Dezenas de pessoas reuniram-se hoje em frente da Assembleia da República, em Lisboa, em protesto contra a agricultura intensiva no sudoeste alentejano, no dia em que é debatida em plenário uma petição sobre o assunto.
A concentração foi convocada pelo movimento Juntos pelo Sudoeste, a que se juntaram outras associações, com os manifestantes a usar como palavra de ordem “agricultura intensiva não”.
“Desmantelar estufas, regenerar o futuro já!”, “Não há turismo de natureza sem natureza” ou “Basta de estufas no parque natural” são algumas das frases dos cartazes empunhados pelos manifestantes.
Em causa está a agricultura intensiva no sudoeste alentejano, especialmente no concelho de Odemira, no chamado perímetro de rega do Mira, que está localizado numa zona que é ao mesmo tempo parte do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina.
Laura Cunha, do movimento Juntos pelo Parque, explicou à Lusa que a concentração se destina a protestar contra o aumento das explorações agrícolas no Parque Natural, e afirmou-se sobretudo preocupada com falta de água na região, sendo a pouca que existe desviada para a rega das estufas.
Os manifestantes pedem também que o Governo recue em relação a uma resolução do Conselho de Ministros de 2019 que permite que tripliquem os hectares de agricultura “debaixo de plástico no Parque Natural”, que por a região ser Parque Natural nem devia sequer ser permitida a agricultura intensiva, disse.
Depois, acrescentou, o protesto deve-se também ao facto de não estar a haver qualquer fiscalização no sudeste alentejano por parte do Estado. “Nem o solo, nem a água, nem a qualidade do ambiente na região, não há absolutamente nenhum controlo”, disse Laura Cunha.
E afirmou que outro problema motivo de protesto tem a ver com a “forte imigração” que está a chegar à região, de trabalhadores para as estufas. “Está a ser pensada uma solução que será a de alojar os trabalhadores em contentores, o que é inadmissível”, disse, acrescentando que na região de Odemira todos os serviços públicos estão em colapso, sem que haja qualquer investimento por parte do Estado.
Laura Cunha salientou, no entanto, que uma das maiores preocupações do movimento é a falta de água, já que a rega das estufas é feita através da barragem de Santa Clara, que está agora a 50% da capacidade.
Essa situação faz com que esteja a ser cortada a água para agricultura de subsistência, para que não falte para as estufas, alertou.
Manuel Rocha, um dos manifestantes que hoje esteve em frente da Assembleia da República, é uma das pessoas a quem foi cortada a água, como explicou à Lusa.
E não é caso único. “Cortaram a toda a gente, em S. Miguel, Brejão, Maria Vinagre, Odeceixe, todas as pessoas que tinham essa água cortaram”, disse Manuel Rocha à Lusa, explicando que agora, para regar a horta, só tem a água da rede e que com essa não se pode regar quintais.
Manuel Rocha tinha água da barragem há cerca de 40 anos, pagou pela ligação, e agora foi-lhe cortada, disse à Lusa, sem aviso prévio, com a justificação de que “não há água”.
“Gastam e estragam a água nas estufas e não temos água por causa disso”, lamentou.
Vários dos cartazes empunhados pelos manifestantes, alguns também com referências aos trabalhadores migrantes, alertavam para a falta de água, como um com a frase “Sem água não há vida! A água da barragem deve ser usada para viver e não para enriquecer”.
Diogo Dias Coutinho, outro dos presentes, vive na freguesia de Saboia, perto da barragem, e disse à Lusa que as pessoas estão assustadas com a falta de água na barragem, que vê baixar quase de dia para dia, e alerta que não é libertado qualquer caudal ecológico para o rio Mira.
Presidente da Associação para a Valorização Sustentável de Regiões de Convergência – Project Earth, Diogo Coutinho, também alerta que os agricultores tradicionais começam a ver a água ser-lhe cortada. E lamenta que “cada vez há menos água e cada vez há mais estufas”.