A experiência com o tomate coração-de-boi reforça, se necessário fosse, a ideia de que o Douro é um território muito heterogéneo.
Que o Douro não é só vinho, já sabíamos. Mas que, mais recentemente, seria o tomate a conquistar visibilidade é algo inesperado. Mas é também, por outro lado, a prova de que, quando há uma boa estratégia, se conseguem resultados. Interrompido, entretanto, pela pandemia, o concurso do tomate coração-de-boi do Douro ia em 2019 na sua quarta edição e com um sucesso crescente.
A ideia foi desafiar os hortelãos locais a competir com o melhor tomate coração-de-boi, mostrando a excelência do terroir do Douro para este produto – e, na sequência disso, fazer dos restaurantes da região, durante cada mês de Agosto, uma montra das melhores formas de o servir à mesa.
“Conseguimos ter uma dinâmica muito saudável de competição na procura do melhor terroir e do melhor sítio para cultivar na região”, confirma o arquitecto paisagista João Bicho, responsável pela horta da Quinta do Ventozelo. Têm ganho as zonas mais frescas porque “o tomate fica mais consistente, não amadurece tão depressa”.
A experiência com o tomate reforça, se necessário fosse, a ideia de que o Douro é um território muito heterogéneo. “Temos um Douro de Mesão Frio até Foz Côa com microssítios muito diferentes. E depois temos uma coisa ainda mais complicada, porque vamos das margens do rio, a uma quota 80, até à quota 400, ou 700, em alguns sítios”, explica João Bicho.
Para as hortas, os locais mais indicados são os próximos do rio. “Aí o Douro é mais temperado, com menos frio, menos geadas, o que nos permite ter algum adiantamento das culturas e sabores mais aprofundados.” Foi precisamente essa intensidade de sabor que encantou Abílio Tavares da Silva, produtor de vinho da Quinta de Foz Torto (e, juntamente com Celeste Pereira, da empresa de comunicação Greengrape e com o jornalista Edgardo Pacheco, organizador do concurso do tomate).
“As condições extremas”, diz Abílio, “favorecem a síntese de óleos essenciais. Aqui o Inverno é bastante frio e o Verão muito quente e isso pode diminuir a produção, mas também melhorá-la. As coisas são mais saborosas porque o clima favorece isso.” Ao clima juntam-se os solos. “Temos um solo muito pobre em macronutrientes, mas muito rico em micronutrientes, devido à sua origem xistosa. Com este clima e este solo, qualquer erva, mesmo infestante, tem aromas e sabores muito intensos.”
Quem passear pelo Douro nesta altura do ano verá as hortas cheias de couves-pencas para o Natal, mas também, enumera João Bicho, nabos, acelgas, beterrabas, alfaces, funcho, aipo. E, no caso dos hortelãos que se tenham antecipado um pouco, favas, ervilhas, alho, chalotas. “Tendo água disponível, conseguimos cultivar praticamente tudo. O único factor que pode limitar é o frio, porque no Inverno podemos ter alguns dias de geada.”
Concorda inteiramente com o Abílio quanto aos aromas e sabores. “Sim, são mais intensos, por um lado, por via do solo e, por outro, por termos um clima muito duro, quente e seco no Verão. O que detectamos nesses aromas são sobretudo compostos voláteis que a planta usa para se proteger da […]