A conjuntura internacional, com diversos conflitos armados sem fim à vista e um reforço do discurso extremado e fraturante, apela à necessidade de agir no sentido de construir uma sociedade que não deixe ninguém para trás, que promova a coesão social em pleno respeito pelos limites do planeta, visto que nunca poderá haver prosperidade se a base ambiental for descurada.
Para que tal se torne uma realidade, torna-se necessário concretizar políticas que permitam que Portugal caminhe para uma Economia do Bem-Estar, promotora da biodiversidade, eficiente no uso de recursos e neutra em emissões em 2040.
Em sintonia com este objetivo, será fundamental começar a integrar os interesses das gerações futuras no processo de tomada de decisão política, pelo que a ZERO apela a que o Governo Português promova uma legislação que leve a que os interesses das gerações futuras passem a ser um elemento central na tomada de decisão. Esta proposta está em linha com uma iniciativa internacional – The Future Generations Iniciative – da qual a ZERO é parceira.
De uma forma transversal, a ZERO considera fundamental que o Governo Português invista em três aspetos fundamentais:
- Assegurar a plena aplicação da legislação e da regulamentação, de forma a garantir maximizar os benefícios para o país decorrentes da legislação em vigor e garantir a equidade nas condições de operação entre quem cumpre e quem não cumpre.
- Melhorar a quantidade e qualidade dos dados disponibilizados pela Administração, pois só dessa forma será possível tomar decisões informadas e que respondam aos desafios reais que o país enfrenta.
- Credibilizar a intervenção das instituições públicas que devem ser o garante da defesa do bem-comum garantindo a idoneidade e independência de interesses corporativos dos responsáveis máximos de instituições públicas centrais na definição e implementação da política e da legislação ambiental em Portugal.
As propostas temáticas
No que diz respeito às medidas estruturais temáticas apresentadas de seguida, estão organizadas por ordem alfabética e são as consideradas prioritárias, ainda que não sejam as únicas onde será necessário investir num futuro próximo.
Agricultura
- Revogar a legislação que prorroga o Programa Nacional de Regadios até 2028, sujeitando-o uma avaliação ambiental estratégica, bem como dar prioridade, na eventual revisão do Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC), à implementação de cadeias curtas agroalimentares, como pilar estratégico para a melhoria de rendimento dos agricultores, renovação geracional e economia circular. Particular atenção deverá ser dada à urgente revisão do tarifário da água para os utilizadores do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva e à aplicação da nunca aplicada taxa de beneficiação que deveria incidir nos utilizadores de todos os aproveitamentos hidroagrícolas.
Água
- Na área da água, exige-se a publicação imediata dos Planos de Gestão dos Riscos de Inundação, bem como sensatez na análise de falsas soluções que incluem novas barragens e transvases, como a chamada “autoestrada” da água (provavelmente uma nova “SCUT”), quando o problema se foca na redução da procura e não no aumento da oferta de um recurso que tenderá a ser cada vez mais escasso, sendo exemplo paradigmático desta situação o que se passa na região do Algarve.
Avaliação ambiental
- Revogar o denominado “Simplex Ambiental” e fazer uma revisão profunda da desacreditada legislação de avaliação de impacte ambiental, que inclua uma redefinição dos prazos, das tipologias abrangidas e de processos redundantes, para que a mesma se torne um verdadeiro instrumento de carácter preventivo da política de ambiente e não, como acontece muitas vezes, uma “via verde” para promover a alteração do uso do solo, reforçando a participação pública e a monitorização dos impactes após a implementação dos projetos.
Clima
- Proceder à implementação e regulamentação da Lei de Bases do Clima, nomeadamente à célere operacionalização do Conselho para a Ação Climática (CAC), incluindo a preparação urgentemente da estratégia industrial verde e dos orçamentos de carbono.
- Terminar a revisão do Plano Nacional de Energia e Clima e preparar uma revisão ambiciosa do Roteiro para a Neutralidade Carbónica para 2045, adequando-os aos novos compromissos europeus e aos decorrentes da Lei de Bases do Clima, colocando o país com emissões negativas em 2050.
