A seca e o baixo nível de armazenamento de água nas barragens portuguesas preocupam as organizações de agricultores que alertam para o perigo de, se não chover até fevereiro, ficarem em risco culturas de Norte a Sul do país.
Alentejo, Algarve e Nordeste Transmontano são, segundo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), as regiões mais afetadas pela situação de seca moderada que o país atravessa e “se, entre o final de janeiro e fevereiro, não houver precipitação, poderá agravar-se imenso”, segundo a climatologista Vanda Cabrinha.
A falta de chuva levou várias organizações de produtores a alertar para os riscos ao nível das pastagens para animais e de culturas como frutas e hortícolas que poderão vir a escassear a médio prazo.
A Associação de Agricultores do Litoral Alentejano (AALA) perspetiva um ano “muito complicado” para os associados que terão que recorrer à compra de rações para os animais, aumentando os custos de produção, devido às dificuldades de garantirem pastagens para a alimentação e água para as sementeiras.
Preocupação manifestada também pela Associação Distrital dos Agricultores da Guarda (ADAG) e pela Associação Distrital dos Agricultores de Castelo Branco (ADACB) que, a par com as pastagens, teme impactos nas culturas de primavera/verão, se não houver água para regar o milho, as horticulturas e os pomares.
A médio prazo poderão estar em causa culturas como o kiwi, explicou à Lusa a Cooperativa de Felgueiras, um dos maiores exportadores deste fruto em Portugal.
“Nesta altura não está a preocupar, porque a planta está em repouso vegetativo, mas se não houver reposição dos aquíferos vai haver problemas no período estival”, explicou à Lusa Humberto Reis, técnico da cooperativa, sublinhando a importância de “chover bastante até abril”.
Em repouso vegetativo estão também as vinhas do Douro, empurrando para “o futuro” as preocupações da Associação de Viticultores Profissionais.
“No momento presente, a seca não é preocupante, porque a grande maioria das culturas estão em fase de repouso, seja a vinha, seja o olival, as fruteiras, estão todas em fase de repouso vegetativo”, explicou à Lusa o presidente da associação ProDouro, Rui Soares, salientando que a preocupação é “a falta dessa reserva, desse banco de água, que, mais à frente, se não houver chuva”, vai “fazer falta”.
Segundo o Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos (SNIRH), 13 das 60 albufeiras monitorizadas tinham, no final de dezembro, disponibilidades hídricas inferiores a 40% do volume total, enquanto sete apresentavam valores superiores a 80%.
As bacias do Barlavento algarvio (com 14,3%) e do Lima (com 22,2%) são as que apresentavam menor quantidade de água armazenada, seguindo-se as do Sado (41,6%), Mira (41,9%), Cávado (47,3%), Ave (52,8%), Arade (54,4%) e Tejo (56,6%).
Já as bacias do Douro (57,1%), Oeste (62,9), Mondego (66,5%) e Guadiana (76,1%) tinham os níveis mais altos de armazenamento.
Ainda sem preocupações muito imediatas, os agricultores do Norte pedem um fevereiro chuvoso para manter a retenção de água nos lençóis freáticos.
Mas, a chuva que ainda possa cair já não consegue evitar os impactos sentidos pelos horticultores da Póvoa do Varzim, segundo a Horpozim.
Os 850 associados da organização, que fornecem uma considerável parte de alfaces, tomates, cebolas ou cenouras, consumidos no país, queixam-se de estar a recorrer mais à rega com água dos poços, puxada a motores, o que aumenta os custos de produção devido ao preço dos combustíveis.
Do mesmo se queixa a Associação Interprofissional de Horticultura do Oeste (AIHO), onde as culturas estão também já a ser regadas, ao contrário do que é habitual nesta época do ano, aumentando os custos de produção no setor que fatura cerca de 500 milhões de euros e emprega entre sete a oito mil trabalhadores nas explorações agrícolas e nas centrais de processamento e transformação dos produtos.
Para o diretor-geral da Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP), Firmino Cordeiro, vive-se uma “fase extremamente delicada”, que só tem uma solução: “Temos de reservar água, fazer barragens e seguir o exemplo do grande Alqueva”.
No país rural há, no entanto, quem não peça chuva, com a Associação de Regantes e Beneficiários do Vale do Lis a considerar que o impacto da seca “até é positivo”.
Contudo, o administrador-delegado da Associação, Henrique Damásio, explicou à Lusa que áreas circundantes estão a drenar erradamente para dentro do perímetro hidroagrícola do Vale do Lis, obrigando a que as taxas pagas pelos agricultores sejam utilizadas para custear a bombagem da água dos campos para o rio Lis, para depois ser encaminhada para o mar.