Exmo. Sr.
Presidente do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto
Doutor Gilberto Igrejas
No dia 27 de Julho deste ano, o IVDP anunciou um novo corte de 14 mil pipas na quantidade de vinho a beneficiar, passando esta a ser de 90 mil pipas, na próxima colheita. Este corte soma-se ao já efetuado em 2023, quando a quantidade de uva beneficiada passou para 104 mil pipas, menos 12 mil que no ano precedente, resultando num brutal corte de 22% em dois anos.
Estes cortes apenas vêm agravar a profunda crise que os viticultores do Região Demarcada do Douro (RDD) atravessam, constituindo mais uma forte machadada nos seus rendimentos.
Os rendimentos dos viticultores da RDD já estão severamente afetados pelo baixo baixo preço das uvas, que se mantém no mesmo patamar há 25 anos, pelos brutais aumentos dos fatores de produção, e pela desorganização e desequilíbrio de poder de mercado na região entre a produção, a transformação e o grande comércio exportador, sempre em prejuízo dos produtores, o elo fundamental da cadeia de produção.
Como se não bastasse, os grandes agentes da transformação e comércio, têm vindo a disseminar a informação de que não irão receber a produção deste ano de 2024. Tudo isto decorre num momento em que se multiplicam as denúncias da importação de grandes quantidades de vinho a granel de outras origens, o que aumenta a já
insuportável pressão sobre os pequenos e médios produtores da RDD.
Esta é uma situação que se arrasta há vários anos, com a complacência cúmplice dos sucessivos governos, incluindo dos que agora vêm dizer que é necessário fiscalizá-las. É imperioso pôr fim a estas vergonhosas importações, com medidas concretas, e não meras proclamações para iludir os agricultores, mas mantendo tudo praticamente na mesma.
Mesmo o anúncio ontem feito da medida de destilação revela a tibieza do governo perante a gravidade da situação. A destilação de crise será sempre uma medida pontual, e é mais uma que, em lugar de ressarcir quem mais precisa, ou seja, os pequenos e médios produtores, vai beneficiar sobretudo as grandes casas comerciais.
Por outro lado, não só o governo abdicou de ir até aos 45 milhões de euros, investindo 30 milhões da componente nacional, como os 3 milhões que adiciona aos fundos oriundos da União Europeia saem do orçamento do IVDP.
A prazo, a grande consequência será a destruição das características que tornam a RDD única no mundo, e em que os pequenos e médios produtores de uva, que são uma larguíssima maioria, tiveram e têm um papel fundamental, que não pode ser vilipendiado desta forma. Denunciamos, por isso, as políticas dos sucessivos governos, que apenas favorecem os grandes interesses da transformação e comércio da região, empurrando cada vez mais agricultores para fora da produção vitícola.
Toda esta situação é inaceitável para os pequenos e médios viticultores do Douro, que hoje fizeram ouvir bem alto o seu protesto. Por isso, exigimos do governo medidas concretas para travar a perda de rendimento dos agricultores, e para, de uma vez por todas, implementar um modelo de organização da produção e comercialização que vá ao encontro dos interesses da região e dos seus principais agentes: os pequenos e médios viticultores.
Para tal, é necessário implementar as seguintes medidas:
- Reverter o corte na produção de vinho beneficiado anunciado para 2024;
- Proibir as importações de vinho a granel de outras origens para a região;
- Obrigar a que todas as matérias primas, nomeadamente as aguardentes, usadas para a fabricação de vinho do Porto tenham prioritariamente origem na RDD;
- Garantir preços justos pagos à produção, começando por proibir que a uva seja paga aos produtores abaixo dos custos de produção, e estabelecer preços de referência para a produção, incluindo preços de referência para o vinho de mesa;
- Concluir o processo de reinstitucionalização da Casa do Douro, concretizando urgentemente o processo eleitoral, e dotando-a de instrumentos de gestão para que cumpra a sua função de regular a produção, o armazenamento e a comercialização, bem como a sua qualidade, de modo a gerar rendimentos dignos para os pequenos e médios produtores durienses;
- Adoptar medidas para travar o aumento especulativo dos preços dos fatores de produção;
- Adoptar medidas de apoio direto aos pequenos e médios produtores da RDD, que mitiguem no imediato a situação de crise que atravessam, que é a crise de toda a região;
- Limitar, ao nível da União Europeia, a atribuição de direitos de plantação.
A implementação destas medidas é essencial para salvar as características únicas e imensamente valiosas da RDD, e para dar dignidade a todos os que trabalham e vivem na região, a começar pelos pequenos e médios produtores vitícolas.
De outra forma, estar-se-á a condenar a região ao declínio, ao domínio por parte de poderes económicos que não querem saber, nem estão em condições de cuidar, dos valores únicos da RDD.
Apelamos a V. Exas. para que façam tudo o que esteja ao vosso alcance para dar vida, dignidade e qualidade ao Douro, às suas uvas, aos seus vinhos e às gentes que o trabalham e conservam este património económico e cultural ímpar.
Fonte: CNA