Tirei esta foto há cerca de um mês, num momento de “isolamento social”, coisa normal para um agricultor. Fui ao campo ver como crescia a erva, a paisagem do pôr do sol ao fim da tarde pedia uma foto (que já usei aqui noutra publicação) e tirei esta selfie “para mais tarde”. Nesse momento, ao pegar no telemóvel, fiquei aliviado com a mensagem de que a “taxa sobre a carne” tinha sido rejeitada na votação do orçamento de estado. Ainda se lembram disso? Em poucos dias, a nossa vida e as nossas preocupações deram uma volta completa. Nos momentos de crise somos obrigados a escolher o essencial. Acabou o debate sobre os gazes das vacas enquanto se esvaziavam as prateleiras de leite e carne. Pediam-nos para poupar água e acabar com os produtos descartáveis, agora passamos o dia a lavar as mãos e a deitar fora máscaras e luvas, se as tivermos.
Nesta guerra pela nossa sobrevivência, os agricultores não estão na linha da frente a correr o mesmo risco que os profissionais de saúde, mas são essenciais na cadeia de abastecimento das tropas e das populações. Por isso fiz o que pude nos últimos dias para informar os colegas sobre como nos protegermos para continuar a trabalhar. Como setor essencial, temos de continuar a funcionar para cultivar os campos, cuidar dos animais e produzir alimentos que outras pessoas, também essenciais, vão transportar, transformar e comercializar. E precisamos que os nossos fornecedores também continuem a trabalhar. Vejo como muito positivo que todos, empresas, cooperativas de fornecimento ou recolha do leite, adotaram medidas de segurança para manter a atividade. Não vejo motivo para faltar leite. Pelo contrário, há produtores de leite de cabra com dificuldades para escoar a produção. Queijarias que vendiam para restaurantes / destinos de turismo tem um enorme problema para resolver.
Ao problema da saúde, que vai doer ainda mais nos próximos dias (basta ver as previsões, basta ver o que acontece na Itália e na Espanha que vão uns dias à nossa frente) vai suceder-se o problema económico. Vai doer e ainda está a começar.
Entretanto, nesta aldeia/multidão global que são as redes sociais, vejo muita gente enervada, desesperada, a discutir, a romper amizades e a partilhar informação sem verificar. É normal, porque não estávamos a contar com isto, mas somos nós, todos, que temos de lidar com isto. Isto vai demorar, vai doer, mas se entrarmos em desespero e em pânico, como a corrida ao papel higiénico, ainda vai ser pior. Por isso vos peço o que vou também tentar: respirar fundo, manter a calma, “desligar” e descansar. Porque amanhã e nos próximos dias precisamos do melhor de cada um de nos. Eu estou bem, fiquem bem! #carlosnevesagricutor