No final de 2015, a redução de emissões de gases com efeito de estufa alcançada no sector da agricultura já estava aquém das metas definidas no Plano Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC) de 8% para 2020 e 11% em 2030 mas, ainda assim, o secretário de Estado do Ambiente, naquela altura, mostrava-se optimista advogando que “não me parece que esse seja um sector muito crítico desse ponto de vista, resolvida que esteja a questão da agro-pecuária”.
O que foi feito nos últimos 3 anos para resolver esta questão?
Volvido todo este tempo, sem que a “questão” tenha sido resolvida, o plano do rebaptizado “Ministério do Ambiente e da Transição Energética”, para além de prever a redução de metade da área de floresta ardida (não tendo explicado como o vai fazer) encontrou a solução: reduzir entre 25% a 50% a criação de bovinos!
Mais uma vez, como é seu apanágio, este caso é mais um exemplo da forma de agir do actual Governo: primeiro decide e só depois vê a forma de o fazer. Foi o caso do (futuro?) Aeroporto do Montijo, do Infarmed, do SIRESP, da progressão de carreira dos professores, entre outros casos. Neste caso parece padecer também de alguma insensibilidade e de desconhecimento da realidade.
É verdade que a agro-pecuária é responsável, como outros sectores, pela emissão de gases com efeito de estufa, com especial relevo para o metano (que resulta da fermentação entérica e a gestão de efluentes animais) e para o óxido nitroso (que tem origem na aplicação de efluentes animais ao solo e no uso de fertilizantes azotados).
É verdade que o aumento das emissões associadas à agro-pecuária deve-se, em parte, à criação de bovinos (e suínos).
E verdade que todos os sectores não englobados no Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE) estão em linha com as metas de redução sectorial de 2020, previstas no Programa Nacional para as Alterações Climáticas e na Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas, com excepção da agricultura.
Mas também é verdade que “neutralidade carbónica” não significa 0% de emissões e que a agricultura desempenha um insubstituível papel no sequestro de carbono da atmosfera e do solo. E outras medidas importantes podem ser adoptadas para o desenvolvimento sustentável, como a redução do uso de fertilizantes, o aumento da pecuária em pastoreio ou a promoção de culturas menos intensivas e com menor necessidade de rega e que contribuam para o aumento do teor de matéria orgânica no solo.
Alguma destas medidas foi incentivada pelas políticas públicas de molde a permitir uma redução sustentada das emissões no sector agro-pecuário desde 2015?
Não estando, de todo, em causa a especial relevância do desígnio (redução das emissões de carbono), a insensibilidade e a soberba como, sem qualquer tipo de preparação ou estudo prévio do impacto nos produtores e no sector, se decide reduzir entre 25% a 50% as cabeças de gado com o argumento de uma “maior liberalização do comércio no mundo”, só não se estranha por ter precedentes.
Mas se calhar não será assim tão difícil assim atingir este objectivo: não era este Governo que, há uns tempos, aludia às vacas voadoras?
João Silva Lopes
Advogado, Membro da Comissão para a Reforma da Fiscalidade Verde