Um ano após a entrada em vigor da cerca sanitária nas freguesias de São Teotónio e Longueira/Almograve (Odemira), medida que acabou por dar visibilidade às condições precárias em que viviam muitos trabalhadores imigrantes, o presidente da câmara municipal garante que foram dadas respostas “fortemente” transformadoras do território para melhorar a situação. Já Alberto Matos, da associação Solidariedade Imigrante, diz que “mudou muito pouco” e que é necessário “pôr fim” ao modelo de exploração agrícola intensiva “antes que ele nos destrua a vida”.
Às 8 horas da manhã do dia 30 de abril de 2021, entrava em vigor a cerca sanitária decretada pelo Governo nas freguesias de São Teotónio e Longueira/Almograve, no concelho de Odemira, devido à elevada incidência de casos de covid-19, sobretudo entre trabalhadores do setor agrícola, muitos deles imigrantes.
A medida, que se prolongou até ao dia 12 de maio, acabaria por dar visibilidade às condições em que viviam muitos destes trabalhadores. No decorrer das ações de controlo e prevenção da pandemia então realizadas, foram identificadas situações de alojamento de trabalhadores agrícolas com deficiências, por falta de salubridade ou por sobrelotação.
Na véspera da entrada em vigor da cerca sanitária, o primeiro-ministro, António Costa, sublinhava que “alguma população” vivia “em situações de insalubridade habitacional inadmissível, com hipersobrelotação das habitações”, e relatava situações de “risco enorme para a saúde pública, para além de uma violação gritante dos direitos humanos”.
O então presidente da Câmara de Odemira, José Alberto Guerreiro, estimava que “no mínimo seis mil” dos 13 mil trabalhadores agrícolas do concelho, permanentes e temporários”, não tinham “condições de habitabilidade”. “Este ano, estamos a falar de seis mil, mas, mesmo que sejamos capazes de resolver dois mil, no próximo ano, estamos a falar de seis mil ou sete mil, outra vez”, alertava.
A direção da Associação dos Horticultores, Fruticultores e Floricultores dos Concelhos de Odemira e Aljezur (AHSA), afirmava, por sua, que a falta de habitação era “um problema crónico” que a curto/médio prazo só se conseguiria resolver “com a instalação de trabalhadores em habitações temporárias de qualidade, no interior das quintas” e atribuía a questão da sobrelotação “ao arrendamento abusivo por parte de proprietários locais”, resultado “da total ausência de investimento público sobre esta matéria, que resolva cabalmente o aumento da população registado nos últimos anos”.
Já o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, advertia que a mão-de-obra imigrante deveria ser tratada em termos humanos e com “dignidade, como vem na Constituição”. “Em relação a Odemira, começou por ser aos olhos dos portugueses um caso sanitário, um caso mais grave de saúde pública que exigia medidas graves e depois foi-se descobrindo que havia realidades sociais por baixo desse caso sanitário. Vale a pena desde já começar a refletir sobre algumas lições de Odemira”, afirmou então.
A 11 de maio, numa visita ao concelho de Odemira a fim de anunciar o fim da cerca sanitária e participar numa sessão em que foram assinados acordos entre associações representativas de empresas agrícolas, câmara e Governo para a criação de condições habitacionais para trabalhadores agrícolas, o primeiro-ministro reconhecia que a realidade dos imigrantes em Odemira não era nova e que havia trabalho feito na área da habitação, mas a pandemia “consumiu” recursos, energia e tempo.
“Nós sabemos que esta realidade não é nova, aqui em Odemira, nem nos era desconhecida”, afirmou António Costa, lembrando que, em outubro de 2019, “uns meses antes de aparecer” a covid-19, tinha sido aprovada uma resolução do Conselho de Ministros centrada nas questões da agricultura e dos trabalhadores deste setor em Odemira. A resolução estabeleceu, entre outras matérias, uma moratória de 10 anos que permite a manutenção de estruturas de habitação amovíveis (contentores) e 16 pessoas por unidade de alojamento, quatro por quatro e uma área de 3,4 metros quadrados para os trabalhadores.
Um dos memorandos assinados na referida sessão de 11 de maio envolveu a câmara e o Governo, tendo sido estabelecido o compromisso para a apresentação por parte da autarquia da Estratégia Local de Habitação, um instrumento que, considerou então o primeiro-ministro, iria permitir “saber onde é que deve ser construída, como é que deve ser construída, para quem deve ser construída essa habitação” e “tem que ser para aqueles que residem” em Odemira, “sem qualquer tipo de discriminação quanto à sua origem ou atividade”.
O outro acordo, envolvendo o Ministério da Agricultura e a Associação Horticultores, Fruticultores e Floricultores, Lusomorango (organização de produtores) e Portugalfresh – Associação para a Promoção das Frutas, Legumes e Flores de Portugal, visava, segundo António Costa, que os proprietários promovessem “a existência de condições de habitação condigna” para os trabalhadores sazonais, com apoio de verbas do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (Feder).
ALOJAMENTOS TEMPORÁRIOS “COM CAPACIDADE PARA 2000 PESSOAS”
Um ano após ter sido decretada a […]
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