Uma investigadora da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto adiantou hoje que a psila africana dos citrinos, inseto detetado em 2015 em Portugal continental, “está controlada” pelo seu parasita e já “não é um problema” na região Norte.
“Aquilo que poderia ser um problema ficou resolvido. Neste momento, a psila africana dos citrinos não é um problema porque está controlada”, afirmou à Lusa Ana Aguiar, professora da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP).
Considerado um organismo de quarentena na União Europeia, a psila africana dos citrinos, cientificamente designada de ‘Trioza erytreae’, está presente na ilha da Madeira desde 1994.
Em Portugal continental, o inseto foi detetado, pela primeira vez, no inverno de 2014/2015 em jardins particulares na área do Grande Porto, mais concretamente no concelho da Maia. Desde então, deslocou-se pelo litoral, tendo, em 2020, sido detetado a sul do rio Tejo e, em 2021, chegado ao Algarve.
Com provável origem na Eritreia, país no nordeste africano, o inseto faz “estragos muito visíveis” nos citrinos, mas que “não se traduzem em prejuízo”, explicou Ana Aguiar, investigadora no centro GreenUPorto.
“A maior preocupação desta praga não tem a ver com os estragos ou prejuízos que causa, mas o facto de se tratar de um inseto que é vetor de uma bactéria letal para os citrinos”, afirmou, referindo-se à bactéria ‘Candidatus liberibacter’, agente causal da ‘Citrus greening’.
A ‘Citrus greening’ é considerada “a doença mais devastadora dos citrinos” e, apesar de não ter sido detetada na Europa ou em Portugal, “teme-se pela sua entrada”.
“Por isso, quando a ‘Trioza erytreae’ foi detetada procurou-se de imediato proceder à sua monitorização e controlo”, observou a investigadora.
Apesar de a monitorização do inseto em Portugal ser “um caso de sucesso e de boa articulação”, Ana Aguiar adiantou que, após a sua deteção, as primeiras orientações do Ministério da Agricultura foram “inúteis” e “desadequadas”.
“Nos anos que se seguiram o Ministério da Agricultura emitiu ordens de corte nos ramos infetados ou nos ramos com sintomas e a aplicação de inseticidas. Foram medidas completamente inúteis, porque não controlaram a praga, e desadequadas, porque desequilibraram o ecossistema”, referiu.
Segundo Ana Aguiar, o corte de ramos foi uma medida “contraproducente” ao promover novas rebentações e, consequentemente, a instalação do inseto, cuja fêmea só coloca ovos em folhagem jovem (folhas com um a dois meses).
“Felizmente, o Ministério da Agricultura, através da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), decidiu, a partir de 2019, liderar um processo de proteção biológica, como tinha sido feito em Espanha”, adiantou.
Os processos de proteção biológica assentaram em “largadas de um parasitoide específico de ‘Trioza erytreae’”: a ‘tamarixia dryi’, uma “vespa” sul-africana com “pouco mais de um milímetro” e que apenas “parasita” a psila africana dos citrinos.
Depois da autorização do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), as autoridades responsáveis procederam às largadas (recorrendo a tubos de ensaio com cerca de 100 parasitoides cada), que começaram, em outubro de 2019, na região Norte (Douro e Minho) e que, entretanto, se foram alargando ao resto do país.
As largadas foram realizadas pelas Direções Regionais de Agricultura e Pescas (DRAP) nos territórios abrangidos pelas zonas demarcadas para a ‘Trioza erytreae’, sob a coordenação da DGAV e em colaboração com o Instituto Superior de Agronomia, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade do Algarve e Instituto Politécnico de Bragança.
Ana Aguiar, que à época integrou o grupo de investigação da Universidade do Porto que desenvolveu a metodologia da avaliação e eficácia deste método, destacou que “a eficácia variou entre 32% até 82%” nas primeiras largadas do parasitoide.
“Na região Norte, a vespa deslocou-se a uma velocidade superior a cinco quilómetros por ano”, adiantou a doutorada em Engenharia Agronómica.
Nas regiões do Douro e do Minho foram realizadas cerca de “20 largadas”, método de proteção biológica que interessa levar a cabo na primavera, estação “perigosa” e na qual a psila faz a sua postura, isto é, põe os ovos.
“Neste momento, temos a psila e o seu parasitoide num equilíbrio dinâmico e sempre a níveis baixos. Hoje em dia, é difícil encontrar a psila porque está controlada pelo parasitoide. Mas existe, e é bom que exista a quantidade suficiente [do inseto] para manter o parasitoide vivo”, esclareceu a investigadora, adiantando que na região Norte “não estão previstas mais largadas”.
“Nem faz sentido porque o que largássemos [parasitoide] ia morrer porque não tem alimento”, esclareceu.
Ana Aguiar destacou, contudo, que neste momento importa “não aplicar inseticidas” nos citrinos, isto porque “matam o parasitoide”, pondo em causa todo o trabalho desenvolvido pelas autoridades no controlo da praga.
Apesar deste inseto afetar visivelmente os citrinos, não afeta os seus frutos, que podem ser comercializados, ao contrário da planta em si, que nas zonas demarcadas e zonas tampão obedece a critérios estabelecidos pela DGAV.
A Lusa tentou obter esclarecimentos junto do Ministério da Agricultura e da DGAV, mas até ao momento não obteve resposta.