[Fonte: Público]
A empresa Monsanto tem feito vários esforços para conseguir ver prolongado o uso da substância que está na base do seu famoso herbicida Roundup: o glifosato – que tem vindo a ser associado em vários estudos a possíveis efeitos cancerígenos. Uma investigação que o Le Monde começou a publicar nesta quinta-feira, com o nome Monsanto Papers, indica que a empresa tem tentado destruir a credibilidade da Agência Internacional para a Investigação do Cancro da Organização Mundial de Saúde.
O Le Monde avança que tudo começou numa data certa: 20 de Março de 2015. Nesse dia, a agência de Christopher Wild publicou as conclusões de um estudo que conduziu sobre os efeitos do glifosato, deixando o mundo atordoado: este pesticida, dos mais célebres do mundo, foi considerado genotóxico, com efeitos ao nível do ADN, efeitos cancerígenos nos animais e “provavelmente cancerígenos” nos humanos.
A partir desse momento, advogados com ligações à Monsanto enviaram aos vários cientistas e investigadores envolvidos no trabalho cartas intimidatórias a pedir todos os documentos utilizados para chegar às conclusões publicadas. Caso decidissem não o fazer, eram ameaçados com uma acção judicial. Houve também o caso de um jornalista supostamente chamado Christopher Watts e com um mail ligado à The Economist que tentou obter informações junto dos investigadores e que fez perguntas mais intimidatórias. Na revista, ninguém sabe quem é.
Ao mesmo tempo, o Conselho Americano de Química, que defende a indústria dos Estados Unidos, terá promovido alguma influência junto de jornalistas para que publicassem histórias que comprometessem a independência da agência da OMS. O mesmo foi feito nas redes sociais. A situação, diz o Le Monde, piorou com a chegada da Administração de Donald Trump.
De acordo com dados publicados pela Agência Internacional para a Investigação do Cancro, em 2010 o glifosato estava registado em cerca de 130 países e é um dos herbicidas mais usados do mundo. O Le Monde estima que a sua utilização tenha aumentado de 3200 toneladas por ano, quando surgiu em 1974, para 825.000 toneladas em 2014. Se o glifosato for proibido na Europa, os analistas estimam que a Monsanto possa perder à volta de 90 milhões de euros em vendas.
Apesar destes resultados da agência da OMS, em Maio, a Comissão Europeia propôs o alargamento por mais dez anos da autorização de uso do glifosato. A contenda transatlântica sobre os possíveis riscos para a saúde humana do glifosato motivou investigações de comités do Congresso dos Estados Unidos, e a Europa tem sido forçada a atrasar a reautorização de um dos produtos que a Monsanto mais vende, o herbicida Roundup.
A decisão da comissão tem como base um outro estudo, publicado em Março pela Agência Europeia de Produtos Químicos (Echa), que preparou o caminho para a decisão da Comissão Europeia recomeçar as negociações com os Estados-membros sobre a reautorização da licença do glifosato, apesar da oposição dos grupos ambientalistas. Aquele organismo da Comissão Europeia, que regula as substâncias químicas e biocidas, disse que o glifosato, o ingrediente principal do Roundup, não era uma substância cancerígena. Também a Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar, uma agência independente financiada pela União Europeia, considerou “pouco provável que [o glifosato] tenha perigo carcinogénico para os humanos”.
Enquanto esperava pelos resultados do estudo da Echa, em Junho de 2016 a Comissão Europeia estendeu por 18 meses a autorização do uso do herbicida, depois de uma proposta de renovação total da licença ter tido a oposição de alguns Estados-membros (Portugal absteve-se) e de grupos activistas.
De acordo com dados publicadas pela Agência Internacional para a Investigação do Cancro, em 2010 o glifosato estava registado em cerca de 130 países e é um dos herbicidas mais usados do mundo.
A Monsanto, que teve em 2015 receitas de 15 mil milhões de dólares, actua em vários mercados e é conhecida sobretudo pelas sementes geneticamente modificadas, que têm suscitado críticas por parte de ambientalistas e de alguns grupos de defesa do consumidor. O recurso a estas sementes é muito mais frequente nos EUA do que na Europa, mas a Monsanto vende sementes de milho geneticamente modificado dentro da União Europeia.