1932 para defender os viticultores e a viticultura duriense e viu alterados os seus estatutos para associação com gestão privada e inscrição facultativa em 2014, durante o Governo PSD/CDS-PP de Pedro Passos Coelho.
Em 2020, entrou em vigor a lei que a reinstitucionalizou como associação pública e inscrição obrigatória e chegaram a ser marcadas eleições, mas, em 2021, o Tribunal Constitucional apontou inconstitucionalidades à lei, nomeadamente uma insuficiência na definição de competências de natureza pública.
O processo regressou ao parlamento em 2023 e, agora, a nova lei procede à restauração da Casa do Douro enquanto associação pública de inscrição obrigatória e determina a entrega a esta entidade do edifício sede.
A Casa do Douro é constituída por um conselho regional de viticultores, a direção e um fiscal único e cada mandato tem a duração de três anos.
A instituição tem como atribuições controlar e manter atualizado o recenseamento dos viticultores da Região Demarcada do Douro, assegurar, de forma partilhada e articulada com o Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP), a organização, manutenção, atualização, gestão e certificação do registo cadastral de todas as parcelas de vinha do território e representar os viticultores durienses.