A organização ambientalista Associação Natureza Portugal (ANP/WWF) alertou hoje para a má gestão da água em Portugal, considerando que os “instrumentos públicos de gestão não estão a ser implementados de forma adequada nem eficaz”.
Num documento denominado “O Desgoverno da (pouca) água que temos”, a ANP/WWF faz uma breve análise sobre a gestão do setor e uma série de recomendações ao governo para diminuir o impacto da seca.
Por ocasião do Dia Nacional da Água, que se assinala em 01 de outubro, a ONG salienta que as alterações climáticas aumentaram “a exposição e vulnerabilidade à redução da disponibilidade de água, mas a solução não deve ser a construção de novas infraestruturas e barragens, que se arriscam a ficar vazias a maior parte do tempo”, o que vem “estimular o aumento dos consumos” com “graves impactos ambientais”.
Segundo a diretora executiva da ANP/WWF, Ângela Morgado, citada em comunicado, o país deve mudar de políticas: “Podemos, sim, gerir os nossos consumos de água e adaptarmo-nos ao facto de cada vez termos menos água disponível. Se não fizermos essa adaptação já, o risco transforma-se em desastre – o desastre de ficarmos sem água quer para o consumo humano, quer para as nossas atividades ou para os nossos ecossistemas e habitats”.
“Ao contrário do que é recomendado oficialmente pela Diretiva Quadro da Água, pelas instituições da UE e pelo Governo Português, a gestão da procura da água (reduzir e limitar os consumos e utilizações) continua a ser subvalorizada face à contínua aposta no reforço da oferta, ou seja, no aumento das infraestruturas de captação e retenção de água”, alertam os ambientalistas.
Na publicação, a associação dá o exemplo do Algarve, uma região que tem problemas estruturais de falta de água, mas cujos “montantes aplicados na redução de perdas nas redes de abastecimento urbano e agrícola e na reutilização de águas residuais são significativamente inferiores aos investimentos aprovados para a construção da dessalinizadora em Albufeira e para o reforço da albufeira de Odeleite a partir da captação do Guadiana no Pomarão (esta última até ilegítima à luz do direito internacional)”.
A “deficiente implementação dos principais instrumentos públicos de gestão de água, que só agrava os impactos das secas e promove a insustentabilidade na utilização deste cada vez mais precioso recurso natural” é também criticada pelos ambientalistas.
Exemplos desses instrumentos públicos, segundo a associação, é o Plano Nacional para o Uso Eficiente da Água, “atrasado e quase abandonado a aguardar revisão desde 2015”; o regime de caudais entre Portugal e Espanha, “desatualizado e repleto de lacunas o que acresce a violação internacional de ambos os países”; os programas especiais de albufeiras, “em sete anos nenhum foi revisto e concluído” ou a comissão de prevenção e acompanhamento dos efeitos da seca, “uma comissão interministerial com muito fraca representação da sociedade civil e dos utilizadores da água e que reúne de forma ‘ad-hoc’”.
Na lista de recomendações ao governo, a ANP/WWF propõe, entre várias questões, “limitar a procura em sistemas de abastecimento de água sujeitos a escassez”, exigir “seguros aos grandes utilizadores agrícolas para fazer face ao risco de seca, evitando as repetidas e avultadas indemnizações compensatórias, que acabam por ser pagas por todos os contribuintes” ou “incentivar a diversificação e complementaridade de origens nos sistemas de abastecimento, para reforçar a sua resiliência”.