O Presidente da República afirmou hoje esperar que o acordo União Europeia (UE)/Mercosul seja rapidamente concluído e não seja travado pela “cegueira de um país” ou por “egoísmos de um ou outro Estado”, que não quis nomear.
Marcelo Rebelo de Sousa discursava na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, no encerramento do 11.º Fórum Jurídico de Lisboa, uma iniciativa luso-brasileira, em que também interveio o vice-presidente do Brasil, Geraldo Alckmin.
“É fundamental que seja celebrado o acordo entre a União Europeia e o Mercosul, e que seja celebrado o mais rápido possível. Se viável, durante a presidência espanhola da União Europeia até ao fim do ano, para não perdermos tempo. É importante para o mundo que o Brasil lidera, é importante para a União Europeia”, defendeu.
Recebendo aplausos da assistência por estas palavras, o chefe de Estado português acrescentou: “Se a União Europeia perder a oportunidade, por cegueira de um país, por razões de conjuntura, perderá porventura a oportunidade de um papel global no diálogo entre os grandes poderes do mundo”.
A seguir, perante a comunicação social, com Geraldo Alckmin ao seu lado, Marcelo Rebelo de Sousa reiterou a mensagem de que “é este o tempo de a Europa se abrir ao mundo latino-americano, sobretudo sul-americano”, com a conclusão do acordo UE/Mercosul.
“É este o tempo de a Europa se assumir como uma potência global também aí, e não podem egoísmos de um ou outro Estado travar aquilo que é a inevitável evolução do tempo”, considerou.
Interrogado sobre quais os países ou país a que se estava a referir, o Presidente da República não quis nomeá-los: “Nós sabemos – eu não queria estar a especificar – que há países que têm parlamentos que têm votado recentemente posições maioritárias contra esse acordo”.
“Isso é um travão enorme àquilo que está há 20 anos à espera. E não podemos perder, não é 20 anos, nem mais dois, nem três, nem quatro anos, porque são anos perdidos para o Mercosul e perdidos para a Europa. E a Europa pode perder assim um papel de ponte fundamental como potência global nas relações com o mundo sul-americano e latino-americano”, insistiu.
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, no plano bilateral está a ser “um sucesso” a “luta conjunta” de autoridades brasileiras e portuguesas pelo acordo UE/Mercosul.
Portugal, que vê na presidência espanhola da UE, no segundo semestre deste ano, “uma oportunidade” para se concluir este acordo, vem “falando junto dos seus parceiros europeus para explicar que não há tempo a perder”, disse.
O Fórum Jurídico de Lisboa é organizado pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa, pelo Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e pela Fundação Getulio Vargas.
Na sua intervenção, Marcelo Rebelo de Sousa falou também dos desafios colocados pelas tecnologias digitais e pela inteligência artificial, apelando aos juristas para que procurem respostas e aos políticos que tomem decisões para “controlar os poderes fácticos donos do digital”, em defesa da democracia.
Nesta matéria, pediu aos políticos para “não enterrarem a cabeça na areia” e atuarem de preferência a nível internacional.
“Se nós escolhemos o caminho da democracia, escolhemos o caminho da dignidade da pessoa, dos direitos e das diferenças entre as pessoas, do pluralismo, do diálogo, da confiança. E, se escolhemos esse caminho, isso significa salvaguardar esse conjunto de valores o mais rápido possível e o mais amplamente possível, e tentar controlar os poderes fácticos donos do digital”, argumentou.
O chefe de Estado observou que isso “é difícil”, assim como “foi difícil com os poderes financeiros, que provocaram a crise financeira de há poucos anos, quando se converteu a economia real em economia financeira”.
“O mesmo temos de observar com atenção quanto aos poderes digitais. Os novos poderes digitais são transnacionais, exigem respostas transnacionais”, sustentou.
Segundo o Presidente da República, é preciso “descobrir fórmulas de responder aos algoritmos, beneficiando das vantagens e reduzindo os custos democráticos”, impedindo que seja “o algoritmo a condicionar a Constituição e o direito”.
“O direito deve antecipar-se, acolher no sentido de prever, de disciplinar, de minimizar os custos daquilo que só introduzirá menos democracia, mais desigualdade e mais injustiça, entre os poderosos do digital e todos os demais, que serão os não poderosos do digital”, advogou.
Antes de participarem no encerramento deste fórum, Marcelo Rebelo de Sousa e o vice-presidente do Brasil estiveram hoje juntos num almoço no Palácio de Belém, em Lisboa, oferecido pelo Presidente da República.