A Tapada da Ajuda serve para andar de bicicleta e fazer festas ou ‘eventos’? Os alunos têm de ‘saber fazer’ ou têm de ‘decorar umas coisas’ e ‘pesquisar uns artigos na net’?
A casa-mãe onde estudei foi o Instituto Superior de Agronomia – para quem não saiba fica na Tapada da Ajuda (1). Após fazer o curso de Agronomia fiz o de arquitetura paisagista, e continuei a visitar a Tapada da Ajuda e a falar com os seus professores.
Entretanto, quando iniciei os estudos deparei-me com algumas dificuldades. Eu era um filho de Lisboa, não tinha tido contacto com as realidades da lavoura e da pecuária. Assim: como distinguir os grãos de trigo dos de centeio? Como é que se espalhava o estrume nos campos? Quantos vitelos uma vaca paria num ano? E durante quanto tempo os amamentava? etc. etc. Note-se que naquele tempo não havia o ‘Dr. Google’ para responder a estas questões.
Por sorte, como gostava muito de andar a pé, passei um dia pela rua do Arsenal (para quem não saiba, entre o Cais do Sodré e o Terreiro do Paço), e ali vi expostos sacos com trigo, cevada, centeio… Pintos recém-nascidos, debaixo de uma lâmpada de infravermelhos… Fiquei contente. Passava lá muitas vezes, e finalmente aprendi a distinguir os grãos de trigo dos de centeio! E depois das aulas percorria os pomares da Tapada da Ajuda para conhecer as doenças das árvores. Já dispunha, entretanto, de alguns bons livros com gravuras coloridas que a tal me ajudavam.
Mas custava-me ver o pouco caso que se fazia da parte propriamente agrícola da Tapada. Os pomares estavam de tal modo infetados por pragas e doenças que mais pareciam ‘catálogos de doenças’. As vinhas pouca produção davam. Uma antiga vacaria fora desativada – e assim um aluno poder-se-ia formar em Agronomia sem nunca ter visto uma vaca! Ovelhas e porcos não havia (é verdade que se faziam, embora raramente, ‘visitas de estudo’(2).
Na cadeira de Microbiologia faziam-se nas aulas análises ao vinho e ao azeite, mas se os resultados estavam ou não corretos não era verificado… E havia mesmo um ‘contínuo’ (funcionário) para ajudar os menos habilidosos. Lagares de azeite e adegas eram inexistentes (3). Estufas dignas desse nome também.
Esta atitude de desprezo pelo concreto levava a situações caricatas: havia na Tapada, junto ao portão da Ajuda, um viveiro florestal… que tinha um único trabalhador. Como disse, eu gostava de passear pela Tapada, e falava com ele. Um dia disse-me: «Sabe, sr. engenheiro, eu tenho 7 chefes!». E enunciou-os: o sr. engenheiro A, o sr. engenheiro B, o sr. Engenheiro C, etc. Continua o homem: «Um dia veio-me aqui o sr. engenheiro A e disse-me: ‘Cotrim, queria que me fizesse um ensaio’ e eu respondi-lhe: ‘Com certeza, sr. Engenheiro, mas para […]