A Associação das Empresas de Vinho do Porto (AEVP) descreveu um cenário de excedente estrutural no Douro, com operadores sem capacidade de vinificação e armazenagem, e defendeu uma promoção sistemática e programas de abandono voluntário da vinha.
A vindima na Região Demarcada do Douro aproxima-se da reta final e ainda há viticultores que não têm a quem vender parte da produção.
O presidente da AEVP falou à agência Lusa sobre a vindima, salientando que se prefigura, entre os seus associados, um ano de vinhos de “muito boa qualidade” e que há indicação de uma redução na quantidade na ordem dos 8% a 10%, mas que, “ainda assim, estes volumes são elevados”.
“Uma boa quantidade não é necessariamente, nas atuais circunstâncias, um grande sinal porquanto as empresas têm ‘stocks’ ainda muito elevados de anos anteriores, quer de vinhos do Porto, mas sobretudo de vinhos do Douro”, afirmou António Filipe, acrescentando que se está “perante um cenário de excedente estrutural” no Douro.
Questionado se as empresas estão no esforço máximo na compra de uvas aos lavradores respondeu que “sim e a vários níveis”, explicando que algumas não têm capacidade de vinificação, de armazenagem e que há limites físicos e técnicos para aquilo que podem receber.
Por outro lado, acrescentou, “as empresas são um negócio, têm milhares de empregados à sua responsabilidade e têm que tomar as decisões que melhor protejam os negócios”.
“Temos num cenário de quebra de vendas, de aumento de custos, estamos num cenário de guerra e de decréscimo de vendas”, referiu.
A AEVP disse que, no vinho do Porto a “queda é estrutural”, apontando para uma perda de 31% entre 2000 e 2023.
Adiantou que houve empresas que recorreram “à destilação de crise e, com a libertação de litros nos seus armazéns, foram comprar uvas que não precisavam aos seus lavradores para os poder ajudar este ano e garantir que eles estão aqui para o ano e para os anos vindouros”.
No Douro, cerca de 10,7 milhões de litros de vinho estão a ser encaminhados para a destilação.
“Eu diria que as empresas não podem ser acusadas de falta de responsabilidade nestas circunstâncias e neste momento”, defendeu.
Na sua opinião, o que está a acontecer para alguns lavradores é dramático porque não têm sítio onde entregar as uvas e estão a deixá-las ficar na vinha. “Mas, nada que não tenhamos alertado em devido tempo as várias entidades, nomeadamente o Governo”, realçou.
Quanto a medidas para mitigar a crise no setor, António Filipe destacou a promoção dos vinhos do Douro e do Porto de forma estruturada, sistemática, em programas com horizontes de cinco ou 10 anos, em mercados emergentes e com potencial de crescimento.
“Temos que trabalhar o tema da procura e, para isso, é conhecida a posição da AEVP relativamente à incapacidade que o IVDP (Instituto dos Vinhos do Douro e Porto), no seu formato jurídico atual, tem para ajudar nesse processo de promoção”, apontou, defendendo a criação de uma comissão vitivinícola regional.
Considerou a linha de crédito de 100 milhões de euros, a juros bonificados, anunciada pelo Governo, como uma medida positiva para a viticultura nacional, mas disse que se deve olhar para além de “ações pontuais, como a vindima em verde”, e defendeu a criação de programas para abandono de vinha”, uma medida voluntária que poderia ajudar a adequar a oferta à procura atual e esperada nos próximos anos.
Referiu ainda que a AEVP não acredita na destilação de aguardente na região como forma de resolução do excedente.
O uso dos excedentes para produzir aguardente vínica a incorporar no vinho do Porto tem sido defendida por associações de produtores e viticultores e o ministro da Agricultura pediu um estudo sobre a legalidade e a viabilidade económica da medida.
“Nós estamos convencidos que irá criar mais problemas do que vai resolver, nomeadamente em termos de legalidade, de impacto no funcionamento dos mercados e na imagem internacional para a região”, referiu.
Garantiu ainda que a AEVP está disponível “para dialogar” e “construir uma solução”.