Conservação da natureza
- Publicação imediata da regulamentação do Cadastro Nacional dos Valores Naturais Classificados, prevista desde 2008 no Regime Jurídico da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (RJCNB), aprovação e publicação dos Planos de Gestão das Zonas Especiais de Conservação, bem como mais investimento na conservação de habitats e espécies ameaçadas de extinção, com particular atenção ao lobo-ibérico e às aves estepárias.
Energia/Transportes
- Revisão do Plano Estratégico de Transportes à luz do Plano Nacional de Energia e Clima e do Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2045 e conclusão da Avaliação Ambiental Estratégica do Plano Ferroviário Nacional, dando prioridade aos investimentos com maior potencial de redução do impacte ambiental.
- Decidir, com um consenso partidário alargado, a localização do novo aeroporto de Lisboa respeitando as conclusões do relatório da CTI, escolhendo a opção estratégica viável com o menor impacto ambiental e que salvaguarde a saúde pública com o encerramento do aeroporto Humberto Delgado no mais breve espaço de tempo possível.
Florestas
- Na área das florestas, deve-se dar, de forma inequívoca, continuidade ao Programa de Transformação da Paisagem, dirigido aos territórios vulneráveis aos incêndios, deve-se reforçar os apoios à promoção das espécies autóctones, combinando-os com a remuneração dos serviços de ecossistemas, enquanto se mantém a atual política de limitação ao incremento da área ocupada por espécies de rápido crescimento, melhorando o mecanismo de compensação previsto na legislação.
- Deve-se ainda garantir a implementação do Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais, mantendo a Agência de Gestão Integrada dos Fogos Rurais na dependência do Senhor Primeiro-Ministro e, não menos importante, avaliar o cumprimento dos planos de ação para 10 anos das centrais de biomassa, as quais beneficiam de um insustentável pagamento majorado da eletricidade produzida e de uma ausência de clarificação da definição do conceito de biomassa florestal residual.
Oceano
- Acelerar a implementação da Rede Nacional de Áreas Marinhas Protegidas, dando desde já prioridade à criação de um quadro jurídico próprio, que consagre também o objetivo de antecipar, para 2026 a meta de criação de 30% de Áreas Marinhas Protegidas.
Recursos / Resíduos
- Num momento em que Portugal não cumpre as principais metas de reciclagem de resíduos é imperativo que sejam criadas as condições necessárias para a plena implementação do PERSU 2030 (Plano Estratégico de Gestão de Resíduos Urbanos) e demais objetivos associados a fluxos específicos (por exemplo, os resíduos de equipamento elétrico e eletrónico). Para tal será necessário usar diferentes estratégias, entre elas: potenciar o tratamento in situ (biorresíduos); alargar muito a recolha de proximidade, utilizar instrumentos financeiros, como os sistemas de depósito com retorno, para estimular empresas e cidadãos a reduzir a produção de resíduos, a reparar e reutilizar e a encaminhar os resíduos produzidos para reciclagem.
- Implementar, com caráter de urgência, o sistema de depósito com retorno para embalagens descartáveis de plástico e metal, sistema que já deveria estar em funcionamento desde janeiro de 2022, mas que só no final de março de 2024 foi regulamentado. De qualquer modo, há ainda muito a fazer até que o sistema possa estar no terreno, pelo que deve haver agilidade nos procedimentos que ainda serão necessários para o pôr a funcionar.
- Na área dos resíduos perigosos é fundamental a publicação da legislação ProSolos (Prevenção e Remediação da Poluição do Solo) e da legislação sobre os Centros de Tratamento de Resíduos Perigosos (CIRVER), nomeadamente no que se refere à obrigação destas tipologias de resíduos só poderem ser tratadas em unidades com as características dos CIRVER.
União Europeia
- Que Portugal assuma uma postura proativa e interventiva, no sentido de procurar que a União Europeia mantenha a sua liderança mundial em termos de sustentabilidade.
Fonte: ZERO