A embaixadora de Cabo Verde na ONU alertou em Belém que as intempéries que afetaram o arquipélago recentemente comprovam a urgência da crise climática e pediu uma atenção especial na COP30 ao financiamento da adaptação dos pequenos estados insulares.
“A ciência é clara e já tinha dado o alerta. Os eventos [climáticos recentes em Cabo Verde] são uma prova física de que realmente a urgência está a bater à porta de todos nós, em particular os mais vulneráveis”, disse Tânia Romualdo a jornalistas portugueses num evento à margem da 30.ª conferência das Nações Unidas para as alterações climáticas (COP30), em Belém, no Brasil.
A tempestade Erin provocou em agosto nove mortes e prejuízos generalizados na ilha cabo-verdiana de São Vicente, afetando ainda Santo Antão e São Nicolau, e outra intempérie afetou na última semana o norte da ilha de Santiago, provocando um morto e vários estragos.
Em ambos os casos, o Governo anunciou estado de calamidade para mobilização de financiamento, prevendo-se que as operações de reconstrução e apoio social vão prolongar-se por vários meses com apoio de diversos parceiros de desenvolvimento.
A Representante Permanente de Cabo Verde junto das Nações Unidas lembrou que estes fenómenos extremos são uma novidade em Cabo Verde.
“Quando antes até brincávamos e dizíamos ‘nós exportamos os furacões para os Estados Unidos e Caraíbas’, agora formam-se numa região um pouco mais próxima e com maior força, portanto, já afetam também Cabo Verde antes de atravessar o Atlântico”, disse a diplomata.
Recordando o furacão Melissa, que atingiu a Jamaica em outubro e causou dezenas de mortos e prejuízos de milhares de milhões de euros, a representante cabo-verdiana alertou que “a urgência é real” e defendeu que não é possível adiar mais a tomada de medidas.
Questionada sobre as prioridades de Cabo Verde na conferência que recorre até sexta-feira na cidade da Amazónia brasileira, Tânia Romualdo apontou o desejo de ver os pequenos estados insulares em desenvolvimento (SIDS, na sigla em inglês) a terem um tratamento diferenciado e acesso aos financiamentos necessários para trabalharem a sua adaptação às alterações climáticas.
Os SIDS, lembrou, estão a ser prejudicados por fenómenos para os quais “não contribuíram em absolutamente nada”.
“No caso de Cabo Verde, por exemplo, a nossa emissão [de gases poluentes) é de 0,002%” do total, disse.
Sublinhou também a necessidade de acesso à capacitação: “Não é apenas em termos de infraestruturação e equipamento, falta-nos também preparar devidamente os técnicos que vão manusear esses equipamentos sofisticados para prever, para dar os sinais de alerta precoce e por aí fora”.
Tânia Romualdo disse que a cooperação que Cabo Verde tem com Portugal, nomeadamente o acordo para converter dívida em investimento num fundo climático que em Cabo Verde é utilizado para ajudar na adaptação, uma experiência que já está a ser replicada por Portugal em São Tomé e Príncipe.
A embaixadora sublinhou ainda a importância da ligação entre o oceano e o clima, lembrando que Cabo Verde é 99,6% oceano e apenas 0,4% terra.
“Para nós o oceano é tudo. (…) Não é dizer que somos a favor ou somos os defensores do oceano. Nós somos o oceano”, disse, acrescentando que o país defende que o oceano seja incluído na agenda da negociação das conferências do clima como um item autónomo.
Lembrou ainda que Cabo Verde assinou o acordo das Nações Unidas sobre proteção da Biodiversidade Fora da Jurisdição Nacional (BBNJ, sigla em inglês) “no dia um da abertura para assinatura” e ratificou-o ainda este ano constando entre os 60 que permitiram que venha a entrar em vigor em 17 de janeiro.
O Tratado do Alto Mar resultou de quase 20 anos de discussões e tem como objetivo a conservação e utilização sustentável da biodiversidade marinha. É um documento juridicamente vinculativo de proteção das águas internacionais, que estão fora da área de jurisdição nacional.












































