Há um canto de sereia que ecoa pelas agriculturas de Portugal, um falso unanimismo politicamente correto que pretende fazer crer que estamos todos no mesmo barco — que não há um “campeonato dos grandes” na disputa pelos dinheiros públicos. Mas a realidade insiste em desmentir essa ilusão.
Continuam a ganhar os mesmos de sempre: as fileiras e as regiões historicamente melhor posicionadas na captação de ajudas públicas, diretas e indiretas.
São os que dominam os discursos e os eventos, que alimentam o mito da autossuficiência alimentar nacional, mesmo quando o défice da balança agroalimentar ultrapassa, de forma estrutural, os 3 mil milhões de euros negativos. São também os que se habituaram à “fatia de leão” do Orçamento de Estado e da Política Agrícola Comum (PAC), e que, agora, fingem que não existem em Portugal grupos privilegiados que viveram — e ainda vivem — à sombra das rendas públicas.
Esses mesmos surgem agora, como virgens ofendidas, a proclamar que “há setores que precisam de mais apoio”. Concordo com a ideia — mas discordo profundamente sobre os setores que devem ser apoiados. O foco deve estar naqueles que, depois de uma década de apoio público consistente, demonstraram capacidade para caminhar sozinhos: os olivais, as hortofrutícolas, os produtos endógenos com DOP e IGP, a vinha e o vinho e a pecuária extensiva. Estes setores, quando apoiados de forma estratégica, geram valor acrescentado, emprego e exportações, ajudam-nos a ultrapassar limitações naturais — solo e clima — e a combater o abandono rural, promovendo a coesão territorial.
É verdade: devemos todos puxar para o mesmo lado — desde que esse lado seja o dos jovens agricultores e da agricultura familiar. É aí que os apoios devem ser prioritários. O país precisa de reformas estruturais profundas: eliminar impostos, taxas e taxinhas, reduzir os custos de contexto para o mesmo valor de Espanha (como eletricidade, gasóleo agrícola, seguros, fitofármacos, fertilizantes etc.) e tornar a burocracia transparente. O Estado deve publicar de forma acessível, em portais públicos, todos os manuais de procedimentos e as regras aplicáveis aos apoios, com atualizações claras sempre que houver melhorias ou alterações de regras de tramitação.
A verdade é que a PAC nunca teve em conta as especificidades da agricultura portuguesa, entre outras: explorações de pequena dimensão, muito abaixo das economias de escala; uma percentagem de jovens agricultores que é apenas um terço da média europeia; solos maioritariamente pobres, com baixos teores de matéria orgânica, 60% dos solos nacionais em risco de desertificação; uma reduzida área irrigável (apenas 16% da superfície agrícola utilizada), sendo estratégico incrementá-la para dar resposta a precipitações altamente irregulares — com excesso no inverno, quando as plantas pouco crescem, e escassez no verão, quando mais precisam de água.
Face a esta realidade, uma solução evidente impõe-se: regionalizar o próximo pacote financeiro da PAC. Em vez de uma gestão centralizada ao nível do Continente, devemos descer à escala das NUT III — ou seja, das Comunidades Intermunicipais e das Áreas Metropolitanas. Tal como já acontece com os Açores e a Madeira, Portugal continental deve ter 24 planos estratégicos regionais, com orçamentos próprios e adaptados às realidades locais.
Portugal ainda vai a tempo de regionalizar a próxima PAC, apesar de haver 8 meses de atraso para o início deste processo, caso esta opção seja uma das primeiras medidas a tomar pelo próximo Governo de Portugal.
Só assim poderemos, finalmente, ter a PAC a contribuir para a construção de uma política agrícola nacional verdadeiramente justa, eficaz e capaz de responder aos interesses dos portugueses.
Regionalizar a PAC!
Há cantos de sereias de falsos unanimismos do politicamente correto nas agriculturas de Portugal que querem fazer acreditar que estamos todos juntos e que não há um “campeonato dos grandes” pela captação do dinheiro público.
Infelizmente, o que os tempos recentes continuam a demonstrar, só ganham os que sempre ganharam, fileiras e regiões que estão nos primeiros lugares na captação das ajudas públicas, diretas e indiretas, aqueles que histórica e tradicionalmente sempre tentaram passar a ideia que é possível produzir no país todos os alimentos para os portugueses quando o défice da balança agroalimentar é estruturalmente negativo, superior a – 4 000M€, aqueles que se serviram da fatia de leão à mesa do orçamento de estado português e da política agrícola comum (PAC), querem fazer crer que não existem em Portugal grupos privilegiados que sempre se aproveitaram e tiraram partido das rendas públicas em prol de estratégias que não serviram no passado, não servem no presente e não servirão no futuro, o interesse público.
Estas virgens ofendidas vêm à luz do dia lançar o slogan, com o qual estou de acordo, existem setores que necessitam apoios e ajudas mais dedicadas, somente há desacordo sobre os setores a apoiar, eu defendo os que têm pernas para andar por si mesmos após serem fortemente ajudados pelos dinheiros públicos durante uma década, assim como, pelas políticas corretas, o olival, as hortofrutícolas, os produtos endógenos DOP e IGP, a vinha e o vinho, é preciso fazê-lo para ultrapassar as limitações de solo e de clima, mercado, risco de abandono e coesão territorial.
