Com o sector primário não se brinca – é primário porque é a base da economia. Lembre-se o confinamento: faltaram alimentos? Não, mas também não foram as hortas nas varandas que alimentaram o país.
Há uns tempos fui jantar a um restaurante dos modernos, com cozinha de autor. Naquela noite apetecia-me ter uma experiência gastronómica, assim se diz hoje. Reservei mesa, porque estes restaurantes estão sempre cheios à sexta-feira à noite. Pedi um TVDE (os antigos Uber) e lá fui ao restaurante.
Entrei e começou o ritual do costume: “O que querem tomar, etc…” Foi-me então entregue o menu, que li com inegável atenção, dado os muitos neologismos utilizados na designação dos pratos gastronómicos de elevada categoria. Após o típico momento de indecisão que carateriza a escolha do prato, optei por um desfiado de carne envolto em capa crocante de cereais das planícies do Alentejo, perfumado com azeite extra virgem de Trás-os-Montes.
Feito o pedido, esperei cerca de 20 minutos até que uma mulher na casa dos 30, com um olhar vivo e transbordando simpatia, colocou à minha frente um prato magistralmente decorado. Ao dar a primeira garfada, cheio de expectativa, percebi que afinal aquele desfiado de carne crocante não era mais do que um digno e delicioso croquete. Adoro croquetes, e, mais, tornei-me fã do croquete.
Esta minha experiência gastronómica fez-me pensar que a agricultura moderna e intensiva, que tanto espaço ocupa na agenda política atual, também é um sistema de produção de elevada eficiência na utilização dos recursos naturais, envolto numa capa de enorme tecnicidade e inovação, e perfumado pela produção de alimentos seguros e sustentáveis. Não é por se mudar o nome que as coisas se tornam diferentes. Os nutrientes de um croquete são os mesmos do desfiado. Um croquete bem feito é delicioso, um desfiado de carne crocante mal feito é um desastre. Não é o sistema produtivo que merece ser atacado, são as más práticas que devem ser denunciadas.
Apenas uma agenda ideológica intencional pode explicar o ataque que hoje se faz à agricultura moderna. Potenciam as palavras, e tão-só as palavras, para caracterizar um setor. Sendo intensivo destrói recursos; se é monocultura, mata a biodiversidade. O mediático é que conta, alimenta a luta política e aduba os interesses do ciclo eleitoral.
Este mediatismo é a universidade que gradua […]
Rui Veríssimo Batista
Agricultor