A Azores Wine Company está a explorar várias castas tintas no Pico. Numa fajã criada pela erupção de 1562, na Baía de Canas, entre a vila de S. Roque e a Prainha, plantou Bastardo, Rufete e Castelão.
A lava “correu para a banda do norte por espaço de uma légua e meia até cair da rocha abaixo e fazer um grande cais abaixo da rocha onde se espraiou aquele polme e se tornou pedra viva, em que não se pode pôr pé descalço nem se cria nenhum género de erva, nem mato”. A descrição é do historiador Gaspar Frutuoso (em Saudades da Terra, do século XVI), a primeira pessoa a escrever sobre a vida nas ilhas.
Não só hoje é possível crescer ali mato — era o que lá estava antes de a Azores Wine Company (AWC) arrendar e recuperar 40 hectares na Baía de Canas/Ponta do Mistério, na zona Norte da ilha do Pico, nos Açores —, como é possível plantar videiras. De quê? Essencialmente, castas tintas, embora também lá haja variedades brancas. Em 2019 e 2020, a empresa (que inaugurou em 2021 adega e apartamentos turísticos nas Bandeiras) plantou numa fajã lávica, entre S. Roque e a Prainha, em plena Reserva Florestal de Recreio da Prainha, mais Arinto dos Açores e Verdelho, um pouco mais da tinta Saborinho (a Tinta Negra da Madeira e o Molar de Colares), um bocadinho de Castelão e uma área considerável de Bastardo e Rufete.
As quatro castas tintas representam 60% dos 40 hectares de vinha (a AWC tem no Pico já 120 hectares de vinha, 50 de vinha própria, o resto arrendada), que em 2022 já teriam produzido, não fosse a sede e a inteligência do pombo-torcaz e do melro-negro, explicou ao Terroir o produtor e enólogo António Maçanita. “Colocámos redes em todas as plantas que entendemos que tinham boas varas à produção, protegemos planta a planta, o que é um bocadinho de doidos, mas o pombo-torcaz e o melro-negro são muito, muito, espertos. Levantam a rede e entram por baixo. Foi uma grande sova.”
Como o é aquele terreno. Se os icónicos currais de pedra basáltica, que compõem a Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico, classificada com Património da Humanidade pela UNESCO desde 2004, protegem vinhas plantadas sobre rocha lávica e quase nenhuma matéria orgânica, obrigando a uma viticultura muito exigente, Baía de Canas é “next level”. É o maior desafio, explicou-nos no local o sócio de Maçanita na AWC, Filipe Rocha. Do Miradouro da Ponta do Mistério da Prainha (os picoenses chamavam Mistérios às zonas lávicas onde não crescia […]