Costuma-se dizer que uma má decisão é melhor que uma não decisão. Tendo a concordar, em especial quando as não decisões se arrastam por décadas sem que nada de substancial aconteça, para além do anunciar de vagas intenções sem consequência.
Sim, falo de água. Ou melhor, da ausência de estratégia na gestão de recursos hídricos, no que a políticas públicas diz respeito.
O que faz um país onde as secas severas e extremas se acentuam de ano para ano e onde regiões substanciais do território não sabem se vão ter água em 2024, seja para agricultura, turismo ou mesmo abastecimento de populações? Nada. Absolutamente nada. Enquanto paramos, pensamos e colocamos planos e estratégias em papel, não fazemos rigorosamente nada de estrutural para resolver a questão. Enquanto isso, aguarda-se com ansiedade por um milagre de S. Pedro para resolver a questão por umas semanas, ou até meses. E depois logo se vê.
“O que faz um país onde as secas severas e extremas se acentuam de ano para ano e onde regiões substanciais do território não sabem se vão ter água em 2024, seja para agricultura, turismo ou mesmo abastecimento de populações? Nada. Absolutamente nada.”
Este logo se vê, que carregamos em sucessivos governos e outras sucessivas estratégias, está a tornar-se um ameaça real para vários setores económicos. Nesta matéria, é preciso frisar, os agricultores estão a fazer, desde há muito, a sua parte. Investiram em charcas, reservatórios e barragens nas suas explorações (com muita burocracia e, às vezes, limitações para obter licenças e autorizações) e estão a trabalhar com ferramentas de precisão que lhes permite usar água com uma eficiência que, diria, está ao nível dos melhores do mundo. Conseguir duplicar produções com metade ou, em alguns casos, um terço da água que se usava há uma década é obra!
Este logo se vê está a levar os agricultores ao desespero por falta de soluções e comprometimento das suas culturas. A agricultura pede soluções integradas, apresenta projetos, pede investimento na eficiência de perímetros de rega públicos (onde as perdas de água antes de chegar à agricultura podem chegar aos 40%) e em novos reservatórios ou barragens, na revitalização de rios, na aposta em transvases, na dessalinização. Ou no mix de tudo isto em função das necessidades e regiões. Desde que algo aconteça. E rápido. Mas, como dizem modernamente os adolescentes, “só que não”.
Este logo se vê pode comprometer já em 2024 muitas produções na região sul do país. Na Costa Vicentina, os pontos de interrogação sobre o que se vai passar são muitos e a produção avançou já com um projeto para uma central dessalinizadora que possa assegurar novas fontes de água num curto espaço de tempo.
Este logo se vê, num país mediterrânico, com graves problemas de seca e perspetivas pouco animadoras face às alterações climáticas, é inadmissível do ponto de vista das políticas públicas. Porque pode deitar a perder o trabalho excecional das empresas nacionais nas exportações e comprometer a segurança alimentar. Porque vai levar ao declínio de muitas atividades-bandeira. E é preciso que se deixe bem claro que as soluções existem, e até há dinheiro do PRR para avançar com muitas delas, mas a inação persiste. Porquê? É uma boa questão, mas quanto à resposta… logo se vê!
#agricultarcomorgulho
O artigo foi publicado originalmente em Vida Rural.