Entrevista a Manuel Castro e Brito, Presidente da Comissão Organizadora da Ovibeja Se os pol�ticos não se entenderem a sociedade civil terá que reagir
Em v�speras do in�cio da 28� Ovibeja, que se realiza em Beja, de 4 a 8 de Maio, Manuel Castro e Brito considera que "a Ovibeja tem conseguido resistir � crise" e que este ano se verificou mesmo "um aumento do n�mero de inscri��es de expositores". Para o Também presidente da ACOS (Associa��o de Criadores de Ovinos do Sul) a crise que o país vive "� grave", mas "a vida tem que continuar". Da� que Castro e Brito fa�a um apelo para que, a um m�s das elei��es, os dirigentes partid�rios transformem a maior feira agr�cola do sul "num espaço de democracia mais directa", aproveitando para falarem "directamente com as pessoas" e para levarem da Ovibeja "mensagens a que, posteriormente, possam dar resposta".
Com o país em recessão, com a presença do FMI em Portugal e uma situa��o econ�mica muito dif�cil, quais são as perspectivas para esta edição da Feira do Alentejo? Vai continuar a ser uma grande Ovibeja? Vai ser uma grande Ovibeja, pelo que sabemos. Ao nível. de inscri��es de expositores não houve quebra relativamente a anos anteriores, houve até aumento, e esperemos que a din�mica destes novos acontecimentos seja Também abordada aqui na Feira, que � um espaço de encontro, mas Também de discussão. E sobre estes temas h� muita expectativa entre as pessoas.
Sendo a Ovibeja todos anos um grande palco pol�tico, este ano ainda o poder� ser mais com elei��es legislativas, antecipadas, � porta. A Ovibeja Também � para os pol�ticos, para os partidos, e Também serve para exercer uma democracia mais directa porque nestas alturas os pol�ticos estáo mais dispon�veis para falarem directamente com as pessoas. E essas questáes v�o estar, certamente, na agenda.
Anualmente a Ovibeja serve Também para que os respons�veis pelo sector agr�cola aqui venham apresentar as linhas de desenvolvimento que preconizam para as diversas áreas. Este ano o governo está demission�rio e em gestáo. As respostas não seráo poucas? O governo � de gestáo, mas o PS concorre �s elei��es e h�-de ter um projecto para a futura governa��o. Tanto o PS como os partidos da oposi��o poder�o levar Também, daqui da Ovibeja, mensagens a que, posteriormente, possam dar resposta.
Como � que a ACOS, enquanto organiza��o de agricultores, v� esta entrada do FMI em Portugal e Também esta crise pol�tica em que o país está mergulhado? Eu penso que tudo tem solu��o na vida, e se a interven��o do FMI devia ter sido antes ou agora, � algo que pode ser discut�vel. No entanto, a análise terá que ser feita com base nos resultados. Se o FMI servir para pôr as contas em dia será bem vindo. No entanto, os sacr�ficios seráo muito grandes para as pessoas, mas sobretudo para as empresas agr�colas que j� estáo a ter muitas dificuldades, sobretudo em áreas como o cr�dito e com os muitos cortes que t�m havido nos �ltimos tempos. Para além disto, as empresas agr�colas Também estáo � merc� do clima e do tempo. As coisas não estáo famosas, mas � preciso ultrapassarmos esta crise.
Tem sido uma crise muito sentida pelo sector agr�cola? Ou h� áreas que lhe tenham escapado? Tem sido bastante sentida e ainda mais, recentemente, com a subida das taxas de juro e Também com os cortes or�amentais que tememos possam pôr em causa muitos projectos de investimento ao abrigo da pol�tica agr�cola comum, que teráo que ter Também uma comparticipa��o do estado portugu�s. E vamos ver se as coisas correm bem por esse lado.
