A ONU alertou hoje que as secas são “uma emergência sem precedentes à escala planetária” e poderão vir a afetar 170 milhões de pessoas em todo o mundo, pelo que apelou à necessidade de “resistir globalmente”.
O alerta consta do relatório “Global Drought Snapshot” (Relatório Global da Seca), elaborado pela Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação (CNUCD), em colaboração com a Aliança Internacional para a Resiliência à Seca (IDRA), e apresentado na Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP28), a decorrer no Dubai até dia 12 de dezembro.
Segundo o relatório, citado em comunicado, “poucos ou nenhuns perigos ceifam mais vidas, causam mais perdas económicas e afetam mais setores das sociedades do que a seca”.
Os dados do relatório hoje apresentado na COP28 preveem que cerca de 170 milhões de pessoas sejam afetadas pelas secas extremas caso as temperaturas médias globais subam 3°C acima dos níveis pré-industriais, mais 50 milhões do que o previsto se o aquecimento for limitado a 1,5°C
Revelam que 630.000 km2 de extensão da Europa foram afetados pela seca em 2022, uma vez que este continente registou o verão mais quente e o segundo ano mais quente que há registo, e preveem um aumento de 80% da intensidade das secas na China até o ano 2100.
“Ao contrário de outras catástrofes que atraem a atenção dos ‘media’, as secas acontecem silenciosamente, passando muitas vezes despercebidas e não provocando uma resposta pública e política imediata. Esta devastação silenciosa perpetua um ciclo de negligência, deixando as populações afetadas a suportar o fardo isoladamente”, referiu o Secretário Executivo da CNUCD, Ibrahim Thiaw, citado no comunicado.
A nível da agricultura e das florestas, o relatório “Global Drought Snapshot” conclui que 70% das culturas de cereais foram danificadas pela seca no Mediterrâneo, revela uma perda de 33% de terras de pastagem na África do Sul, e mostra que 73.000 km2 da área média de terras agrícolas da UE foram afetados pela seca entre os anos 2000-2022, contribuindo para a quebra das colheitas.
Adianta que cinco estações de chuvas falhadas consecutivas no Corno de África causaram a pior seca da região nos últimos 40 anos, contribuindo para a redução da produtividade agrícola e para a escassez alimentar.
Esta situação traduziu-se em 23 milhões de pessoas em situação de grave insegurança alimentar no Corno de África em dezembro de 2022.
O relatório “diz muito sobre a urgência desta crise e sobre a criação de uma resiliência global face à mesma. Com a frequência e a gravidade dos fenómenos de seca a aumentar, à medida que os níveis dos reservatórios diminuem e o rendimento das colheitas diminui, à medida que continuamos a perder diversidade biológica e a fome se espalha, é necessária uma mudança transformacional”, afirmou Ibrahim Thiaw.
Para reverter este quadro, o relatório destaca a necessidade de recuperação e gestão sustentável das terras e práticas agrícolas, por exemplo através da substituição dos produtos de origem animal por alternativas sustentáveis, referindo que até 25% das emissões de CO2 podem ser compensadas por este tipo de soluções.
Refere também que a substituição dos sistemas de aspersão pelos de micro-irrigação (irrigação gota a gota) poderá reduzir o desperdício de água em 20-50% e que as zonas terrestres e marítimas da União Europeia devem ser sujeitas a medidas de recuperação até 2030, com medidas em vigor para todos os ecossistemas que precisam de recuperação até 2050.
O relatório salienta ainda a necessidade de gestão eficiente da água e de preparação para as catástrofes através de sistemas de alerta precoce, tal como o investimento em ferramentas de monitorização meteorológica, recolha de dados e avaliação de riscos.
“Não temos alternativa a avançar de uma forma que respeite os limites do planeta e as interdependências de todas as formas de vida. Precisamos de chegar a acordos globais vinculativos para medidas proativas que devem ser tomadas pelas nações para reduzir os períodos de seca”, conclui.
Representantes de quase todos países do mundo estão reunidos no Dubai até 12 de dezembro para a 28.ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP28), em que será feito o primeiro balanço global de oito anos de ação climática.