A situação no concelho de Odemira resulta de um problema de base: a negligência dos responsáveis institucionais que não acompanham, não fiscalizam, nem controlam.
Quando em 1988 se criou a área de Paisagem Protegida e em 1995 se constituía o Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina (PNSACV) identificava-se a zona litoral do sudoeste de Portugal como uma das regiões menos adulteradas nos seus aspectos naturais a nível europeu e estabelecia-se a sua defesa como uma prioridade nacional. Já em 1997 toda a área do PNSACV é colocada na lista nacional de sítios e em 1999 é criada a Zona Especial de Protecção da Costa Sudoeste, integrando a totalidade da área na Rede Natura 2000. Acorda-se então para a necessidade urgente de preservar e salvaguardar este património natural e alertando-se já para a interdependência destes valores naturais com as práticas agrícolas extensivas, tradicionais neste território, reforçando já a ameaça que as práticas agrícolas intensivas representavam para este território.
Ora, em sobreposição com parte do PNSACV, está instalado o Perímetro de Rega do Mira (PRM), estrutura de regadio, construída nos anos 60 e que alimenta a região com água a partir da barragem de Santa Clara. Uma estrutura baseada em canais abertos de irrigação por gravidade, distribuídos sobretudo pelo concelho de Odemira e que despejam a água doce não utilizada directamente no oceano. Estamos então perante um sistema de regadio desenhado de acordo com a realidade da época, com enormes desperdícios, desfasado da realidade actual e inadequado para fazer face a fenómenos actuais, como as alterações climáticas. Todo este perímetro é gerido pela Associação de Beneficiários do Mira (ABM). Desde 2019, e seguindo a tendência da região, os níveis de água da barragem de Santa Clara atingem o chamado “nível morto” obrigando à instalação de bombas, para fazer face às necessidades do PRM.
Com a criação do PNSACV, são definidas condicionantes aos vários actores que operam na região com a ambição de compatibilizar as várias vertentes sociais e económicas com as ambientais. Vale a pena esclarecer que estes
Nuno Carvalho
Mestre em Engenharia do Ambiente, dedicou a sua vida a trabalhar nas áreas do planeamento do território, conservação da natureza e comunicação de ciência. É actualmente responsável por um projecto agrícola, educativo e de investigação no concelho de Aljezur.