No âmbito do Dia Mundial da Ciência, celebrado no passado dia 24 de Novembro, a TSF trouxe a estúdio um debate com o objetivo de dar a conhecer o papel fulcral da ciência na produção e na segurança alimentar e na atividade agrícola. Apesar da extrema relevância destas atividades no fornecimento de alimentos seguros e em quantidade suficiente para a população mundial em crescimento, continuamos a assistir a um elevado nível de desconhecimento da sociedade sobre aqueles que são os desafios de um futuro sustentável.
Para contribuir para a discussão e partilha de experiência nas áreas da alimentação e da ciência, a TSF convidou António Lopes Dias, diretor executivo da ANIPLA, João Mendes, jovem produtor, e ainda, João Júlio Cerqueira, médico e autor do blogue Scimed.
Para António Lopes Dias, “Ainda existem regiões onde se morre de fome”, que é uma das consequências de “um desequilíbrio na produção agrícola mundial”. Para este responsável da ANIPLA, o desconhecimento “é notório”, fazendo referência ao resultado de uma sondagem à opinião pública portuguesa, realizada pela Associação, em parceria com a Universidade Católica, onde ficou evidente que a nossa população ainda desconhece alguns dos desafios mundiais, como o facto de a produção agrícola ter de aumentar a sua produtividade em 60% nos próximos 30 a 40 anos, por forma a “produzir mais e melhor, de acordo com as necessidades nutricionais do homem, com a terra que temos, que tem tendência a ser cada vez menor”.
Sobre a necessidade de se melhorar a produtividade, o diretor executivo da ANIPLA reforça a necessidade de se introduzir “inovação, tecnologia e ciência”, para que as culturas sejam protegidas de “pragas, doenças e infestantes”, refere. Sobre o contributo dos produtos fitofarmacêuticos, o diretor executivo da ANIPLA foi igualmente claro ao apontar a necessidade de se aumentar a “produção integrada”, onde se incluem todos os meios ao nosso alcance. Para este responsável, os produtos fitofarmacêuticos devem ser vistos como “um auxiliar do produtor que nos permite ter o que precisamos, dentro de uma produção sustentável, desde que utilizados corretamente, tal como os medicamentos”, conclui.
Por seu lado, João Júlio Cerqueira referiu outro estudo internacional, no qual ficou clara a necessidade mundial de se aumentar a produção de “frutas, vegetais e proteína animal”, para que se consiga responder às necessidades nutricionais da população. Sobre o glifosato, a substância fitofarmacêutica que tem gerado grande confusão entre os consumidores e até associações civis, o médico e autor do blogue Scimed prefere a ciência que indica que esta substância é “um dos fitofarmacêuticos mais seguros do mercado”. O especialista menciona ainda que “de acordo com um estudo da Nature, de todos os pesticidas existentes, este é 90% mais seguro que as outras soluções”.
Para o autor do conhecido blogue de ciência, o glifosato poderá até ser o “elo mais fraco da biotecnologia”, como forma de ataque aos produtos transgénicos que, indica, “são perfeitamente seguros” e que têm o suporte de “mais de 30 consensos científicos” e ainda de “uma carta aberta de mais de 130 laureados com o prémio Nobel”. Para o médico, esta é uma situação infeliz porque, tal como esclarece, os produtos transgénicos seguros como o arroz dourado, “têm o potencial de salvar milhões de vidas”. Quando menciona o estudo da IARC (a Agência Internacional de Pesquisa para o Cancro), que tem sido apontado por diferentes organizações ambientalistas como a fonte da prova do risco cancerígeno da substância, João Júlio Cerqueira contra-argumenta com a existência de “mais de dez consensos científicos feitos por diferentes países, também pelas Nações Unidas e patrocinados pela Organização Mundial de Saúde que dizem que o glifosato não causa cancro”, no entanto, acrescenta ainda, “os promotores do medo apenas citam o relatório da IARC (…) avaliando o ‘hazard’, expressão que não tem tradução direta para português, que avalia se um produto causa ou não cancro, sem ter em consideração a dose, que é fundamental”.
O moderador, Miguel Midões, introduziu depois o produtor João Mendes, referindo a sua ligação familiar, já na terceira geração, à bem-sucedida produção de azeitona. “Desde que me lembro de ser gente que me lembro de andar na vida da agricultura”, revela o produtor, que se formou em agronomia e investiu no conhecimento da ciência e tecnologia para apoiar a eficiência da produção sustentável e segura. Para João Mendes, “não há nenhum produto que saia do campo sem ser previamente analisado e ver se todas as substâncias estão dentro dos limites”. Quando se refere à utilização dos produtos de proteção das plantas declara, firmemente, que “Não há aplicação sem haver real necessidade e sem ter um nível económico de ataque que justifique”, expondo os elevados custos destes produtos de proteção das culturas na atividade. O jovem produtor destacou os ataques de infestantes e pragas à produção, onde são perdidas grandes quantidades, pelo que “apenas tratamos quando há a necessidade efetiva”. Já em referência à qualidade do seu produto, alude, orgulhosamente, às certificações da sua produção “que nos asseguram que desde o campo, até à garrafa, conseguimos rastrear tudo e saber da segurança”, utilizando sempre “as tecnologias mais recentes do mercado” e que levou a sua produção até ao prémio ‘Produção Nacional Intermarché’ na primeira edição, em 2014. “Temos que ter a qualidade para sermos reconhecidos”, aponta.
AGRICULTURA BIOLÓGICA E OS MITOS
O tema da agricultura biológica esteve também em destaque no debate, por se tratar de uma matéria que é, muitas vezes, mal compreendida pelo consumidor, com consequência para toda população. O estudo da Universidade Católica, realizado em parceria com a ANIPLA, tornou evidente a preferência da população portuguesa por este método de cultivo agrícola ainda que, segundo a investigação, desconheça os detalhes da sua produção relacionados com a utilização da ciência e da tecnologia, tais como a aplicação de produtos fitofarmacêuticos.
Para João Júlio Cerqueira é evidente e recorrente “a dicotomia entre agricultura convencional e agricultura biológica”. A população recorre aos produtos provenientes da agricultura biológica, “cada vez mais preocupados com a saúde e com o ambiente”. No entanto, para este profissional da medicina, o “grande problema” que poderá estar associado a este tipo de agricultura, poderá acontecer se se “aumentar de uma forma importante” uma vez que, numa alusão à quantidade superior de terra necessária para este tipo de produção, o médico conclui “não vamos ter terra suficiente para plantar alimentos e poderemos levar ainda a um impacto negativo também para o ambiente, com a previsível necessidade de se destruir mais florestas e ecossistemas”.
Já para António Lopes Dias, há um facto claro e evidente: “na agricultura biológica também se aplicam produtos fitofarmacêuticos”. O responsável da ANIPLA mostra-se firme contra a dicotomia entre os dois tipos de produção, esclarecendo o erro e engano de se falar de “uma agricultura de primeira e uma agricultura de segunda”. Ao apresentar a sua visão e experiência, António Lopes Dias acrescenta ainda que “a agricultura biológica é uma forma [de marketing] de se diferenciar, indo ao encontro das necessidades de uma camada da população”, concluindo com o reforço da posição da ANIPLA, que “acredita que o futuro é integrarmos tudo e não excluir nada. Todas as técnicas, todas as ferramentas, toda a inovação e toda a tecnologia, de forma consciente e razoável […]”
Assista ao debate completo, aqui ⬇️
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