A última campanha de produção de azeitona e de venda de azeite veio, mais uma vez mas desta vez mais pronunciadamente, demonstrar que o excelente azeite biológico de Trás-os-Montes não é valorizado numa percentagem que compense a perda de produção dos olivais que se encontram em MPB. Trás-os-Montes tem estado a perder milhões de euros, literalmente, todos os anos, nos olivais. Entre outras causas, por esta de estarem a ser mantidos, numa boa percentagem da sua área, em Modo de Produção Biológico.
É inegável que o MPB tem as suas vantagens e sou adepto dum bom azeite bio, o problema é que a generalidade do mercado não está disposto a pagar bem mais por este extraordinário azeite bio. Vantagens: na imagem do azeite bio junto do consumidor (“se é biológico é melhor”, “se é biológico faz melhor à saúde”, “se é biológico é mais natural”, estas e outras frases ocorrem intuitivamente…); na expectativa duma maior valorização do azeite por ser bio, no momento de vender as azeitonas ou o azeite; na percepção de maior contribuição para a conservação da natureza e para a biodiversidade; na diminuição das operações culturais e, como tal, dos custos associados ao cultivo das oliveiras e à produção de azeitona; no maior subsídio por hectare, quer na conversão para MPB quer na manutenção, ano a ano.
Contudo, também é inegável que a produtividade dos olivais em regime MPB, quer em sequeiro quer em regadio, é comparativamente muito mais baixa do que os que se encontram em PRODI; que os custos de produtos fitofármacos e da fertilização no MPB são incomparavelmente mais altos do que em PRODI e de que a sua eficácia é muito menor.
A expectativa duma diferenciação de preços do azeite MPB para o azeite produzido em PRODI não compensa a perda de produção entre os dois regimes e, mesmo que introduzamos em toda a equação tudo o que possa valorizar o MPB (tais preços mais o valor de subsídio mais seja o que for), os resultados com PRODI, nas toneladas em que nestes olivais a produção se traduz a mais, são muito mais vantajosos.
Ainda restam duas questões.
A primeira prende-se com o facto de que há empresas e lavradores que têm conseguido, para os seus extraordinários azeites trasmontanos, produzidos em olivais MPB, nichos de mercado de alta e altíssima valorização: ainda bem, louváveis a todos os títulos. Trata-se de mercados conseguidos com zelo comercial e marketing junto de públicos muito bem informados e com grande poder de compra. Ainda bem. Em Lisboa, em Londres, em Nova Iorque, em Milão, em São Paulo, ou nas prateleiras do El Corte Inglés, um pouco por todo o lado, para determinados clientes, vendem-se azeites de Trás-os-Montes que merecem estar junto dos mais valorizados do mundo. Conseguem que o preço final remunere os seus olivais MPB a um nível justo.
A segunda, tem a ver com a convicção dos proprietários dos olivais, na sua visão do mundo de que estão a contribuir para um melhor planeta e para um futuro mais sustentável e quererem, com o mantê-los em MPB, ser coerentes. É respeitável, se bem que sejamos de opinião de que será economicamente insustentável e que, ao manter num baixíssimo nível de produção um dos produtos mais importantes da dieta mediterrânica, estão a omitir o seu papel de proporcionarem a um público mais vasto a disponibilidade de azeite de alta qualidade.
São objectivos da produção integrada (PRODI) promover um modelo de produção que respeite o ambiente, seja economicamente viável e responda às múltiplas funções da agricultura, assegurar a produção sustentável de azeitonas sãs, de grande qualidade e com a mínima ocorrência de resíduos de pesticidas; proteger a saúde do agricultor, quando do manuseamento de agroquímicos; promover e manter grande diversidade biológica no ecossistema olival e nas áreas circundantes; dar prioridade ao uso de mecanismos de regulação natural; manter ou aumentar a fertilidade do solo a longo prazo; minimizar a poluição do solo, da água e do ar.
A prossecução destes objectivos, com a aplicação dos métodos modernos de cultivo e o cumprimento de boas práticas preconizadas em PRODI (Decreto-Lei n.º 256/2009), permite o melhor de dois mundos: aumentar significativamente a rentabilidade por hectare dum olival, e remunerar devidamente o agricultor pelo produto excepcional que pode produzir.
A transição do MPB para PRODI, a ser considerada em cada exploração, no total ou em parte, e numa correcta ponderação de factores, permitirá a Trás-os-Montes um aumento espectacular das quantidades de azeitona produzida, uma azeitona de qualidade ímpar, de que se extrai um azeite de topo a nível mundial. Que só será possível continuar a ser extraído, se houver um dramático aumento de produtividade que permita a sua sustentabilidade.
Trás-os-Montes tem de, rapidamente, recuperar os milhões que tem estado a perder todos os anos.
Consultor e escritor, ex Director Regional de Agricultura e Pescas do Norte, 2011-2018; ex Vice-Presidente do IVV, 2019-2021