� dif�cil Portugal ser competitivo nalguns produtos agr�colas
O sector agr�cola tem sido sujeito a mudan�as muito r�pidas de pol�ticas. T�o depressa se diz que o agricultor não deve produzir, para passar a ser o guardi�o do ambiente, como se anuncia que � preciso refor�ar a produ��o agr�cola nacional. Isto baralha o comum dos cidad�os: afinal Portugal conseguiria produzir tudo o que consome ou não? N�s produzimos 70 por cento daquilo que comemos. Ou seja, importamos 30 por cento do que consumimos. H� uns produtos que produzimos mais, outros menos, mas esta � a média. Os agricultores produzem mais ou menos conforme as vantagens que t�m e conforme as regras pr�prias de qualquer neg�cio: se tirarem da� rendimento produzem, senão não produzem. Houve alguma subida de produtos agr�colas, nomeadamente dos cereais e das oleaginosas, o que fez com que este ano os agricultores tivessem maior actividade nestas culturas, mas a meteorologia Também não ajudou na altura das sementeiras. No entanto, este ano poder� ser o da recupera��o, pelo menos, dos cereais, o que � muito importante para esta regi�o.
Mas, se existissem pol�ticas adequadas, Portugal poderia ser auto-suficiente do ponto de vista alimentar? � dif�cil porque da parte de alguns produtos temos uma concorr�ncia muito grande, seja de países da União Europeia, seja de países terceiros. Por outro lado, as cadeias de distribui��o em Portugal não ajudam a produ��o nacional e isso não convida a que se produzam alguns produtos, porque não são economicamente compensadores.
H� um ano, no encerramento da 27� Ovibeja, o presidente da República, Cavaco Silva referiu-se a essa questáo apelando aos distribuidores para apostarem na produ��o nacional, pagando um "pre�o justo" aos produtores. Neste ano sentiu-se alguma diferen�a no relacionamento com as grandes cadeias de distribui��o? No aspecto dos pagamentos, que eram a v�rios meses, a situa��o pode ter melhorado um pouco, mas no aspecto das importa��es de produtos, em que não somos concorrencias, mas em que Também não se paga a qualidade do que produzimos, tudo continua na mesma.
está a referir-se, por exemplo, ao sector pecu�rio? Sim. O sector bovino tem-se mantido estabilizado, enquanto os ovinos e caprinos t�m diminu�do vertiginosamente. Neste sector muitos produtores desistiram, porque os pre�os são os mesmos do que h� 20 ou 30 anos e Também porque, julgo eu, não se ter insistido mais junto da Comissão Europeia para estes sectores, que geralmente ocupam terras com pouca aptid�o agr�cola e de explora��es de interior, com dificuldades de m�o de obra, e que deviam ser mais ajudados. Também a burocracia que anda � volta do sector animal � muito pesada e leva alguns a desistirem.
E a distribui��o tem protegido esse sector? não. N�s eramos autosuficientes em carne até h� pouco tempo. Agora não o seremos tanto, mas não somos competititvos com as importa��es que h�, no caso dos borregos, da Austr�lia e da Nova Zel�ndia que fazem "dumping" e t�m grandes apoios � exportação destes produtos. Também não temos a compreensão dos distribuidores porque os nossos produtos t�m muito mais qualidade do que a carne de ovino que � importada e isso pouco lhes interessa.
O mercado portugu�s não premeia a qualidade? não. Nem a distribui��o se interessa por isso. �s grandes cadeias interessa ter carne de qualidade, nacional, para fazer promo��o da carne que � importada, porque nas grandes superfic�es existe uma confusão, que eu acho que � propositada, entre os diversos produtos.
Acha que devia haver campanhas no sentido de "educar" os compradores para a qualidade? Acho que sim, mas devia haver Também uma individualiza��o do produto quando chega ao consumidor, mas a verdade � que, �s vezes, existe uma montra de carne nacional e h� refer�ncia a isso, mas na mesma montra existe carne importada, sem a mesma qualidade, e muito mais barata.