Pedem, temos de puxar todos para o mesmo lado, é verdade, se for o lado dos jovens agricultores e da agricultura familiar, com as respetivas ajudas a serem prioritárias sobre tudo o resto, as reformas estruturais, fazer desaparecer as taxas e taxinhas e tudo aquilo que impedem que se tenha em Portugal os mesmos custos de contexto que Espanha, eletricidade, gasóleo agrícola, seguros agrícolas, fitofármacos, fertilizantes, etc., tornar a burocracia transparente, o Estado Português dar a oportunidade aos agricultores de saberem previamente a qualquer candidatura ou licenciamento todas as regras que têm de cumprir em todas as fases, fazê-lo colocando em portais públicos os manuais de procedimentos, publicitar as alterações decorrentes da melhoria contínua, melhorias que são decorrentes da dinâmica e complexidade da vida em sociedade.
A PAC nunca teve em conta as especificidades das agriculturas de Portugal, entre muitas outras, pequena dimensão das explorações, muito abaixo das economias de escala das atividades, baixa percentagem de jovens agricultores, cerca de um terço da média europeia, predominância de solos pouco férteis, predominam aqueles que têm muito baixo teor em matéria orgânica, 60% dos solos nacionais estão em risco de desertificação, incremento da superfície irrigável (só 16% da superfície agrícola utilizada é passível ser regada) e as precipitações são muito irregulares, predominantes no inverno quando a temperatura é baixa, as plantas não crescem, no verão quando as plantas podem desenvolverem-se e produzirem não têm água disponível para suportar a fisiologia destes processos.
Em conclusão, uma das formas de dar uma resposta eficaz a todos estes desequilíbrios, passa por regionalizar o próximo pacote de ajudas financeiras da PAC, passa-lo do nível Continente para as NUT III, área geográfica das Comunidades Intermunicipais e das Áreas Metropolitanas, deve conter 24 planos estratégicos regionais, tal como atualmente acontece com as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, com os respetivos orçamentos alocados.
Os agricultores portugueses sentem-se perdidos e sozinhos, porque os seus produtos não geram valor acrescentado, há dificuldade para pagar as contas, sobrar dinheiro para investimentos prementes e sustentar as famílias. As ajudas financeiras públicas indexadas à superfície de exploração, apoios ao rendimento, favorecem quem não produz, mais, sendo regras para todo o Continente não podem ter em conta as especificidades das diversas agriculturas.
O setor agrícola sente de forma muito particular todos estes impactos. Os desafios vão surgindo, mas, como toda a gente tem de comer pelo menos três vezes ao dia, temos sempre conseguido continuar a atividade, não faltando nunca alimentos à mesa dos portugueses.
É isto que nos diferencia: os agricultores não são pessoas de baixar os braços, de se resignarem às adversidades ou de se atacarem mutuamente. São, antes, pessoas que olham de frente para os desafios e tudo fazem para os ultrapassar.
A agricultura em Portugal não é um campeonato de futebol, em que normalmente só ganha um dos três grandes. É antes uma seleção com o objetivo comum de tornar o setor mais forte, mais resiliente, mais competitivo, mais sustentável e mais reconhecido por uma sociedade cada vez mais urbana — em que todos ganham com o sucesso dos outros.
Setores de uma mesma agricultura, de um mesmo país, com propósitos comuns estarem uns contra os outros, em nada contribui para estes objetivos.
Todos temos de puxar para o mesmo lado. O enorme sucesso dos pequenos frutos, das hortofrutícolas ou do azeite é o sucesso de todos nós, agricultores, e de Portugal. E, se existem setores que necessitam de apoios e ajudas mais dedicadas, pelas mais diversas razões — seja pelo clima, pelo mercado ou até pelo risco de abandono — que os tenham. É para isso que servem as políticas e os governos.
Todos queremos ser mais fortes, manter a atividade agrícola em todo o território, fixar as populações nas zonas rurais e evitar o abandono.
A política é fundamental. Agora que estamos (novamente) em campanha eleitoral, é o momento para que todo o setor se una e se faça “lóbi” pela agricultura portuguesa. Todos temos de fazer reconhecer a sua importância e colocar a agricultura num lugar de destaque na sociedade e na economia — o que só se consegue se todo o setor olhar para o mesmo sentido.
Juntos somos mais fortes!
O mundo assiste a desafios globais, tal como acontece há algumas dezenas de anos, desde que a globalização passou a imperar no comércio mundial, em geral e nos produtos agrícolas em agroalimentares, em particular. As agriculturas de Portugal sentem esta enorme transformação desde a sua integração no mercado único europeu, há pouco mais de três décadas e pela PAC ter sofrido várias reformas, alterações profundas dos seus objetivos e instrumentos.
Especialista em Desenvolvimento Territorial