O administrador-delegado da Associação de Regantes e Beneficiários do Vale do Lis disse que as alterações climáticas obrigam a adaptar o sistema de regadio, com cerca de 80 anos, para que os agricultores tenham disponibilidade de água quando necessitam.
“Temos uma alteração do padrão de queda pluviométrica e é isso que nós sentimos mais quando se fala de alterações climáticas. E precisamos de ter um sistema de rega que cumpra com esse desígnio”, afirmou à agência Lusa Henrique Damásio.
Este é, para Henrique Damásio, o grande desafio da associação que tem 3.686 associados e que compreende uma área de dois mil hectares divididos por 11 mil parcelas, desde os arredores de Leiria até à Vieira de Leiria, no concelho da Marinha Grande. As culturas preponderantes são o milho e as hortícolas.
Segundo o administrador-delegado, há uma alteração forte na queda pluviométrica e “não é só a problemática de não haver água para regar as culturas em determinada altura e depois ela ser precisa noutra altura”.
“Como a queda pluviométrica é muito mais concentrada, infiltra-se menos nos terrenos, porque como é em regime torrencial acorre mais diretamente às linhas de água e é escoada para o mar, e isso faz com que, depois, na altura em que não está a chover, as disponibilidades hídricas do meio sejam muito menores”, explicou.
Este responsável realçou que se nota, ano após ano, que o rio Lis, “cada vez vem com menos água no período de estiagem, no período em que não chove”, pelo que o desafio é dotar a área de uma infraestrutura de rega que as pessoas possam usar quando precisem, mas que utilizem menor quantidade de água do que aquela que utilizavam anteriormente, porque as afluências são menores.
“A continuarmos com o sistema de rega idêntico àquilo que tínhamos nos últimos 80 anos, em muito pouco tempo (…) tem de haver um rateio na distribuição de água, porque ela não é suficiente para toda aquela que as pessoas querem”, declarou, acrescentado haver anos em que tal já aconteceu.
“Portanto, é preciso adotar sistemas de rega que utilizem menos água, sendo certo que a agricultura só está interessada em utilizar o mínimo de água possível para que as culturas tenham rendimento e não mais do que essa”, mas para tal são necessários “sistemas mais eficientes, com menos perdas, que as pessoas possam utilizar sempre que necessitarem com pressão”, insistiu.
Henrique Damásio esclareceu que é isso que está a ser implantado em parte do perímetro hidroagrícola do Lis.
“Dos 2.000 hectares, temos já um bloco de 300 a funcionar com este sistema em que as pessoas passam um identificador (semelhante a um comando eletrónico para desligar um alarme residencial) junto do hidrante que lhes fornece água” contabilizada ao metro cúbico num contador, referiu, adiantando que aquelas vão pagar por essa quantidade de água consumida.
Segue-se um outro bloco de 400 hectares, cuja obra está em curso, referiu, acrescentando o objetivo é alargar este sistema aos restantes 1.300 hectares.
Henrique Damásio apontou ainda que, no âmbito das alterações climáticas, outro problema prende-se com os fenómenos mais extremos, como os ventos fortes.
“Uma vez que estamos muito envolvidos agora na reconversão do sistema de regadio, não desencadeámos ainda esse processo, mas tencionamos desencadeá-lo a não muito longo prazo, que é a introdução de sebes”, apontou.
O administrador-delegado observou que as mais-valias da colocação de sebes são a diminuição da velocidade dos ventos, divisão da propriedade e, como a altura não é muita, não provocam grande ensombramento nas culturas e abrigam a fauna selvagem.
Por outro lado, Damásio notou que nos últimos anos se têm batido recordes de quantidade de pluviosidade caída durante um período, pelo que outra preocupação incide sobre as áreas impermeabilizadas à volta do perímetro hidroagrícola do Vale do Lis.
“Quando acontecem estas torrentes provocam fenómenos de cheia e com isso traz prejuízo às culturas”, realçou, considerando que não tem sido acautelado, aquando da impermeabilização dessas áreas, desde zonas industriais a residenciais, o encaminhamento dessas águas pluviais.
Nesse sentido, “quando há estas quedas pluviométricas acentuadas, que tem sido o padrão dos últimos anos”, elas afetam “muitíssimo, porque essas águas vêm indevidamente, a maior parte delas para dentro do perímetro hidroagrícola e depois provocam estragos nas culturas”.
“Essa é agora, de facto, a nossa maior externalidade negativa e a que mais me preocupa”, acrescentou.