� preciso repensar o pre�o e o modelo de gestáo da �gua
A ACOS, que organiza a Ovibeja, tem mantido um bom relacionamento com o actual ministro da Agricultura, Ant�nio Serrano. O que � que facilitou o di�logo? De facto, houve uma altera��o positiva. Este ministro � uma pessoa com bom senso e � uma pessoa que trabalhou e melhorou algumas situa��es, principalmente no funcionamento da Pol�tica Agr�cola Comum, mas Também porque se aproximou muito dos agricultores, colaborou muito connosco e as coisas melhoraram a esse nível..
Entre esta e a anterior Ovibeja mudou alguma coisa na agricultura alentejana, a não ser, o que não � pouco, o crescimento da área de olival? J� se sente o efeito da �gua de Alqueva? Isso � evidente. A �gua j� rega os olivais e outras culturas. H� mais sistemas de rega, mais utiliza��o da �gua e as coisas v�o-se fazendo. Esperemos que não abrandem agora com esta nova situa��o politica. H� um grande investimento da parte dos agricultores e das empresas agr�colas, porque a transi��o do sequeiro para o regadio não � f�cil ao nível. do investimento, mas Também tem que haver uma aprendizagem nas culturas de regadio. � uma aprendizagem que se está a fazer, para mim a grande velocidade, e tudo aponta para que as coisas v�o correr bem.
Por vezes tem-se a ideia de que a �gua de Alqueva está apenas a servir para regar os novos olivais. � assim? Essa � uma afirma��o recorrente e feita, muitas vezes, por pessoas que não estáo dentro do sector. � muito positivo que Portugal deixe de ser importador de azeite e passe a ser exportador e isso vai acontecer dentro de muito pouco tempo. Foi um sector que se desenvolveu muito, não apenas no aspecto da cultura, mas Também da transforma��o. H� muitos lagares e lagares modernos, o que Também faz que tenhamos uma muito boa qualidade de azeite. Esse � um dado muito positivo. Mas outras culturas estáo a aparecer como o milho, pomares, fruteiras e outras que se estáo agora a ensaiar. Esta coisa dos olivais faz-me lembrar aquela f�bula do rapaz, do velho e do burro. O que � mais perigoso � a ignor�ncia.
Mas o pre�o da �gua de Alqueva continua um problema, a prazo? Sim. O pre�o da �gua � condicionante e quem está a regar está a pagar hoje 30 por cento do pre�o da �gua. O pre�o está escalonado e daqui a sete anos, quando for pago na totalidade, o pre�o da �gua pode ser uma limita��o ao desenvolvimento da nossa agricultura e da nossa economia. � um assunto que tem estado em debate, tal como o do modelo de gestáo da �gua, que não pode ser um modelo estatizado, através de uma empresa de capital cem por cento do Estado. Também tem que haver di�logo para resolver este caso e uma partilha entre os agricultores e as suas organizações.
Os pol�ticos t�m que se entender
As elei��es v�o ser no dia 5 de Junho, sensivelmente um m�s depois da Ovibeja. O que � que os agricultores esperam deste novo governo? Eu, neste caso, não posso falar pelos agricultores, mas h� aqui um grande ponto de interroga��o. O que os empres�rios, em geral, esperam dos governos � que os deixem trabalhar e, naquilo que lhes diz respeito, que tem a ver com as negocia��es com a União Europeia e com outros países, que sejam competentes e que não utilizem todas as oportunidades para fazerem pol�tica partid�ria ou mesmo pessoal. H� neste momento um grande descr�dito e uma grande falta de confian�a na classe pol�tica e isso não � bom. Aqueles que t�m empresas pequenas, grandes ou micro, como � o caso de grande parte das empresas agr�colas, de tipo familiar, o que querem � que "eles se entendam". E se não houver um entendimento entre os pol�ticos a sociedade civil terá que reagir e assumir algumas situa��es.
