Os apicultores profissionais do Alto Minho tiveram de adaptar as suas explorações à invasão da vespa asiática para proteger o sustento da família, que tem na produção de mel uma fonte de rendimento.
Desde a chegada desta praga a Portugal, há 11 anos, as contas do presidente da Associação Apícola de Entre Minho e Lima, Alberto Dias, apontam para mais de meio milhão de euros de prejuízos por ano causados pela vespa asiática, espécie que precisa de comer por dia “entre 700 gramas a um quilograma de abelhas” para crescer forte.
“Por ano, cerca de 30% das 12 mil colmeias que os nossos associados têm morrem. São cerca de quatro mil colmeias e cerca de 100 euros de investimento, em cada uma, que se perdem anualmente”, avançou.
Segundo Alberto Dias, “cada colmeia produz, em média, por ano, 20 quilogramas de mel”.
“Estamos a perder uma média, por ano, de 80 mil quilogramas de mel, vendido a seis ou sete euros o quilograma. São mais de meio milhão de euros que vão ao ar. Se o cálculo simples de fazer for alargado ao país, é fácil perceber o impacto desta praga no setor apícola”, alertou Alberto Dias.
Natural das regiões tropicais e subtropicais do Norte da Índia ao leste da China, Indochina e ao arquipélago da Indonésia, a espécie entrou na Europa através do porto de Bordéus, em França, em 2004. Os primeiros indícios da presença da vespa velutina no distrito de Viana do Castelo surgiram em 2011, mas a situação começou a agravar-se a partir do final do ano seguinte.
A partir daí, adiantou Alberto Dias, a apicultura viu-se obrigada a “dar uma volta” para se adaptar à nova realidade.
“Percebemos que para termos 100 colmeias a produzir temos de instalar 140 colmeias. Sabemos que vamos perder as 40 colmeias para a vespa asiática, a que se junta o prejuízo com todo o material que compramos”, especificou.
Com um predador “altamente carnívoro” nas redondezas, com um “maxilar capaz de roer a casca de qualquer fruta e até de carne, a abelha-europeia (Apis mellifera), utilizada para a produção de mel, não sai das colmeias.
Os apicultores profissionais “há muito que estão sensibilizados para o problema e arranjaram técnicas para manter as suas colmeias”.
“Como as abelhas não saem é necessária alimentação de suporte. Estamos a gastar quatro a cinco quilogramas de alimentação, por ano, para garantir a sobrevivência, em média, de 60 mil abelhas, dentro das colmeias”, explicou.
A praga começa a “despertar” na primavera. “Os ninhos começam por ter o tamanho de uma bola de pingue-pongue, por volta de maio de uma bola de futebol e depois temos um cesto que pode ter mais um metro de altura e 80 centímetros de largura”, explicou.
É a partir de agora, realçou Alberto Dias, que deve avançar a prevenção com colocação em “massa” de armadilhas de fabrico caseiro.
Basta uma garrafa de plástico, de um litro, que se corta pela parte superior. O gargalo é introduzido no interior da parte cortada e funciona como entrada para a vespa asiática, atraída pelo açúcar, fermento de padeiro e água colocados no interior.
Outra “alternativa mais eficaz é fazer um buraco na garrafa, introduzir uma cápsula de café usada nas máquinas caseiras, de preferência amarela, cor que atrai a espécie. No interior da garrafa há na mesma açúcar, fermento de padeiro e água”.
Atraídas pelo alimento, entram e acabam por morrer de exaustão, ao tentar escapar do recipiente.
A “grande preocupação” da APIMIL são os apicultores amadores, “mais de 50% com mais de 65 anos” que “não se adaptaram à nova realidade ou não querem abandonar a forma tradicional de produzir mel”.
“Perdem muitos efetivos [abelhas]. Tememos que essa atividade venha a desaparecer rapidamente”, referiu.
Todos os anos, em setembro, a APIMIL realiza o seu “Censos” e, dos 200 apicultores que estavam associados em 2021, cerca de 70% ainda não se habituou ao novo sistema por representar mais custos.
Alberto Dias admitiu que a praga tornou o setor “pouco atrativo” e lamentou “algumas desistências”.
“Há casos de jovens que investiram em colmeias, com ajudas de programas comunitários, que ou acabam com dívidas ou deixam os projetos a meio porque não conseguem aguentar”, referiu.
O presidente da APIMIL defendeu que a atribuição de verbas ao mundo rural deve ser uma prioridade dos governos.
“O que é que Alto Minho vai perder quando estas pessoas abandonarem esta atividade. Se estas pessoas deixarem o mundo rural, deixarem as abelhas que para produzirem um quilograma de mel dão a volta ao mundo para ir buscar o pólen às flores, quem vai polinizar a flora do Alto Minho?”, questionou.
Se há 11 anos “os ninhos eram construídos nas copas das árvores, rapidamente passaram para arbustos e para o chão, como os campos agrícolas”.
“Há agricultores que tocam num vespeiro quando andam nas lides agrícolas e que deixam os tratores a trabalhar para fugir ao ataque das vespas asiáticas”, contou.
“Parece que tudo desperta quando chega a Lisboa. Até isso acontecer, éramos vistos como pessoas que não são normais, que falávamos de uma coisa que desconheciam e sobre a qual nem queriam saber. No início dos nossos alertas era quase proibido falar do assunto, mas Deus é grande e o mundo é redondo. Era só uma questão de tempo”, insistiu.
Com as alterações climáticas, em janeiro, na freguesia de Castelo de Neiva, em Viana do Castelo, “foram detetados ninhos ativos”, quando até aqui “mantinham-se ativos até outubro, no máximo até novembro”.
“Ou seja, neste inverno a espécie pouco ou nada hibernou e, por isso, temos mais fundadoras. Se temos mais fundadoras, vamos ter um ano com muitos mais ninhos”, vaticinou.
Vespa asiática entrou em Portugal há 11 anos e ainda ninguém a parou