(Artigo publicado na edição de Abril por J. Paulo de Melo e Abreu, ISA & LEAF, Universidade de Lisboa)
O consumo anual de água per capita em Portugal é dos mais elevados da UE e a produtividade económica da água é baixa (EEA, 2012). Cerca de 40 % da água total fornecida perde-se mesmo antes que possa ser utilizada. A Agricultura consome 74,7 % da água total consumida, se excluirmos o sector energético. Embora a disponibilidade de água seja superior à grande parte dos países europeus, urge aumentar a produtividade da água e moderar o aumento dos consumos no futuro, mormente atendendo a que, devido às alterações climáticas, as disponibilidades de água tenderão a diminuir (APA, 2015).
No Alentejo, a disponibilidade de água é hoje muito maior graças ao empreendimento do Alqueva. É difícil de imaginar o Alentejo sem este empreendimento, que sustem directa ou indirectamente o desenvolvimento de todos os sectores da economia alentejana e disponibiliza água à população.
O valor da água na produção agrícola
As plantas mantêm os estomas abertos quando estão hidratadas permitindo a entrada de dióxido de carbono que lhes permite crescer e, simultaneamente, perdem água por essas mesmas aberturas das folhas. Quando as plantas estão com falta de água, os estomas fecham, pelo menos parcialmente, controlando as perdas de água, mas o fluxo de dióxido de carbono que as faz crescer diminui também. Assim, o crescimento e produção são menores.
Plantas como os cereais praganosos acumulam cerca de 6 g por litro de água que transpiram, plantas como o sorgo e milho acumulam o dobro e as leguminosas acumulam cerca de 4 g por litro de água. Claro que quando o ambiente é mais seco a eficiência do uso da água diminui (De Melo-Abreu, 2018).
Utilizando modelos de algumas culturas, o clima e as características dos solos nos aproveitamentos agrícolas do Sistema Global de Rega do Alqueva (SGRA), calculámos a produtividade média, abstraindo as perdas por deficiências nutricionais, as resultantes de pragas e doenças, escolha de cultivares de ciclo cultural desajustado, e as associadas à colheita. Considerámos o regime de sequeiro e o de regadio e não contabilizámos nos cálculos as localizações em que o solo tem espessura efectiva inferior a 0,3 m. As culturas que são inviáveis em sequeiro não são apresentadas (ver Quadro 1) (De Melo-Abreu et al., 2016).
Quadro 1. Produtividade simulada (t/ha) de algumas culturas, em sequeiro (seq.) e em regadio (reg.), sem outras perdas que não as climáticas e hídricas, nos aproveitamentos agrícolas do Alqueva. Os valores médios, mínimos, máximos e os desvios padrão são também apresentados. O olival intensivo tem 408 árvores (‘Cobrançosa’ de 5 anos) por hectare. O olival superintensivo tem 1984 árvores (‘Arbequina’ de 10 anos) por hectare.
Cultura | Média | Mínima | Máxima | Desvio padrão |
Girassol (reg.) | 2,0 | 1,8 | 2,2 | 0,1 |
Girassol (seq.) | 0,8 | 0,5 | 1,4 | 0,3 |
Melão (reg.) | 28,5 | 26,6 | 31,3 | 0,7 |
Milho (reg.) | 13,2 | 11,8 | 15,5 | 0,7 |
Olival intensivo (reg.) | 4,3 | 3,9 | 4,7 | 0,2 |
Olival intensivo (Seq.) | 2,0 | 1,0 | 4,1 | 0,7 |
Olival super-intensivo (reg.) | 9,5 | 8,8 | 10,0 | 0,3 |
Soja (reg.) | 3,5 | 3,2 | 3,8 | 0,1 |
Sorgo (reg.) | 6,0 | 4,9 | 7,4 | 0,5 |
Sorgo (seq.) | 0,8 | 0,3 | 2,1 | 0,6 |
Trigo (reg.) | 8,0 | 5,9 | 10,4 | 1,4 |
Trigo (seq.) | 1,9 | 0,3 | 6,5 | 1,1 |
Os grandes aumentos da produção com o regadio, que são expectáveis, resultam das particularidades do nosso clima Mediterrânico e das espessuras efectivas baixas da maioria dos nossos solos. Em sequeiro, frequentemente, não se dá a importância devida a este último factor.
Impacto das alterações climáticas
As alterações climáticas, em todos os cenários, resultarão num aumento substancial das necessidades hídricas das plantas e as precipitações tenderão a diminuir, mormente no semestre mais quente. Assim, no futuro, a moderação dos consumos de água para a Agricultura e o aumento da produtividade física da água serão necessários para a sustentabilidade da agricultura de regadio no SGRA (De Melo-Abreu, 2018).
Estratégias para aumentar a disponibilidade e produtividade da água
Existem estratégias que podem ser adoptadas para aumentar a disponibilidade da água ao nível da exploração agrícola (p.ex., técnicas de agricultura de conservação, colheita de águas de drenagem, charcas e pequenas barragens) e outras que podem reduzir a ineficiência na distribuição da água.
Para que se aumente a produtividade da água ao nível da exploração agrícola temos algumas estratégias que podem ser implementadas:
- i) Escolha das espécies/cultivares que alcancem melhores produtividades da água.
- ii) Estratégias de gestão para aumentar a produtividade da água (p.ex., calendarização apropriada da rega e rega deficitária controlada).
Referências
APA, 2015. Plano Nacional da água. APA.
De Melo e Abreu, J P, Silva, J F, Pena, S B, Barata, L T, Leitão, M, Saavedra, A. 2016. Avaliação Produtiva e Zonamento de Culturas Temporárias e Permanentes. pp. 33- 60. In: Magalhães, M R. Ordem Ecológica e Desenvolvimento: O Futuro do Território Português. ISA Press.
De Melo-Abreu, J P. 2018. Agrometeorologia – Aplicação da Meteorologia para Maximizar a Produção Agrícola. AGROBOOK. Lisboa.
EEA, 2012. Towards efficient use of water resources in Europe. EEA Report, No. 1.
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