Os produtores de leite da ilha Terceira ameaçaram hoje reduzir a produção em 2022 se não houver um aumento do preço justo, alegando que está em causa o rejuvenescimento do setor.
“Se não houver resultados, temos de pôr em prática a redução. A redução da produção de leite é a maior arma que os produtores de leite da ilha Terceira e a nível nacional têm neste momento”, afirmou, em declarações aos jornalistas, o presidente da Associação Agrícola da Ilha Terceira (AAIT), José António Azevedo.
O produtor agrícola falava à margem de uma marcha lenta organizada esta manhã em Angra do Heroísmo, que contou com a participação de cerca de uma centena e meia de carrinhas e tratores agrícolas.
O secretário regional da Agricultura e do Desenvolvimento Rural dos Açores anunciou esta quinta-feira que vai preparar “o mais urgentemente possível” um programa para a redução da produção de leite, reivindicado pela Federação Agrícola.
Segundo José António Azevedo, a intervenção do executivo vai permitir salvaguardar o rendimento dos produtores, mas é possível que haja uma “redução drástica da produção” em 2022.
“A ilha Terceira até ao final de setembro já reduziu três milhões de litros de leite. Isso representa 5% da produção a nível da ilha. E o ano de 2022 perspetiva reduções muito maiores, com um aumento brutal dos fatores de produção que já se fez sentir e que vai-se fazer sentir até ao final do ano”, alertou.
Com o preço base do litro de leite pago ao produtor nos 25 cêntimos, o presidente da AAIT admitiu que há produtores de leite a desistir do setor, a converter as suas explorações para a produção de carne ou simplesmente a reduzir o efetivo.
“Estamos a abater vacas e a reduzir produção. Não faz sentido continuar a produzir leite aos preços que são praticados na ilha Terceira”, adiantou.
Até ao final do ano, José António Azevedo espera que os diferentes intervenientes do setor se sentem à mesa e que haja uma “perspetiva” diferente para 2022.
No início do mês, o preço do litro de leite pago ao produtor subiu cerca de um cêntimo na ilha Terceira, mas os produtores reivindicam aumentos de pelo menos cinco cêntimos.
Sérgio Enes tem 34 anos e divide com um familiar uma exploração de leite com mais de 300 animais, mas admitiu já ter ponderado a abandonar o setor.
“Neste momento não há muito mais eficiência a ter, o que falta é subir o preço do leite para poder compensar o que tem subido”, afirmou.
O aumento do preço do leite exigido não é para “ganhar mais dinheiro”, mas apenas para “conseguir pagar o custo do litro de leite”, alertou.
“Tudo aumentou. O ferro aumento cerca de 70%, o gasóleo já aumentou cerca de 30 e tal cêntimos. Tudo aumenta constantemente e o leite, que é o que a gente produz para pagar estas despesas, não acompanha”, frisou.
Para o produtor agrícola, reduzir o efetivo “não é uma solução” na sua exploração, porque tem “custos fixos” mas, se o preço do leite não aumentar, admite “fechar a porta”.
“Tenho um enteado com 15 anos e um filho com um ano e não sei qual vai ser o futuro deles”, justificou.
Segundo Sérgio Enes, são “cada vez menos” os jovens na agricultura na ilha Terceira e é “impossível” atrair novos produtores, e até mesmo funcionários, com a carga horária exigida e com os salários que se conseguem pagar.
“O salário que a gente ganha é miserável. As horas de trabalho, é melhor nem falar. Eu chego a trabalhar 16, 18, 20 horas por dia, na altura das sementeiras. Para receber um salário mínimo, qualquer pessoa faz oito horas de trabalho”, afirmou.
O presidente da Associação de Jovens Agricultores da Ilha Terceira (AJAT), Anselmo Pires, disse que a renovação do setor está “interrompida há algum tempo” e pode agravar-se.
“São poucos os filhos que mantêm a tradição dos pais e dos avós a entrar para esta vida. Isto só é bom se for realmente atrativo porque, com o desgaste físico e emocional que esta vida acarreta, ou é atrativa financeiramente ou é muito desgastante e os jovens emigram e vão para outros setores de atividade”, frisou.
Também Anselmo Pires antevê que a produção de leite na ilha Terceira “vai diminuir drasticamente”, porque os custos de produção “são superiores ao preço pago”.
“Têm de nos dar condições para estarmos no setor”, apelou.