Recentemente assisti a algumas comunicações sobre tendências alimentares dos consumidores, por regra apoiadas em inquéritos realizados tanto em Portugal como a nível da União Europeia. Também por regra tais comunicações foram apresentadas por técnicos sem relação direta com o setor empresarial, não dispondo por isso do conhecimento real dos critérios que a maioria dos consumidores Portugueses adota efetivamente nas suas decisões em matéria de aquisição de alimentos, tanto de origem vegetal como de origem animal.
Embora eu não esteja diretamente envolvido na área comercial de qualquer empresa, mantenho, todavia, um contacto muito estreito com responsáveis pela comercialização, tanto de fruta como de carne de aves [a carne mais consumida entre nós – 44,3kg por habitante/ano – quase toda produzida em Portugal, em condições hígio-sanitárias controladas rigorosamente por Médicos Veterinários da Autoridade Sanitária Veterinária Nacional (Direção Geral de Alimentação e Veterinária – DGAV)].
Desses contactos concluo que, a esmagadora maioria dos consumidores Portugueses nas suas compras, quer de fruta quer de carne de aves, atende primordialmente a três caraterísticas: preço, apresentação e gosto.
Atente-se no modo como geralmente as grandes cadeias de distribuição alimentar atraiem os clientes: anunciando a prática de descontos substanciais em géneros alimentícios de grande consumo. Só excepcionalmente recorrem a outros atrativos para captar clientes. Ora, como é evidente, as referidas cadeias de distribuição encontram-se numa situação privilegiada para conhecer os critérios de decisão dos consumidores (obviamente que estes critérios reais são mais fidedignos que as respostas teóricas dadas aos inquéritos).
Da mesma maneira, ultimamente têm-se multiplicado entre nós as intervenções públicas em que é posta em causa a segurança alimentar em Portugal ou, mais precisamente, a segurança sanitária dos alimentos, desde a água até aos hortofrutícolas. Estes comentários negativos não só ignoram os resultados dos controlos regularmente efetuados aos alimentos pelas autoridades oficiais competentes, como também não têm memória do panorama alimentar em Portugal, designadamente nos anos que se seguiram ao fim da II Guerra Mundial e que conheci pessoalmente. Aliás o aludido panorama também se encontra retratado nas estatísticas oficiais. Por exemplo, a água que abastecia grande parte da população portuguesa (então 50% desta estava ligada à Agricultura) era extraída de poços, não raro situados próximos de estrumeiras, a qual não sofria nem qualquer controlo nem qualquer tratamento – o que contrasta enormemente com a atual situação relativamente ao abastecimento de água de que benefica a grande esmagadora maioria dos Portugueses. De facto, no último Relatório Anual disponibilizado pela Entidade Reguladora dos Serviços de Água e de Resíduos em Portugal (2021), foi confirmado uma vez mais que a água que corre na torneira dos Portugueses é de excelente qualidade para o consumo humano.
Para ilustrar os progressos notáveis no domínio da segurança dos alimentos, principalmente após meados do século XX, é interessante lembrar também que o leite de vaca pasteurizado só no final da década de 1950 começou a ser consumido em Lisboa.
No que concerne à segurança sanitária da fruta e das hortícolas, nomeadamente no que respeita à eventual presença de pesticidas, recorde-se que a Autoridade Sanitária Competente (DGAV) executa anualmente o denomiado Plano Nacional de Controlo de Resíduos de Pesticidas, cujos resultados nos deixam tranquilos no que à saúde pública diz respeito.
O passado dia 7 de junho foi designado pela Organização Mundial da Saúde (ONU), Dia Mundial da Segurança dos Alimentos, para alertar que os géneros alimentícios devem ser sanitariamente seguros para não causarem doença nos consumidores. De sublinhar que os perigos podem encontrar-se naturalmente nos alimentos (e.g. na batata, no café torrado) ou serem introduzidos (e.g. pesticidas) ou ainda terem origem na manipulação dos alimentos (e.g. exposição a temperaturas de aquecimento ou de refrigeração inadequadas). O número de perigos nos alimentos eleva-se a mais de 6 mil, mas o que importa é que a sua concentração seja insuficiente para causar doença nos consumidores.
Esta é a razão por que no caso dos pesticidas, por exemplo, a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) não só define quais os que podem ser utilizados nas diferentes culturas, como também estabelece para cada caso o limite máximo de resíduos (LMR) permitido.
Estima-se que na Europa mais de 40% das doenças de origem alimentar tenham origem nas nossas casas, não só devido às referidas práticas de temperaturas inadequadas, como também a deficiências de higiene.
Acresce a ação de fiscalização entre nós amplamente desenvolvida pela Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), nomeadamente no âmbito do Plano Nacional de Colheita de Amostras (PNCA).
A prioridade que a maioria da população portuguesa geralmente atribui ao preço dos alimentos poderá acentuar-se num futuro próximo, em decorrência da vulnerabilidade de Portugal. Por um lado devido à elevada dependência externa em energia e alimentos, o que concorre para a inflação e consequente menor poder de compra da população. Por outro lado, devido ao previsível aumento das taxas de juro que irão afetar um País altamente endividado (Estado, empresas, famílias) – o que poderá conduzir a um programa de ajustamento macroeconómico como ocorreu entre 2011 e 2014, o que afetará os rendimentos de muitos Portugueses.
Engenheiro Agrónomo, Ph. D.
Do Prado ao Prato na perspetiva de um fruticultor português – Manuel Chaveiro Soares