O diretor da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), Domingos Leitão, alertou hoje que proteger as aves migratórias e os seus habitats é proteger o modo de vida de milhões de pessoas em todo o mundo.
Em entrevista à agência Lusa, a propósito do Dia Mundial das Aves Migratórias, que se assinala no sábado, o responsável destaca as principais dificuldades que enfrentam essas aves, como as alterações climáticas ou a destruição de habitats, e avisou que são necessárias ações para proteger os ecossistemas, lamentando que nomeadamente os políticos estejam mais preocupados com os negócios e menos com as consequências dos negócios.
“Os políticos envolvem-se nas coisas, mas preocupam-se pouco com a sustentabilidade a longo prazo. Preocupam-se muito com o que vai acontecer a quatro anos mas a natureza funciona a muito mais longo prazo”, afirma, dando como exemplo os projetos de construção de parques eólicos no mar (offshore).
A SPEA, com outras organizações, já fizeram chegar informação ao Governo sobre a matéria, diz.
É que, avisa, pode haver perda de biodiversidade no mar com as eólicas, que podem ser prejudiciais para as aves marinhas. E os seres humanos dependem das pescas e estas também são reguladas pelas aves marinhas, acrescenta. Na natureza, salienta, tudo está interligado.
O Dia Mundial das Aves Migratórias, que se assinala também a 14 de outubro para refletir a natureza cíclica das migrações (os dias são sempre nos segundos sábados de maio e outubro), tem este ano como tema “Água: vital para as aves”, alertando que a grande maioria das aves migratórias depende de ecossistemas aquáticos e que as zonas húmidas são vitais para as aves que migram se alimentarem e descansarem, de viagens que por vezes vão do Ártico à África do Sul.
Autoridades nesta área têm alertado e alertam de novo este ano para as cada vez maiores ameaças para os ecossistemas aquáticos, com a crescente procura humana por água, a poluição e as alterações climáticas. A efeméride serve precisamente para sensibilizar para a necessidade de proteger as aves migratórias e os seus habitats.
Domingos Leitão diz a propósito que é errado poder pensar-se que as aves migratórias não são importantes para a humanidade e fala de como são fundamentais para os ecossistemas, sendo também um indicador da sua qualidade.
Existem no mundo cerca de 11 mil espécies de aves e os avanços do conhecimento na ecologia devem muito ao estudo das aves, diz, explicando que no grupo das aves são as migratórias as mais sensíveis e em maior risco de extinção.
Além de mudanças no clima, o responsável alerta que também a poluição luminosa é prejudicial para as aves, um tema sobre o qual têm trabalhado as organizações ligadas ao ambiente. É preciso, diz, encontrar um equilíbrio entre as ruas não ficarem escuras e a luzes não matarem as aves.
Domingos Leitão cita um projeto envolvendo dois municípios na Madeira, de diminuição da intensidade da luz exterior ao longo da noite, que além de melhorar a proteção da natureza permite uma poupança energética e de dinheiro.
Em Portugal como em qualquer parte do mundo “muitas luzes são armadilhas mortais para milhões de passarinhos”, e as luzes de marginais afetam as aves marinhas. Lembra o diretor que pela costa e pelo mar português passam de “todas as aves marinhas da Europa”.
Marinhas ou não, a migração das aves é “um fenómeno extraordinário”, diz o responsável, lembrando que já era referenciado na bíblia.
“A humanidade sempre esperou pela migração das aves”, era um recurso alimentar desde sempre e no norte da Europa era uma época de abundância, diz, lembrando que em Portugal cerca de metade das espécies cinegéticas são migratórias, (como o pombo, a rola, a narceja, os tordos ou os patos) e no passado importantes também para o sustento das famílias.
E não só para o sustento. Domingos Leitão lembra que populações do norte da Europa usavam a penugem dos ninhos de uma espécie de pato para encher coberturas de cama e almofadas.
A já aportuguesada palavra edredão tem origem nesses patos. Do dinamarquês “ederduun”, formado por “êider”, uma espécie de pato, e por “duun”, que quer dizer penugem.