Viticultores de vários pontos do país queixam-se de grandes quebras na produção das uvas e aumentos de 35% dos custos de matérias-primas com escassez. O que pode abalar o setor vinícola.
Quebras na apanha da uva na ordem dos 50% que se vão refletir em igual proporção na produção do vinho, reduzindo as margens de lucro já este ano, nuns casos, e para o ano noutros; vindimas que começam mais cedo ou são adiadas por causa das altas temperaturas e consequente seca; matérias-primas, como garrafas, cartão, caixas de madeira e rótulos, com custos que dispararam na ordem dos 30% e, mesmo assim, chegam a conta-gotas e não são suficientes para dar resposta a todas as encomendas.
É este o panorama “dramático” que está a assolar os dias de muitos viticultores no país e a tirar-lhes o sono. Alguns deles não têm mãos a medir para encontrar soluções de modo a evitar um rombo drástico na gestão das empresas de viticultura. O ECO visitou vários produtores de norte a sul do país e os problemas são transversais a muitos deles que já tiveram de encontrar outras alternativas para conseguir ter uvas suficientes para produzir vinho e cumprir os prazos de entrega das mercadorias.
Comecemos pela época atípica das vindimas que, este ano, está a ser uma dor de cabeça para os viticultores e tem estado na ribalta pelos motivos mais preocupantes. Só a empresa familiar de produção de vinhos nas regiões do Douro e de Trás-os-Montes Costa Boal Family Estates calcula “quebras na produção de uva entre os 40% e 50%”, devido à seca. É um ciclo que se vem a arrastar pela escassez de água e alterações climáticas que, por consequência, aceleraram “a maturação das uvas antes do tempo e a acidez continua a baixar. Já se registam 12 graus de álcool”, começa por contar ao ECO António Boal, da Costa Boal Family Estates, que já antecipou as vindimas em Murça (Vila Real) e em Estremoz (Évora) que só começariam em meados de setembro. “Não há nada que se possa fazer mais na videira“, lamenta, adiantando que a vindima precoce foi a melhor solução para evitar que os estragos na vinha e os prejuízos nos cofres da empresa não fossem ainda mais “drásticos”.
Esta quebra na produção não vai, contudo, refletir-se este ano nas margens do negócio, mas sim em 2023. Ao contrário de outros produtores que já utilizam as uvas para produzir este ano, explica António Boal, “o vinho das uvas apanhadas agora fica em estágio entre um a cinco anos”. As vendas deste ano fazem-se com a produção do vinho que está em stock, mas que tem de ser engarrafado e que, a julgar pelo resto dos produtores que falaram com o ECO, é outra queixa transversal. Mas já lá vamos.
Já começámos as vindimas há uma semana. Como não temos água suficiente para rega em Reguengos de Monsaraz, as vinhas estão a sofrer muito e logo a vindima vai ser péssima, porque vai haver uma quebra de produção de uva entre os 50 e os 60% e, por consequência, em vinhos em relação ao ano passado.
Ainda assim, não há mãos a medir com toda a azáfama nas vinhas, com trabalhadores com tesouras e baldes na mão a colher os cachos de uvas bem mais cedo do que estavam acostumados. Pode assistir-se a igual cenário na empresa vitivinícola secular Ervideira, igualmente obrigada a arrancar com as vindimas mais cedo, nas sub-regiões da Vidigueira com 130 hectares (ha) e Reguengos de Monsaraz (30 ha) para produzir as gamas Conde D’Ervideira, Invisível ou Terras D’Ervideira.
Também aqui as queixas são semelhantes. “Já começámos as vindimas há uma semana. Como não temos água suficiente para rega em Reguengos de Monsaraz, as vinhas estão a sofrer muito e logo a vindima vai ser péssima, porque vai haver uma quebra de produção de uva entre os 50 e os 60%”, começa por desfiar o diretor executivo da Ervideira, Duarte Leal da Costa.
“Estou com o problema de aumento de custos e com quebras de produção cujos prejuízos se vão verificar daqui a uns anos“, lamenta Duarte Leal da Costa.
Ainda no Baixo Alentejo, entre Cuba e Vidigueira, com uma paisagem de cortar a respiração, de planícies com olivais e fileiras de vinhas de castas de Trincadeira, Alfrocheiro, Moreto ou Tinta Grossa, as vindimas também começaram mais cedo na Herdade do Rocim e pelos mesmos motivos. “Podem dizer que esta região é mais seca, mas não me lembro de termos temperaturas de 40 graus tantos dias seguidos”, nota o enólogo e administrador da Herdade do Rocim, Pedro Ribeiro. Para o enólogo, “os vinhos estão desequilibrados por causa da seca, ou seja, não existe um equilíbrio das várias componentes da uva, como acidez ou a cor, para atingir o ponto ideal“.
Por isso mesmo, Pedro Ribeiro não tem mãos a medir para “apanhar as uvas mais cedo do que era habitual e por causa da seca”. Contrariamente aos outros dois produtores, Pedro Ribeiro não prevê, este ano, quebras na produção da uva, porque tem […]