Um dia, há mais de 30 anos, na Casa-Escola Agrícola Campo Verde, o professor de português trouxe-nos um texto das “Farpas”, de Ramalho Ortigão. Nunca mais encontrei esse texto, até comprei e li o livro, mas descobri depois que existe outro volume onde deve estar essa “farpa”, de modo que vou citar “de cor” conforme me recordo. Ramalho comentava uma notícia da chegada do Rei, de comboio, a um determinado sítio, e criticava o floreado do discurso do autarca local, algo sobre a alteza real e um trono ou degrau imaginário, e também a resposta do Rei, cheia de maneirismos e vazia de conteúdo. Dizia Ramalho que, em vez dessa treta, os discursos deviam ser sobre os problemas concretos das pessoas, por exemplo “Majestade, o povo está a passar fome porque os pomares desta terra estão a ser atacados por pulgões” e o Rei devia responder: “Muito bem, logo quando regressar ao palácio vou chamar o Primeiro-ministro para ele chamar o Ministro da agricultura para que dêem ordens aos agrónomos para investigar o vosso problema e trazer-vos uma solução!”. Pronto.
Se fosse em 2025 e eu tivesse a oportunidade de falar, diria assim: “Senhor Presidente / Primeiro-ministro / Senhor Ministro ou secretário de Estado, os Javalis estão a tornar-se um problema cada vez mais grave em todo o país e também nesta região. Na semana passada, um amigo meu fotografou um bando de 15 javalis aqui ao lado em Bagunte, Vila do Conde. Contou-me o meu amigo que nunca tinham andado javalis por ali, que no próximo verão vai haver destruição de milho como já acontece noutros locais e que os caçadores não podem ajudar a controlar a espécie por causa dos distâncias de segurança que tem de manter em relação a casas e equipamentos, distâncias que podem fazer sentido nas regiões com grandes áreas e povoação concentrada, mas que tornam impossível a caça nas zonas de minifúndio”. E ficava à espera de uma resposta. Concreta.
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O artigo foi publicado originalmente em Carlos Neves Agricultor.