As Nações Unidas proclamaram 2025 como Ano Internacional do Cooperativismo1. Sob o tema “As cooperativas constroem um mundo melhor”, a iniciativa pretende dar visibilidade ao impacto positivo das cooperativas e destacar o seu papel na promoção de um crescimento económico inclusivo e do desenvolvimento sustentável, reforçando a relevância do setor cooperativo para a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)2.
Cooperativismo e desenvolvimento sustentável
O movimento cooperativo moderno surgiu em Inglaterra, em 1844, com a missão de oferecer uma alternativa acessível e justa a alimentos de má qualidade, canalizando os excedentes para o benefício da comunidade. Com raízes na alimentação, o cooperativismo expandiu-se pelo mundo e a múltiplos setores da economia.
Em Portugal, a evolução demográfica das cooperativas tem sido irregular desde 2011. O ano de 2024 manteve a trajetória positiva iniciada em 2023 e retomou os valores de 2020, invertendo a tendência de decréscimo no número de novas cooperativas. Embora as extinções sejam mais expressivas no ramo agrícola3, este é o ramo mais representativo no ranking das 100 maiores cooperativas nacionais em 20234, tanto em número como em volume de negócios, concentrando 64,1% do total (2,28 mil milhões de euros). Das 1.217 cooperativas registadas em Portugal, cerca de 400 pertencem ao ramo agrícola5.
A atividade das cooperativas norteia-se por sete princípios: adesão voluntária e livre; gestão democrática pelos membros; participação económica dos membros; autonomia e independência; educação, formação e informação; intercooperação; e interesse pela comunidade. Estes princípios refletem a predominância de dimensões sociais, económicas e de governação, destacando-se a participação e o controlo democrático dos membros sobre a atividade desenvolvida e sobre o capital económico, como um dos aspetos que mais distinguem uma cooperativa de uma empresa convencional.
O princípio do “interesse pela comunidade” enfatiza a necessidade de alinhar a ação das cooperativas com o desenvolvimento sustentável das comunidades onde estão enraizadas. Este princípio foi aprovado em 1995 pela Aliança Cooperativa Internacional, pouco depois de o conceito de “desenvolvimento sustentável” ter sido consagrado, em 1987, pela Comissão Mundial das Nações Unidas sobre o Ambiente e o Desenvolvimento6.
O pilar ambiental da sustentabilidade passou assim a ter mais expressão no movimento cooperativo. A Visão 2020 do “Plano de Ação para a Década Cooperativa”7, preconizou as cooperativas como arquitetas da sustentabilidade, salientando a interdependência e o reforço mútuo entre as três dimensões — económica, social e ambiental.
Cooperativas agrícolas e ESG: reforçar o “E” num setor enraizado no “S” e no “G”
A integração da abordagem ESG (Ambiental, Social e de Governação) nos modelos de negócio das cooperativas contribui para o reforço da sua competitividade e posiciona-as como atores centrais num contexto em que a sustentabilidade se afirma como o novo normal, fortalecendo, assim, o ecossistema cooperativo.
Nas cooperativas agrícolas, esta abordagem assume particular relevância. Tradicionalmente, estas organizações destacam-se nas dimensões social e de governação, pela sua natureza participativa e pelo contributo para a coesão e bem-estar das comunidades rurais. Contudo, o contexto atual oferece uma oportunidade decisiva para reforçar a dimensão ambiental. A identificação dos riscos, impactos e dependências associados ao clima e ao capital natural, do qual o solo é uma componente essencial, confere sentido de urgência à inclusão desta dimensão nas estratégias de criação de valor. Ao incorporar os temas ambientais do ESG – biodiversidade, água, energia, emissões de gases com efeito de estufa, transição climática, poluição, economia circular e gestão de resíduos – as cooperativas agrícolas reduzem o impacte ambiental dos seus produtos e, simultaneamente, reforçam a resiliência económica e social dos seus membros.
Tradição e transição: o papel do ESG no futuro do cooperativismo agrícola
Através da criação de valor partilhado, as cooperativas encontram-se numa posição única para impulsionar o desenvolvimento sustentável, demonstrando que é possível conciliar prosperidade económica com responsabilidade social e ambiental e promover um futuro mais justo, inclusivo e sustentável. Mas, há um caminho a percorrer, no qual a inovação, lato sensu, desempenha um papel determinante.
A abordagem ESG constitui uma ferramenta essencial para consolidar as várias dimensões da sustentabilidade nos modelos de criação de valor e, simultaneamente, reforçar a comunicação e o alinhamento com as partes interessadas, através de um reporte transparente do impacto coletivo gerado.
A capacitação técnica nesta matéria é crucial, sobretudo num contexto de transição que exige uma resposta estratégica e integrada aos desafios da sustentabilidade, da inovação e dos mercados, podendo implicar a reinvenção de modelos de negócio e/ou de governação.
Sendo atores centrais na sua cadeia de valor, as cooperativas agrícolas detêm um significativo potencial transformador, capaz de ampliar o seu impacto positivo e de impulsionar uma mudança sistémica rumo a um setor agroalimentar mais sustentável e resiliente, e a um mundo melhor.
2 https://unric.org/pt/objetivos-de-desenvolvimento-sustentavel/
3 https://cases.pt/setor-cooperativo/
4 https://cases.pt/wp-content/uploads/2025/07/100-Maiores-Cooperativas-2023.pdf
5 https://www.gpp.pt/images/GPP/O_que_disponibilizamos/Publicacoes/CULTIVAR_32/54/
7 Idem.
Consultora na área de sustentabilidade e ESG. Doutoranda em Ciências da Sustentabilidade, com Mestrado em Gestão.
Simplificação ESG: retrocesso ou otimização? Que implicações para o setor agrícola?











































