O aumento das temperaturas está a mudar o cultivo de alfaces e a reduzir o tempo de estufa, e possibilita a produção de variedades que há duas décadas não existiam no país, disse à agência Lusa o empresário agrícola Fábio Franco.
“O período que estamos a cultivar dentro de estufa, de ano para ano, é menor, porque as temperaturas são maiores”, afirmou à agência Lusa Fábio Franco, da Sociedade Agrícola do Vale do Lis, com sede na Ortigosa, ao ser questionado sobre o impacto das alterações climáticas no setor.
Segundo Fábio Franco, de 36 anos e agricultor desde os 19, “há menos necessidade de criar o clima ótimo dentro de estufa”, pois aquele “permite que as plantas estejam mais dias do ano” ao ar livre.
A empresa tem cerca de 50 hectares de cultivo (dois dos quais em estufa), distribuídos por várias freguesias do concelho de Leiria. Noventa por cento da área é dedicado ao cultivo de alfaces.
“O que temos concluído na nossa exploração e na nossa região com o clima que temos é que quando fazemos a transição de ar livre para estufa, que tradicionalmente era em setembro, estamos a fazê-la neste momento em outubro”, referiu o empresário, realçando que a produção ao ar livre mais um mês “tem menos custos”, além de que as plantas “são criadas no seu ambiente natural”.
A este propósito, assinalou que em outubro e novembro, meses nos quais se registavam normalmente temperaturas baixas, agora em outubro há “bons dias de praia”, pelo que “não há necessidade de ir cultivar essas plantas dentro de estufa”.
Já na primavera, “a transição de estufa para ar livre, que era feita em abril, maio”, agora passou para março, adiantou.
“Hoje, conseguimos ter em dezembro e janeiro alfaces de ar livre quando há cinco, seis anos, se calhar não se conseguia fazer isso”, declarou.
Fábio Franco considerou ainda que o clima “tem vindo a sofrer algumas alterações que nem sempre são prejudiciais para a atividade”, exemplificando com a produção de variedades de alfaces que, no passado, não existiam no país.
“O clima, entretanto, foi-se alterando ou foi mudando de padrão e permitiu-nos produzir outras variedades” de alfaces, como a “salanova, chicória e radisshio”, apontou.
De acordo com o empresário, estas variedades “estavam adaptadas a outros climas”.
“Entretanto, foi feito um melhoramento também das plantas e das sementes que usamos e hoje conseguimos produzi-las cá, ainda com algumas restrições, mas já se consegue ter produto nacional que há 20 anos não tínhamos”, observou.
O empresário reconheceu, contudo, que há fenómenos decorrentes das alterações climáticas que provocam prejuízos substanciais.
“O plástico que usamos nas estufas é, normalmente, renovado de cinco em cinco anos”, declarou o engenheiro agrónomo, mas no caso da sua exploração essa renovação nunca foi feita, pois têm existido “ciclos de temporal muito frequentes e que destrói as estufas e destrói os plásticos”.
Por isso, nunca houve renovação. “Eu fiz sempre novo”, afiançou, assinalando que quando há fenómenos de vento forte danificam, além do plástico, as estruturas.
“Os ventos são de tal maneira fortes que destroem tudo”, lamentou, frisando que “os fenómenos têm sido muito frequentes e fortes”.
Por outro lado, face à escassez de água, defende a necessidade de a “gerir muito bem”.
No caso da sua exploração, tem uma certificação do uso eficiente da água, comprometendo-se a reduzir “10% ao ano” dos valores de referência para cada cultura da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, acrescentou o empresário, precisando que isto é alcançado através de sondas que conjugam diversos fatores – humidade do solo, temperaturas médias diárias, volume de precipitação, luminosidade, entre outros, resultando num cálculo do volume de água necessário em cada fase de crescimento da planta.
“Se usarmos métodos de rega mais eficientes, conseguimos melhores produtividades”, declarou, sustentando a necessidade de adaptação, dos cidadãos e das atividades produtivas, face às alterações climáticas.
“Não podemos com a mesma receita esperar resultados diferentes”, notou.