Preconiza uma interven��o maior da sociedade civil se não houver entendimento entre os partidos para governarem o país, criando uma maioria alargada? Obviamente. As pessoas precisam de trabalhar e de produzir no seu dia a dia com sossego e com confian�a e em que vejam que o seu investimento, o seu esfor�o e o seu trabalho não foram em v�o.
A Ovibeja este ano tem como tema central o Ano Internacional das Florestas, que está a decorrer. A floresta � importante para os rendimentos dos agricultores no Alentejo? � e cada vez tem mais import�ncia porque se desenvolveram bastantes projectos florestais que, por um lado, contribuem para o rendimento dos agricultores, mas Também para a imagem e o impacto ambiental do país e para a pr�pria balan�a de pagamentos.
Ainda que os pre�os, por exemplo, dos produtos da floresta tradicional do Alentejo – o montado -, como a corti�a tenham vindo a cair "a pique" nos �ltimos anos. Temos esse problema em sectores muito cartelizados e em que � dif�cil a entrada em novos mercados. Este �, de facto, um problema que se tem vindo a agudizar nos �ltimos tempos.
Xutos e Buraka nas ovinoites
A Ovibeja tem quase tr�s d�cadas e, dentro do figurino que � o seu, não tem sofrido grandes altera��es ao longo dos anos, embora apresente sempre algumas novidades. Quais são os pontos de atrac��o para esta edição? Este ano vamos fazer uma abordagem ao Ano Internacional das Florestas, tratando-o como um assunto que � preciso debater e desenvolver; vamos mostrar Também toda a fileira do olival e do azeite e, através de v�rios col�quios, abordar temas de actualidade como são a reforma da PAC e a sua or�amenta��o, para além de diversas actividades e debates em torno daquilo que produzimos e das novas tecnologias e equipamentos, indispens�veis para uma agricultura moderna.
Um dos momentos altos da Ovibeja �, todos os anos, o cartaz de espect�culos. Mas Também o conv�vio, os copos, as ovinoites, os neg�cios� A Ovibeja � um ponto de encontro, � uma oportunidade para as pessoas virem ao Alentejo, para serem confrontadas com a nossa gastronomia, Também a nossa maneira de ser, e Também como um espaço l�dico e de conv�vio. As ovinoites j� fazem parte da tradi��o e realizam-se aqui os primeiros grandes concertos, transformando as noites da Ovibeja num dos primeiros festivais de m�sica a realizar-se no país antes do Ver�o. Temos optado mais por grupos nacionais e este ano não fugimos � regra e a qualidade do cartaz � bel�ssima. Vamos ter os "Xutos & Pontap�s" na noite de s�bado, dia 7 de Maio, a grande noite da Feira. Os espect�culos come�am logo no dia de abertura, quarta-feira, dia 4 de Maio, com a irrever�ncia de Tunas Acad�micas, no dia 5 teremos os Expensive Soul, cabendo aos Buraka Som Sistema a anima��o da noite de sexta-feira, dia 6 de Maio, outra noite em grande em que as portas da feira não chegam a fechar.
A Ovibeja, apesar da crise, continua a ser uma feira sustent�vel, que se auto-financia? A Ovibeja � uma marca muito forte, tem muito prestágio e não tem sentido agudamente os problemas e as dificuldades da crise, sentidos por muitas outras feiras. Temos todos os espaços vendidos, temos mais inscri��es do que no ano anterior, o que nos leva a crer que a Ovibeja continua a ser um bom investimento para quem c� vem e, por isso, continua a ser uma feira de sucesso. Demonstramos que, apesar das crises, a vida não pôra. Vamos continuando a trabalhar e temos aqui, na Ovibeja, todas as condi��es para que se crie um clima de encontros e de neg�cios. E são todos os que aqui v�m fazer neg�cio e o público em geral que nos ajudam a manter a feira.
Beja, 18 de Abril de 2011
Fonte: Ovibeja
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